Acórdão nº 0999/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução29 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A..., com os sinais dos autos, interpõe recurso de revista excepcional, ao abrigo do artº150º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido a fls.195 e segs., que negou provimento ao recurso jurisdicional do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou totalmente improcedente a presente acção administrativa especial e absolveu do pedido, as entidades demandadas CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÃO e MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA e a contra-interessada ESCOLA EB 2.3 ....

Nas suas alegações de recurso, a recorrente formulou as seguintes CONCLUSÕES: A. Em causa nos presentes autos está uma questão - direito à reforma - que, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental, carecendo os cidadãos de ver assegurados os princípios da tutela da confiança dos cidadãos na ordem jurídica enquanto corolário de um Estado de Direito, da igualdade e da justiça respectivamente consagrados nos artº2º, 13º e 266º todos CRP, permitindo que se reforme quem à data em que formulou o pedido preenchia os requisitos de que a lei fazia depender aquele direito.

B. O recurso também deverá ser admitido por ser claramente necessário para uma melhor aplicação do Direito, uma vez que se impõe que os Tribunais confiram segurança aos cidadãos na prolação das suas decisões.

C. No caso concreto, são diversas as decisões judiciais ( Proc. Nº 0239/05, de 03.11.2005 - 2ª Secção do Contencioso Administrativo Supremo Tribunal Administrativo; Proc. Nº 0239/05, de 11.10.2006- Pleno da Secção de Contencioso Administrativo Supremo Tribunal Administrativo; Proc. Nº 1063/05, de 09.03.2006, Tribunal Central Administrativo Sul) que se têm pronunciado no sentido aqui defendido pela recorrente, ou seja, a correcta interpretação e aplicação da lei impõe que os tribunais reconheçam e confirmem o princípio da precedência da lei ( Decreto Lei nº116/85, de 19 de Abril) sobre despacho ( Despacho 867/03/MEF) com natureza regulamentar.

D. Constitui omissão de pronúncia o incumprimento por parte do juiz do dever prescrito no nº2 do artº660º do Código de processo Civil (doravante apenas CPC) e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, com excepção daquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras.

E. Tal incumprimento fere de nulidade a decisão judicial em que se verifique a referida omissão de pronúncia.

F. No caso concreto, o tribunal a quo não se pronunciou sobre duas das questões que foram suscitadas pela recorrente, a saber: - Aplicação das leis no tempo; - Ilegalidade do Despacho 867/03/MEF, enquanto fonte normativa.

G. Assim, a aplicação da lei ( artº 12º CC) leva-nos a concluir que não existindo na ordem jurídica portuguesa o Despacho nº867/03/MEF, aquando da formulação do pedido de aposentação antecipada da A., ora recorrente, mas apenas o Decreto-Lei nº116/85, de 19.04, deveria ser a lei a aplicar no caso concreto, pelo que encontrando-se definido o quadro normativo que deveria reger pedido de aposentação antecipada formulado pela A., forçoso é concluir que mal andou o Tribunal de 1ª Instância, ao fazer valer despacho ministerial proferido em memento posterior à formulação do pedido de aposentação antecipada, em clara violação do preceituado nos nº1 e 2 do artº12º CC, sob a epígrafe " Aplicação das leis no tempo. Princípio geral" e, bem assim, mal andou o Tribunal a quo ao não se ter pronunciado sobre esta questão suscitada pela recorrente, como era seu dever, nos termos do artº660º, nº2 do CPC.

H. Ou seja, a correcta aplicação da lei vigente à data da formulação do pedido conduziria necessária e indubitavelmente ao reconhecimento do direito à aposentação antecipada formulado pela A., ora recorrente, em 24.07.2003, mercê desta reunir os pressupostos de que a lei vigente fazia depender tal direito: 36 anos de serviço e inexistência de prejuízo para o serviço - cf. alínea C) dos factos provados.

I. Nesta conformidade, a omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo fere de nulidade o douto acórdão recorrido, nos termos do artº660º, nº2CPC.

J. Também o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a ilegalidade do Despacho 867/03/MEF enquanto fonte normativa.

K. O Decreto-Lei nº116/85, de 19.04 não conferiu à Caixa Geral de Aposentações competência para discricionariamente averiguar e/ou aferir dos fundamentos da existência ou inexistência de prejuízo para o serviço, mas antes traçou linhas vinculativas da decisão.

L. Nesta conformidade, se o requerente tem mais de 36 anos de serviço efectivo e parecer favorável dos serviços sobre a inexistência de prejuízo para os mesmos (o que a A., ora recorrente, logrou demonstrar) a informação da Caixa Geral de Aposentações só pode ser favorável à aposentação.

M. O Despacho nº687/03/MEF não invoca qualquer norma habilitante que permita à Caixa Geral de Aposentações aferir da existência ou inexistência de prejuízo para o serviço.

