Acórdão nº 00873/07.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução29 de Novembro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO T…, Vereador da Câmara Municipal de Valença, veio interpor o presente recurso jurisdicional por se mostrar inconformada com a decisão do TAF de Braga, datada de 25/09/2007, que julgou procedente a acção administrativa especial de perda de mandato que havida sido deduzida contra o mesmo pelo “MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO” junto daquele TAF e que, em consequência, declarou a perda do seu mandato.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 81 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

I - Na sentença recorrida o Mm.º Juiz entendeu que o comportamento do R. deve ser qualificado como “gravemente culposo”, julgou procedente a acção de perda de mandato intentada contra o R..

II - A sentença recorrida padece de um erróneo entendimento de que a omissão do recorrente deve ser entendida como um comportamento gravemente culposo.

III - O n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 4/83 de 02 de Abril, na redacção da Lei 25/95 de 18 de Agosto exige um “…incumprimento culposo…” para a perda de mandato.

IV - A perda de mandato tem carácter sancionatório o que implica a necessidade de ter em conta os princípios de direito disciplinar e penal, ou seja, tem que existir um comportamento culposo por parte do visado.

V - O R. apresentou a declaração em causa em data anterior à sua citação para os presentes autos, ou seja, em momento anterior a ter conhecimento de que contra si foi instaurada a presente acção (apresentou a referida declaração em 12 de Junho de 2007 e foi citado para a acção através de carta recepcionada na C.M. de Valença em 14 de Junho de 2007, mas entregue ao R. dias mais tarde).

VI - O facto de não ter sido apresentado oportunamente a declaração a que se refere o art. 1.º da Lei 4/83, de 2 de Abril, na redacção da Lei 25/95 de 18 de Agosto, deveu-se a falta de informação adequada, como se alcança até do facto de o R. ter apresentado a declaração espontaneamente.

VII - Não foi intenção deliberada do R. não efectuar a entrega da declaração de rendimentos.

VIII - Apenas se verificando a irregularidade de tal entrega não ter sido efectuada no prazo devido.

IX - O R. cumpriu a obrigação legal de apresentar a sua declaração de rendimentos no Tribunal Constitucional, ainda antes de ter sido citado para a presente acção, facto que demonstra um espontâneo “arrependimento”, que, assim, supriu a sua conduta omissiva.

X - O recorrente não quis praticar um acto ilícito ou ilegal ao não ao entregar a declaração atempadamente, tendo agido com negligência.

XI - A situação de incumprimento a que se refere o n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 4/83, de 18 de Agosto, com a redacção dada pela Lei n.º 25/95, de 8 de Agosto, não se verificava quando da citação do R. para a acção.

XII - Não se está, no caso em apreço, perante um “incumprimento culposo” ou “intencional”, mas apenas perante uma situação de “cumprimento tardio” por parte do Réu, na apresentação da declaração de rendimentos.

XIII - Um dos pressupostos essenciais para a perda de mandato é o dolo directo, ou seja, a intenção do agente, aquela acção em que o agente prevê e tem como fim a realização do facto.

XIV - Quando se fala em dolo directo tem que existir o elemento volitivo do dolo, tem que existir desejo, vontade de se querer um resultado ou um acto. Deste modo, falta um pressuposto essencial para a perda de mandato que é o dolo directo, já que, o recorrente não actuou com dolo directo.

XV - O recorrente teve apenas uma omissão negligente, não agiu com qualquer intenção, que o torne indigno de ocupar o cargo de vereador.

XVI - No presente caso, não obstante a negligência do R., vários factores concorrem a seu favor.

XVII - Desde logo, o R. não se eximiu à notificação, como o comprova o facto de apesar de a mesma ter sido remetida para a C.M. de Valença, o mesmo se ter prontificado a recebê-la.

XVIII - Ao que acresce que a data em que o R. foi citado para a acção de perda de mandato (dias depois de 14/06/2007, pois esta foi a data da recepção da carta para notificação na C.N. de Valença) já o mesmo havia enviado (12/06/2007) a sua declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional.

XIX - Não bastam meras irregularidades para justificar o decretamento do mandato.

XX - É doutrina expendida nos Acs. do STA de 21.03.96 e do T.C. de 15.01.92 (P. n.º 25/92) que não se justifica o decretamento da perda de mandato em casos de mera negligência, em que não seja evidente a violação de regras fundamentais de isenção e imparcialidade, susceptíveis de criar suspeição sobre a conduta do visado.

XXI - Em face das circunstâncias do caso concreto, é de concluir, em face de um critério razoabilidade, que o R. não violou os deveres do seu cargo de forma a tornar o seu afastamento imperioso, pelo que a declaração de perda de mandato seria excessiva e desproporcionada.

XXII - A sentença recorrida ao declarar a perda de mandato do R., fez errada aplicação dos arts. 1.º, 3.º, n.º 1 da Lei n.º 04/83, de 02/04, na redacção dada pela Lei n.º 25/95, de 18/08, 10.º e 11.º da Lei n.º 27/96, de 01/08.

XXIII - Uma correcta interpretação dos normativos referidos no ponto anterior, impunha que a decisão judicial recorrida deveria ter sido no sentido da improcedência da acção administrativa especial para perda de mandato, por ausência de dolo na conduta omissiva do R. (apenas existiu negligência) e por falta de fundamento para a punição, por ter ocorrido “causa de exclusão da pena”, consubstanciada na entrega da declaração de rendimentos em falta no Tribunal Constitucional repondo, dessa forma, a legalidade.

XXIV - A sentença recorrida padece de erro de julgamento, impondo-se a consequente revogação da mesma …”.

Conclui no sentido do provimento do recurso, com as legais consequências, mormente, a revogação da decisão judicial em crise e a absolvição do pedido formulado na presente acção.

O Magistrado do Ministério Público junto do TAF de Braga, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 99/100) nas quais, em suma, sustenta a improcedência do recurso jurisdicional e a manutenção da sentença recorrida, não formulando quaisquer conclusões.

Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” [cfr. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, págs. 459 e segs.

    ; M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71].

    As questões suscitadas pelo recorrente resumem-se em determinar se na situação vertente a decisão recorrida ao declarar a perda de mandato do R., aqui ora recorrente, fez errada aplicação do disposto nos arts. 01.º, 03.º, n.º 1 da Lei n.º 04/83, de 02/04 (na redacção dada pela Lei n.º 25/95, de 18/08), 10.º e 11.º da Lei n.º 27/96, de 01/08 [cfr. alegações e conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resulta da decisão de facto inserta na sentença recorrida o seguinte quadro factual: I)...

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