Acórdão nº 0847790 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Abril de 2009
Magistrado Responsável | CUSTÓDIO SILVA |
Data da Resolução | 15 de Abril de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acórdão elaborado no processo n.º 7790/08 (4ª Secção do Tribunal da Relação de Porto)**1. Relatório Na sentença, com data de 2 de Outubro de 2008, consta, do dispositivo, o seguinte: "Pelo exposto, e ao abrigo dos citados preceitos, condeno o arguido B.........., como autor material e sob a forma consumada de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, n.º 1, do C. P., na pena de 11 (onze) meses de prisão, cuja execução se suspende, ao abrigo do disposto no art. 50º, n.ºs 1 e 5, do C. P., por um período de 1 (um) ano, ficando a mesma subordinada, ao abrigo do disposto nos arts. 50º, n.ºs 2 e 3, 51º, n.º 1, e 52º, n.ºs 1 e 3, do C. P., à frequência por parte do arguido do programa STOP - Responsabilidade e Segurança, com as suas quatro componentes: a) frequência de um curso sobre comportamento criminal e estratégias pessoais de prevenção da reincidência, ministrado pelo IRS; b) frequência de um curso sobre condução segura, ministrado pela Prevenção Rodoviária Portuguesa, em local e data a definir pelo IRS, pago pelo arguido; c) inscrição numa consulta de alcoologia, em data e hora a definir pelo IRS, para despiste de problemas de alcoolismo e avaliação da necessidade de tratamento médico dessa problemática e consequente tratamento, obtida a concordância do arguido; d) participação em entrevistas de acompanhamento com o técnico de reinserção social que apoia a execução da medida.
Determino, ainda, a cassação do título que habilita o arguido a conduzir veículos com motor de qualquer categoria e, assim, a interdição da concessão ao arguido de novo título de condução de veículos com motor, de qualquer categoria, durante 2 (dois) anos".
**O arguido veio interpor recurso, tendo a motivação terminado pela formulação das seguintes conclusões (no que se refere às explicitadas, como tal, assim, efectivamente, não podem ser tidas - o que, abaixo, sai demonstrado pela referência, expressa, às mesmas -, mas que desse modo se referem por comodidade de designação ...; o convite ao seu efectivo dimensionamento, para lá de duvidosa legalidade, como se colhe do art. 417º, n.º 3, do C. de Processo Penal, corresponderia, igualmente, a uma efectiva perda de tempo, pois, quem não procedeu, como devia, desde logo, também não vem, nos devidos termos, a fazê-lo, posteriormente): "1ª - Não pode, de forma alguma, o arguido/recorrente, concordar com a douta sentença ora recorrida, que decidiu pela sua condenação na pena de 11 (onze) meses de prisão, suspensa na sua execução, ao abrigo do disposto no art. 50º, n.ºs 1 e 5, do C. Penal, por um período de 1 (um) ano, e, nessa sequência, determinou a cassação do título que habilita o ora recorrente a conduzir veículos a motor de qualquer categoria e a interdição da concessão de um novo título de condução de veículos com motor, de qualquer categoria, durante 2 (dois) anos, na medida em que entende ser tal decisão passível de censura.
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- Desde logo porque a pena de prisão aplicada ao ora recorrente se revela como absolutamente desadequada ao caso presente, na medida em que, tendo sido o mesmo julgado e condenado pela prática de um crime cuja moldura penal abstracta prevê, em alternativa à pena de prisão, a aplicação de pena de multa, sempre a aplicação dessa pena de multa realizaria de forma absolutamente adequada e suficiente as finalidades da punição.
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- Pois que, sendo no nosso sistema jurídico-penal dada sempre preferência às penas não privativas de liberdade, é de concluir como de todo incompreensível e desadequada às circunstâncias do caso presente, e, bem assim, à personalidade do recorrente, a pena de prisão aplicada, ainda que a mesma haja sido suspensa na sua execução.
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- Não obstante haver o recorrente sido já condenado por duas ocasiões pela prática do mesmo tipo de crime, a verdade é que, atenta a idade do mesmo, e, bem assim, o facto de se encontrar social, familiar e profissionalmente inserido, de modo algum a aplicação da pena de prisão surge como ‘indispensável para a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias'.
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- Até porque, atenta a especificidade do tipo de crime em apreço, de forma alguma se poderá concluir pela existência de uma qualquer necessidade premente de reinserção na sociedade do aqui recorrente, a ponto de tal reinserção só ser possível com a aplicação ao mesmo de uma pena de prisão e, não, da pena, alternativa, de multa.
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- No caso presente, é forçoso concluir-se que a opção pela aplicação, ao aqui recorrente, de uma pena de prisão, ainda que suspensa na sua execução, não se mostra, de modo algum, como correcta e justa, pecando por manifestamente desadequada, não se enquadrando nos princípios legais dos arts. 40º e 70º do C. Penal.