N. Ao referido despacho falta-lhe legalidade constitutiva, mercê deste não ter atribuído competências à Caixa Geral de Aposentações que esta não detinha, mantendo-se a sua actuação vinculada, por força do Decreto Lei nº 116/85, de 19.04 e artº1º, nº1 do Decreto Lei nº 277/93, de 10.08.

O. Em consonância com o princípio da legalidade, apenas a lei pode fixar competência, uma vez que esta não se presume - cfr. Artº29º do CPA.

P. Tais interpretação e aplicação da lei, as quais culminaram no indeferimento da pretensão da A., ora recorrente, estão em frontal violação com os poderes vinculados da Caixa Geral de Aposentações, no que à verificação da existência ou inexistência de prejuízo diz respeito e que resultam do artº1º, nº1 do Decreto Lei nº277/93, de 10.08, artº3º do Decreto Lei nº 116/85, de 19.04 e artº29º do CPA.

Q. Caso o Tribunal a quo se tivesse pronunciado sobre as duas questões que foram suscitadas, decerto a sua decisão teria sido em sentido diametralmente oposto.

R. A omissão de pronúncia viola assim o disposto no nº2 do artº 660º do CPC e, em consequência, ferindo de nulidade o douto acórdão.

S. Aplicável ao pedido de aposentação deduzido pela A. é o Decreto-Lei nº116/85, de 19 de Abril e neste sentido tal diploma legal não estabeleceu os moldes em que a verificação do prejuízo para o serviço deveria ser declarada, apenas estatuindo, no seu artº3º, que os processos seriam informados pelo respectivo departamento, designadamente quanto à inexistência de prejuízo para o serviço e submetido a despacho pelo membro do Governo competente, o qual, concordando, determinará o envio do processo à Caixa Geral de Aposentações.

T. Todavia, o Despacho 867/03/MEF estabelece condições e parâmetros de apreciação, que devem integrar o conteúdo da falada inexistência de prejuízo para o serviço, assim inovando em relação ao que estava prescrito no Decreto Lei nº116/85, de 19 de Abril.

U. O referido Despacho, tendo como tem natureza regulamentar, não se compagina com o princípio da primaridade ou precedência da lei, como determina o artº112º, nº2 da CRP e o nº6 do artº9º da Lei nº 74/98, de 11.11, de igual forma atentando contra o princípio da preferência ou preeminência da lei, tudo levando à legalidade do questionado Regulamento, sendo que, por último, aquele Despacho não foi objecto de publicação, como estipula o artº119º, alínea h) da CRP, o que gera a sua inoponibilidade ou não obrigatoriedade.

V. A fundamentação do acto administrativo objecto dos presentes autos de não concordância com a inexistência de prejuízo para o serviço, sob a invocação expressa do Despacho nº 867/03/MEF e por aplicação dos parâmetros de avaliação nele fixados, constitui causa bastante para a invalidação do acto, com base no vício de violação de lei, por falta de base legal.

W. Não releva para os presentes autos a circunstância de qualquer funcionário poder ser substituído pela colocação do seu lugar a concurso público, na medida em que a lei não distinguir qualquer categoria profissional, apenas exigindo os 36 anos de serviço e a inexistência de prejuízo para o serviço.

X. Veio o Tribunal a quo dizer que o procedimento administrativo não foi submetido a despacho ministerial do membro do Governo competente como se refere no ofício de 27.01.2004 da Caixa Geral de Aposentações.

Z. No uso da sua competência, aquele Sr. Director Regional Adjunto emitiu ofício circular atribuindo competência aos presidentes dos conselhos executivos para aferirem e decidirem da inexistência de prejuízo.

AA. A presidente do conselho executivo da Escola E.B.2.3 ..., no Cacém, no uso das suas competências, que lhe foram conferidas aferiu e decidiu da inexistência de prejuízo, facto com o qual a recorrida Caixa Geral de Aposentações se conformou e bem - alíneas l) e J) dos factos provados.

BB. Em face do que antecede, cremos modestamente que o tribunal a quo não podia pronunciar-se sobre questões de que não podia tomar conhecimento.

CC. Ao tê-lo feito, da forma que o fez, feriu de nulidade o douto acórdão recorrido, nos termos do artº668º, nº1 d) in fine do CPC.

DD. E, mesmo que assim não se entenda, mal fora que o órgão do Governo competente se exima das suas competências (próprias, delegadas ou subdelegadas) transferindo aquelas para órgão hierarquicamente inferior e, actuando este no respeito pelas competências que lhe foram atribuídas venha o particular - no caso, a ora recorrente- ser manifesta e gravosamente prejudicada.

EE. Veio o Tribunal a quo considerar que não assistia à recorrente o direito de suscitar a questão da igualdade sobre o tratamento dado a suas colegas suas.

FF. Se a recorrente suscitou tal questão em sede de recurso foi por ter sido nessa altura que teve conhecimento de tal situação - que elas se teriam reformado de acordo com a lei vigente e a recorrente não.

GG. Ora, dispõe o artº13º , nº1 da CRP, " Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a...

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