Acórdão nº 0826401 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelGUERRA BANHA
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 6401/08-2 1.ª Secção Cível NUIP ..../07.4TBVCD Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.

I 1. B.........., S.A., com sede em .........., Vila do Conde, instaurou procedimento de injunção, ao abrigo do disposto no art. 7.º do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17/02, contra C.........., LDA, com sede no .........., em Guimarães, para obter desta o pagamento da quantia de 7.867,32€, relativa ao fornecimento de serviços de transporte de mercadorias, a que aludem as facturas que juntou a fls. 4-9, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, às taxas previstas nos § 3.º e 4.º do art. 102.º do Código Comercial, calculando os vencidos, desde 05-05-2006, em 353,29€.

A demandada deduziu oposição, alegando, em síntese, que nada tem a pagar à requerente, porquanto esta não cumpriu os prazos estabelecidos para a entrega das mercadorias aos seus clientes, os quais, por esse motivo, recusaram pagar à demandada.

Por via da oposição deduzida, os autos passaram a ser tramitados segundo o regime da acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, para que remete o art. 15.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01-09, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 107/2005, de 01-07, e posteriormente alterado pela Lei n.º 14/2006, de 26-04, e pelos Decretos-Lei n.ºs 303/2007, de 24-08, e 34/2008, de 26-02.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a fls. 119-131, que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a demandada do pedido.

  1. A demandante apelou dessa sentença, concluindo as suas alegações do seguinte modo: 1.º - A Recorrida apenas alegou atrasos na entrega das mercadorias para justificar o não pagamento das facturas, excepção de não cumprimento que o Meritíssimo Juiz a quo entendeu extrair-se dos factos alegados e considerou improcedente.

    1. - Deste modo, quer da matéria dada como provada, quer da fundamentação da sentença em apreço, só poderia ter resultado a condenação da Recorrida no pedido, e não a sua absolvição, estando assim a decisão em manifesta contradição com a própria fundamentação, o que constitui causa de nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil.

    2. - A sentença recorrida violou igualmente o disposto no artigo 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e está ferida da nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte, do mesmo Código, na medida em que absolveu a Recorrida na consideração de que o pedido da Recorrente ... "fere os princípios da boa-fé contratual e é, inclusive, um abuso de direito". Fundamentos que a Recorrida nunca alegou, acabando assim o tribunal por conhecer de uma questão que em nenhum momento foi suscitada pela Recorrida e sobre a qual a Recorrente, por isso mesmo, nem sequer teve a oportunidade de se pronunciar.

    3. - Complementarmente, deverá ter-se ainda em conta que essa conclusão da ofensa dos princípios da boa-fé e do abuso de direito, além de não ter sido alegada pela Recorrida, nem sequer tem qualquer suporte nos elementos de prova constantes dos autos, estando inclusive em contradição com os mesmos, pois, como resulta das datas de emissão das facturas, os serviços foram prestados entre 05-04-2006 e 30-10-2006, ou seja, durante cerca de 7 meses, sem qualquer reclamação da Recorrida. O que demonstra bem não haver qualquer ofensa dos princípios da boa fé, nem abuso de direito por parte da Recorrente.

    4. - Resulta igualmente da factualidade provada que os serviços foram prestados pela Recorrente com base em contratos de transporte internacional de mercadorias por via aérea, ao abrigo da Convenção de Montreal, aprovada pelo DL. n.º 39/2002, de 27-11. Pelo que, não tendo a Recorrida provado, e sequer alegado, que tivesse apresentado qualquer reclamação escrita no prazo máximo de 21 dias a contar da data em que a mercadoria foi colocada à disposição no destino, sempre teria precludido qualquer direito de acção que pudesse existir (artigo 31.º da citada Convenção).

    5. - Em suma, não é o facto de a Recorrida ter alegado apenas que os seus clientes não lhe pagaram, sem sequer alegar ou quantificar que prejuízos os mesmos tiveram e, mais ainda, sem demonstrar ter havido qualquer nexo de causalidade entre esses supostos prejuízos e o dia em que as mercadorias foram entregues, tudo conforme exigido pelo artigos 562.º e 563.º do Código Civil, que de alguma forma pode ilibar aquela do dever de pagar esses serviços, a que correspondem as respectivas facturas.

