Acórdão nº 297/15 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelCons. João Pedro Caupers
Data da Resolução02 de Junho de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 297/2015

Processo n.º 369/14

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Pedro Caupers

Acordam, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

  1. O magistrado do Ministério Público junto do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães interpôs recurso para este Tribunal da sentença proferida por aquele tribunal, em ação especial de despejo, que considerou inconstitucional e consequentemente desaplicou os preceitos dos artigos 26.º, n.º 4, alínea a), e 28.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhes foi dada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto.

    Entendeu o tribunal que aqueles preceitos, interpretados no sentido de abrangerem os casos em que tenha decorrido integralmente, no domínio da versão originária do citado artigo 26,º, n.º 4, e da alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do Regime do Arrendamento Urbano (doravante, “RAU”), o tempo de permanência do arrendatário, ofendem «os princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança».

    Em causa estava um litígio entre A. e B. e esposa, C., tendo por objeto um imóvel de propriedade do primeiro, arrendado aos segundos.

    Pretendia o proprietário, alegando sê-lo há mais de três anos, não possuir outro prédio para habitação no concelho em causa ou noutro limítrofe e necessitar do imóvel arrendado para sua habitação própria, denunciar aquele contrato de arrendamento, conforme comunicação feita aos inquilinos por carta registada com aviso de receção datada de 27 de Novembro de 2012.

    Os arrendatários deduziram oposição, invocando a inconstitucionalidade do procedimento especial de despejo aprovado pela Lei n.º 31/2012, por violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva plasmado no artigo 20º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (doravante “CRP”), acrescentando que à data da publicação daquele diploma legal se havia já consolidado na sua esfera jurídica o direito de oposição à denúncia do arrendamento por parte do senhorio previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU, uma vez que tinham já decorrido trinta anos desde a celebração do contrato.

    Sustentaram ainda os arrendatários que as normas dos artigos 26.º, n.º 4, alínea a), e 28.º da Lei n.º 6/2006, com redação que lhes foi dada pela Lei n.º 31/2012, se interpretadas no sentido de abrangerem os casos em que já decorrera integralmente, no domínio da lei antiga, o tempo de permanência do arrendatário indispensável para, segundo essa lei, impedir o exercício do direito de denúncia pelo senhorio, são inconstitucionais, por violação do artigo 2.º da CRP.

  2. Da decisão recorrida, favorável aos arrendatários, respigam-se os passos mais significativos (fls. 376 e 378):

    (…) É que, como bem notam os réus na sua oposição, à data da entrada em vigor da Lei fl2 31/2012, de 14 de Agosto - que ocorreu em 14 de Novembro de 2012 - já o réu B. se mantinha no arrendado, e na qualidade de arrendatário, há mais de 30 anos. Como resulta dos factos provados, a vigência do arredamento iniciou-se em 1 de Fevereiro de 1982; Logo, a 1 de Fevereiro de 2012 completaram-se três décadas sobre a data em que o contrato de arrendamento teve o seu início. Donde, a admitir-se sem limitações a aplicação retroativa das alterações introduzidas por aquela Lei, na parte em que eliminou a permanência no arrendado há 30 ou mais anos como fundamento de oposição à denúncia por parte do senhorio, estaria a permitir-se a eliminação de um direito subjetivo que se havia já consolidado na esfera jurídica do réu.

    Ou seja: mantendo-se o réu no arrendado, nessa qualidade, há mais de 30 anos no momento em que entrou em vigor a alteração introduzida no artigo 26, nº 4, al. a) da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro pela Lei nº 31/2012, de 14 de Agosto, a permitir-se sem restrições a aplicação na nova lei e, assim, autorizar o despejo dos réus, estar-se-ia a destruir a legítima expectativa do...

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