Acórdão nº 09S3363 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução07 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório AA propôs, no Tribunal do Trabalho de Oliveira de Azeméis, a presente acção contra BB e mulher BB, CC - Equipamentos e Máquinas de Escritório, L.da e Funcional - Divisão e Decoração, L.da, pedindo que os réus fossem condenados a pagarem-lhe: i) todas as retribuições e subsídios que teria auferido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão; ii) uma indemnização que deverá ser graduada em 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade ou fracção, ou seja, € 8.775,00 (€ 650,00 x 1,5 x 8), actualizável à data da decisão definitiva em função da antiguidade da autora; iii) a quantia de € 1.373,08, a título de abono de falhas; iv) a quantia de € 2.000,00, a título de despesas que teve de suportar em transportes, entre 1.6.2003 e 26.1.2004; v) a quantia de € 913,95, a título de trabalho suplementar; vi) a quantia de € 5.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais referidos nos artigos 57.º a 62.º da petição inicial; vii) a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais referidos nos artigos 63.º e 64.º da petição; viii) a quantia de € 750,00, a título de indemnização pelo desgaste, manutenção e conservação da viatura que utilizava nas deslocações de e para o local de trabalho, conforme referido nos artigos 67.º e 68.º da petição; ix) a quantia de € 1.950,00 referente à retribuição do mês de Janeiro de 2004 e à retribuição e subsídio das férias vencidas em 1 de Janeiro de 2004.

Em resumo, a autora alegou o seguinte: - foi admitida ao serviço da Tecnicambra - Equipamentos de Escritório, L.da, em Novembro de 1996, mediante retribuição que era constituída por vencimento base, férias, subsídio de férias e de Natal, subsídio de alimentação e transporte da residência para o local de trabalho; - desde o início do contrato, a "Tecnicambra" tinha distribuído à autora uma viatura ligeira, para que ela se deslocasse desde a sua residência, inicialmente em Ossela e, após o seu casamento, em Vale de Cambra, para o local de trabalho em Oliveira de Azeméis, suportando a "Tecnicambra" as despesas com a manutenção da viatura, seguro, combustíveis e outros; - a partir de 1.6.2003, a "Tecnicambra" encerrou as suas instalações e transferiu a autora para Albergaria-a-Velha, informando os seus clientes de que tinha optado por uma fusão com a ré Funcional - Divisão e Decoração, L.da, passando, a partir dessa data, a dispor de amplas instalações comerciais e fabris na zona industrial de Albergaria-a-Velha; - a partir de 1.6.2003 e por determinação do réu BB, sócio-gerente da "Tecnicambra", a autora passou a trabalhar nas instalações da 3.ª ré (a "Funcional"), em Albergaria-a-Velha e, posteriormente, nas instalações de 2.ª ré (a "CC"), trabalhando alternadamente numa e noutra, conforme indicação daquele sócio-gerente; - a partir da referida data, a "Tecnicambra" deixou de fornecer transporte à autora, pois não só lhe retirou a viatura que lhe tinha destinado, como deixou de lhe fornecer qualquer espécie de transporte desde a sua residência, em Vale de Cambra, para Oliveira de Azeméis e, depois, para Albergaria-a-Velha; - no dia 26.1.2004, o primeiro réu chamou a autora ao seu gabinete e despediu-a e, posteriormente, entregou-lhe uma declaração datada de 26.1.2004, dela constando que "(...) a entidade empregadora toma a iniciativa de cessar o contrato de trabalho com a Srª AA por se ter tornado impossível a manutenção do posto de trabalho por encerramento da empresa (...)"; - o primeiro réu encerrou a "Tecnicambra" sem ter observado o disposto nos artigos 390.º e 419.º do Código do Trabalho e também não cumpriu o disposto nos artigos 390.º, n.º 5, e 401.º do mesmo Código, já que não pagou à autora qualquer compensação ou indemnização decorrente da cessação do contrato; - a autora foi despedida sem justa causa e sem procedimento disciplinar, daí resultando a ilicitude do seu despedimento; - o primeiro réu era sócio maioritário e sócio-gerente quer da "Tecnicambra", quer da 2.ª e da 3.ª rés, sendo o único gerente destas, e geria pessoalmente cada uma das três empresas, distribuindo os trabalhadores pelas referidas empresas e gerindo o pessoal e os serviços de acordo com as necessidades das mesmas; - as três empresas constituíam um expediente da estratégia comercial no âmbito do exercício da sua actividade, estratégia essa que era da responsabilidade do 1.º réu, enquanto sócio-gerente das mesmas, e que consistia na distribuição de serviços, de clientes, de materiais, de equipamentos, de instalações e de sede das empresas, na transferência dos trabalhadores e no encaminhamento de clientes e serviços de umas para outras empresas; - daí a legitimidade do 1.º réu e da 2.ª e 3.ª rés; - por escritura de 11.2.2004, outorgada no Cartório Notarial de Albergaria-a-Velha, os primeiros réus, então únicos sócios da Tecnicambra - Equipamentos de Escritório, L.da, procederam à sua dissolução, sendo que a mesma já anteriormente havia sido encerrada pelo primeiro réu; - a responsabilidade e legitimidade dos primeiros réus e da 2.ª e 3.ª rés sempre resultariam do disposto nos artigos 378.º e 379.º do Código do Trabalho e dos artigos 78.º a 83.º do Código das Sociedades Comerciais; - por força do disposto na cláusula 19.ª, n.º 5, do CCT aplicável ao sector do comércio do distrito de Aveiro, publicado no BTE n.º 15/95, com PE publicada no BTE n.º 30/95, a autora tinha direito ao pagamento de um abono para falhas no montante de 2.100$00/€ 10,48, por mês, que nunca lhe foi pago; - em consequência de ter sido transferida para Albergaria-a-Velha, a autora passou a despender diariamente mais 1h30 em transportes, que lhe devia ter sido pago como trabalho suplementar; - a autora sentiu-se humilhada e desconsiderada pelo facto do 1.º réu lhe ter retirado o transporte e não lhe ter pago qualquer valor compensatório pela retirada da viatura, pela utilização da sua viatura pessoal e pelo acréscimo do tempo diário em deslocações, computando esses danos em quantia não inferior a € 5.000,00; - a autora também teve um grande sofrimento e aflição e sentiu-se insegura e preocupada com o seu futuro, em consequência da cessação do contrato de trabalho, estimando a compensação desses danos em quantia não inferior a € 10.000,00; - devido ao facto de ter de utilizar a sua viatura, nas deslocações da sua residência para o local de trabalho em Albergaria-a-Velha e vice-versa, a autora teve um acrescido prejuízo económico com o desgaste, manutenção e conservação do seu veículo automóvel, que estima em € 750,00; - a autora não recebeu a retribuição referente ao mês de Janeiro de 2004, nem a retribuição e o subsídio das férias vencidas em 1 de Janeiro de 2004.