    6. - Nos termos expostos, ao absolver a Recorrida, o Meritíssimo Juiz a quo não interpretou os factos provados ponderada e correctamente e daí não extraiu as evidentes conclusões, violando o disposto nos artigos 334.º, 562.º e 563.º do Código Civil, 798.ºe 799.º do Código de Processo Civil e ainda o artigo 20.º das Condições Gerais da Prestação de Serviços pelas Empresas Transitárias e o artigo 21.º da Convenção de Montreal.

    7. - Em boa verdade, ao substituir-se a outra instância jurisdicional, manietando a Recorrente dos instrumentos de defesa que teria ao seu dispor numa acção tendente apreciar a sua eventual responsabilidade, é a sentença recorrida que, em si mesma, fere a sensibilidade ética e jurídica, violando também o plasmado nos artigos 202.º, n.º 1 e n.º 2, e 203.º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o direito fundamental de defesa da Recorrente.

    8. - Face a todo o exposto, a sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene a Recorrida no pedido.

    A demandada contra-alegou, concluindo pela total improcedência da apelação e a consequente confirmação da sentença recorrida.

  2. Ao presente recurso é ainda aplicável o regime processual anterior ao Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, porquanto respeita a acção instaurada antes de 1 de Janeiro de 2008 (foi instaurada em 03-04-2007). E por força do disposto no n.º 1 do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 303/2007, o regime introduzido por este diploma legal não se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2008 (art. 12.º do mesmo decreto-lei).

    De harmonia com as disposições contidas nos arts 684.º, n.ºs 2 e 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável, são as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação que delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo das questões de que, por lei, o tribunal pode conhecer oficiosamente (art. 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).

    Tendo em conta o teor das conclusões formuladas pelos apelantes, o objecto do recurso compreende as seguintes questões: 1) se ocorre a nulidade da sentença prevista na al. c) do n.º 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil, por a decisão estar em manifesta contradição com a própria fundamentação; 2) se também ocorre a nulidade da sentença prevista na al. d), 2.ª parte, do n.º 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil, por, em violação do n.º 2 do art. 660.º do Código de Processo Civil, ter conhecido de questões que não foram suscitadas pelas partes e sem que à Recorrente fosse dada oportunidade de se pronunciar sobre tais questões; 3) se, para além disso, os factos provados impõem que a demandada seja condenado no pedido deduzido pela demandante.

    Cumpridos os vistos legais, cabe decidir.

    II 4. Na 1.ª instância foram julgados provados os factos seguintes: 1) A requerente, sob solicitação da requerida, prestou serviços no âmbito da actividade transitária, nos quais se incluía o transporte de mercadorias por via aérea, melhor discriminados nas facturas 657.256, 665.702, 665.703, 666.841, 667.735 e 667.753, datadas de 5 de Abril de 2006, 21 de Setembro de 2006, 21 de Setembro de 2006, 13 de Outubro de 2006, 30 de Outubro de 2006 e 30 de Outubro de 2006, respectivamente, juntas aos autos e que se dão por integralmente reproduzidas.

    2) Como contrapartida deveria a requerida pagar a quantia de: a) 831,69€, pela prestação dos serviços a que se refere a factura 657.256; b) 644,04€, pela prestação dos serviços a que se refere a factura 665.702; c) 1005,69€, pela prestação dos serviços a que se refere a factura 665.703; d) 5.385,90€, pela prestação dos serviços a que se referem as facturas 666.841, 667.735 e 667.753.

    3) As quantias referidas em 2) deveriam ser pagas 30 dias após as datas indicadas em 1).

    4) A requerida ainda não pagou tais montantes.

    5) A requerida acordou com a requerente para esta efectuar entregas de mercadorias por via aérea, em Roma, Bruxelas, Marselha e México a clientes que solicitaram o serviço à requerida.

    6) A factura n.º 657.256/2006 é referente ao serviço com destino a Roma, tendo sido requisitado para a mercadoria ser entregue no dia 06-04-2006 ao cliente da requerida.

    7) Porém, a mercadoria só foi entregue em 12-04-2006.

    8) A factura n.º 665.702/2006 é referente ao serviço com destino a Bruxelas, sendo que a mercadoria deveria ter sido entregue no dia 21-09-2006, mas só foi entregue a 22-09-2006.

    9) A factura n.º 665.703/2006 é referente ao serviço com destino a Marselha, sendo que a mercadoria deveria ter sido entregue no dia 21-09-2006, mas só foi entregue a 22-09-2006.

    10) As mercadorias entregues à requerente no que se reporta às facturas n.º 666.841/2006, 667.753/2006 e 667.735/2006, tinham como destino o México.

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