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- Ao invés, sempre deverá optar-se, nos termos desse art. 70º, por uma pena não privativa de liberdade, pois que a mesma sempre se mostra passível de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, no que ao recorrente e ao crime dos autos se refere.
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- Por outro lado, sem conceder em tudo o exposto, e atentos os fundamentos invocados, sempre haverá que referir, ainda, que não pode, o recorrente, concordar com a medida de segurança de cassação do título e interdição da concessão do título de condução de veículo com motor que lhe foi aplicada, por entender não se mostrarem reunidos os requisitos necessários à aplicação de uma tal medida de segurança, não sendo a mesma, de todo, ‘proporcional à gravidade dos factos e à perigosidade do agente'.
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- Uma qualquer ‘inaptidão' para a condução de veículo com motor não resulta, por si só, do mero facto de haver, o recorrente, sido condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º do C. Penal.
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- Pois que tal condenação não basta, por si, para ser tida como ‘automaticamente' reveladora da inaptidão referida na alínea b) do n.º 1 do art. 101º do C. Penal.
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- Antes, sim, sendo de entender como, apenas e só, face ao facto praticado e à personalidade do agente, susceptível de revelar tal inaptidão (cfr. art. 101º, n.ºs 1 e 2, al. c), do C. Penal).
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- Na verdade, com a conduta levada a cabo por si, não demonstrou, o recorrente, uma qualquer incapacidade ou falta de aptidão para a condução de veículos.
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- Até porque nunca será a condução, em condições proibidas - seja, em estado de embriaguez -, de veículo com motor, aquilo que está, verdadeiramente, em causa na aplicabilidade da medida de segurança em apreço, mas antes, sim, a prática de um outro crime resultante da própria condução (cfr. douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Porto, de 05-01-2005, proferido no âmbito do proc. 0414555, e acessível in www.gdsi.pt).
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- De modo algum serão de relevar, nesta sede, os antecedentes criminais do recorrente, sendo os mesmos, apenas, de considerar, como foram, em sede de medida da pena, ou outras, relacionadas com a pena principal e/ou acessória, e, nunca, com uma qualquer medida de segurança como a ora em apreço (cfr. supra referido douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Porto, de 05-01-2005).
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- Não se compreende como foi possível, com base numa prognose favorável ao ora recorrente, ter o Digníssimo Tribunal a quo decidido pela suspensão na execução da pena principal, nos termos do disposto no art. 50º, e ss., do C. Penal, e, ao mesmo tempo, pela aplicação de uma medida de segurança como a ora em causa, cuja aplicação, sempre, exigiria a existência de uma manifesta perigosidade por parte do recorrente (cfr. douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Porto, de 25-09-2002, proferido no âmbito do proc. 0240610, e acessível in www.dgsi.pt).
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- Sendo de concluir, nessa sequência, pela existência de um claro contra-senso no pensamento do Digníssimo Tribunal a quo, na medida em que a aplicação de uma tal medida de segurança não será, de todo, sustentável aquando da conclusão pela existência de uma prognose favorável, que leva à decidida suspensão na execução da pena principal.
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- Da douta acusação pública deduzida nos autos e, bem assim, da douta sentença sob recurso, não resultam quaisquer factos reveladores da manifesta perigosidade do recorrente, requisito essencial para a aplicação de uma qualquer medida de segurança como a dos autos - cfr. art. 40º, n.º 3, do C. Penal.
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- Não sendo de ter, por isso, como verificados, no caso presente, os legais pressupostos para a aplicação, ao recorrente, da medida de segurança de cassação do título e interdição da concessão do título de condução de veículo com motor (cfr. douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, de 25-09-2007, proferido no âmbito do proc. 5737/2007-5, e acessível in www.dgsi.pt).
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- Donde, não sendo tal medida de segurança de aplicação automática e não tendo o Ministério Público requerido a condenação do recorrente na mesma, está o recorrente, modestamente, em crer que o Digníssimo Tribunal a quo violou o disposto no art. 48º do C. P. Penal e conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento, tendo em conta, quanto mais não seja, os factos que por si foram dados como provados.
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- Assim, a douta sentença ora recorrida deverá ter-se por nula na parte em que decidiu pela condenação do recorrente na medida de segurança que lhe foi aplicada, nos termos do disposto nos arts. 379º, n.º 1, als. a) e c), e 374º, n.º 2, do C. P. Penal, por haver o Digníssimo Tribunal a quo conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento, atendendo, ainda que mais não seja, à parca matéria factual por si dada como provada, em nada reveladora da ‘alegada' perigosidade do mesmo recorrente.
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- Sendo que, atendendo, ainda, a essa mesma matéria de facto tida como provada, sempre se deverá concluir, também, pela existência do vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada - cfr. art. 410º, n.º 2, al. a), do C. P. Penal.
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- A douta sentença sob recurso violou os arts. 40º, n.ºs 1 e 3, 70º, 1o1º e 292º do C. Penal...
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