Na contestação conjunta, os réus pugnaram pela sua ilegitimidade e, sem prescindir, pela total improcedência da acção.

No despacho saneador, decidiu-se pela legitimidade dos réus e foi dispensada a selecção da matéria de facto já assente, bem como a elaboração da base instrutória.

Realizado o julgamento, com gravação da prova, e, fixada a matéria de facto, foi, posteriormente, proferida sentença, nela se decidindo: a) absolver os réus AA e mulher BB e a ré CC - Equipamentos e Máquinas de Escritório, L.da, de todos os pedidos formulados; b) declarar ilícito o despedimento da autora; c) condenar a ré Funcional - Divisão e Decoração, L.da (a 3.ª ré) a pagar à autora, tão-somente: i) as retribuições e subsídios vencidos desde 12.12.2004 até ao trânsito em julgado da decisão, à razão mensal de € 650,00 cada; ii) uma indemnização, em substituição da reintegração, à razão de 15 dias de retribuição base, por cada ano completo ou fracção de antiguidade, actualizável até ao trânsito e que, na data da sentença, ascendia a dez anos e uma fracção, ou seja, a € 3.575,00 (11 x €650,00:2); iii) a quantia de € 500,00, a título de indemnização pelos danos morais decorrentes do despedimento; iv) a quantia de € 641,40 respeitante à retribuição do trabalho prestado no mês de Janeiro de 2004, com o correspondente subsídio de alimentação; v) a quantia de € 1.300,00 referente às férias e respectivo subsídio vencidas em 1.1.2004; vi) o custo das viagens que a autora teria suportado deslocando-se em transportes públicos de Vale de Cambra para Albergaria-A-Velha e vice-versa, desde 1.6.2003 até 26.1.2004, a liquidar posteriormente em incidente próprio; vii) os juros de mora, à taxa legal, referentes àquelas quantias, contados desde o respectivo vencimento.

Para decidir deste modo, a sentença da 1.ª instância considerou, em resumo, o seguinte: - a utilização da viatura, por parte da autora, até 1.6.2003 (data em que foi transferida de Oliveira de Azeméis para Vale de Cambra), nas deslocações da sua residência para o local de trabalho e vice-versa, não constituía uma prestação remuneratória, mas sim uma mera liberalidade do empregador; - em consequência da transferência referida, a autora passou a ter direito ao pagamento das despesas que com as ditas deslocações teria de suportar utilizando os transportes públicos e não o seu automóvel, mas não ao pagamento do tempo despendido nessas deslocações; - face à factualidade dada como provada, conclui-se que o estabelecimento comercial da Tecnicambra - Equipamentos de Escritório, L.da foi transmitido para a 3.ª ré, a Funcional - Divisão e Decoração, L.da, e, por via dessa transmissão, a autora passou a ser trabalhadora desta ré, a partir de 1.1.2004; - deste modo, a comunicação verbal feita à autora, em 26.1.2004, pelo réu BB, de que a partir daquela data não tinha mais trabalho para ela, porque a "Tecnicambra" havia encerrado, bem como a posterior comunicação, datada da mesma data, configuram uma declaração de despedimento ilícito; - por força da transmissão do estabelecimento da "Tecnicambra" para a ré "Funcional" e da consequente transferência para esta do contrato de trabalho da autora, a responsabilidade pelos créditos devidos à autora recai sobre a ré...

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