Acórdão nº 0816766 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução07 de Janeiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 6766/08-1)* Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto: *I- RELATÓRIO 1. No Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, nos autos de processo comum (tribunal singular) nº ...../07.5GAVNG a correr termos no ...º Juízo Criminal, foi proferida sentença, em 4/06/2008 (fls. 136 a 142), constando do dispositivo o seguinte: "Por tudo o exposto, decido: Condenar o arguido B.............., pela prática, em autoria material, de um crime de coacção grave na forma tentada, p. e p. pelos artigos 154°, nºs 1 e 2 e 155º, n.° 1, al. a) do Código Penal, na pena de 18 (dezoito) meses de prisão.

Decido suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido pelo período de 18 (dezoito) meses.

O arguido vai, ainda, condenado nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC, acrescida de procuradoria que se fixa em ½ (metade) de uma UC, de 1% a favor das vítimas de crimes violentos (artigo 13º do Decreto-Lei nº 423/91 de 30 de Outubro, bem como, os honorários a atribuir ao ilustre defensor oficioso em conformidade com a tabela anexa à Portaria nº 1386/04, de 10/11, a adiantar pelo C.G.T..

Notifique.

Procede-se ao depósito da sentença após a sua leitura (artigo 373º, nº 2 do Código de Processo Penal).

Após trânsito, remeta boletim ao Registo Criminal.

(...)"*2. Não se conformando com a sentença, o arguido B............. dela interpôs recurso (fls. 157 a 159), formulando as seguintes conclusões: " 1. O arguido não foi ouvido, não tendo oportunidade de exercer o contraditório.

  1. A condenação foi efectuada unicamente com base nas declarações do ofendido.

  2. A prova produzida tem como único fundamento a convicção pessoal do julgador, que num juízo de reconstrução da factualidade, alicerçada na sua experiência entendeu presumir a verificação dos factos.

  3. As únicas declarações ouvidas foram a de quase "parte", interessada num resultado, que em sede de julgamento entendeu afastar.

  4. A decisão violou o princípio in dubio pro reo, evidenciando através da motivação da convicção do tribunal; tendo ficado num estado de dúvida, decidiu contra o arguido.

  5. A conclusão retirada pelo tribunal em matéria de prova materializou-se numa decisão contra o arguido, que não foi suportada de forma suficiente - de modo a não deixar dúvidas irremovíveis quanto ao seu sentido - pela prova em que assenta a convicção.

  6. Sem conceder, o tribunal a quo deveria ter entendido que a existir tutela penal para os factos alegados, nunca estes preencheriam o tipo legal de coacção, p. e p. nos arts. 154 e 155 do CP.

  7. O exposto aproxima-se do tipo de ofensas à integridade física simples.

  8. A aplicação de uma medida criminal divertida poderia alcançar resultados mais relevantes e socialmente credíveis.

  9. O requerente não tem qualquer antecedente criminal em crimes que envolvam as restrições às liberdades individuais." Termina pedindo a revogação da sentença sob recurso, alterando-se a mesma e isentando de pena o arguido ou então que seja determinado o reenvio do processo para novo julgamento.

    *3. Na 1ª instância o Ministério Público respondeu ao recurso (fls. 183 a 191), pugnando pelo seu não provimento.

    *4. Nesta Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (fls. 198), concluindo pela rejeição do recurso por manifesta improcedência.

    *5. Foi cumprido o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.

  10. Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

    Cumpre, assim, apreciar e decidir.

    *7. Na sentença sob recurso: Foram considerados provados os seguintes factos: "1 - Com interesse directo e relevante para a decisão da causa, o tribunal tem por provada a factualidade que se segue: 2 - No dia 17 de Abril de 2007, cerca das 14.30 horas, na Rua ......., n.° ....., Vila Nova de Gaia, o arguido B................. tocou à campainha da residência do ofendido C.................

    3 - Após o ofendido ter aberto a porta, o arguido B.............. desferiu pelo menos um murro na face do ofendido e, empunhando uma arma de fogo de características não concretamente apuradas, apontada ao ofendido, anunciou-lhe que o mataria caso não pagasse a quantia de 1500€ que lhe devia, o que foi recusado por C.................

    4 - O ofendido logrou fugir e fechou a porta da sua residência enquanto o arguido disse que se o ofendido apresentasse queixa que iria desaparecer da face da terra e que ele mesmo o matava e que se não fosse ele alguém o faria.

    5 - Ao actuar como se descreveu, o arguido fê-lo com a intenção de constranger o ofendido, através de violência física e das ameaças à vida, a entregar-lhe a quantia de 1500€ contra a sua vontade e procurando aproveitar-se do temor e dores físicas que provocou em C................ e só não conseguiu naquele momento os seu intentos em virtude da recusa do ofendido, que reagiu à conduta do arguido e logrou que o mesmo saísse daquele local sem efectuar qualquer pagamento.

    6 - O arguido agiu de sua livre vontade, conscientemente e com pleno conhecimento de que a sua conduta era proibida por lei.

    7 - Do certificado de registo criminal do arguido consta que o mesmo já foi julgado e condenado em penas de multa pela prática em 17/04/2005, 19/05/2002, 29/05/2002 e 15/11/2002 dos crimes de emissão de cheque sem provisão." Quanto a factos não provados consignou-se: "Não existem factos considerados não provados.

    Não se logrou provar qualquer outro facto susceptível de influir na boa decisão da causa." No que respeita à fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto, mencionou-se: "A decisão da matéria de facto tem por base a análise critico-reflexiva do conjunto dos meios de prova produzidos em sede de audiência de julgamento, tendo tido em consideração, face à ausência do arguido: O depoimento do ofendido, o qual de forma séria, isenta e credível confirmou os factos constantes da acusação, esclarecendo, que o arguido lhe deu um murro na face. Declarou, também, que perdoou ao arguido e que se pudesse desistia da queixa apresentada.

    O teor do auto de participação, bem como, dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, o teor do auto de denúncia e o certificado de registo criminal do arguido." Na fundamentação da espécie e medida da pena escreveu-se o seguinte: "O crime de coacção em apreço é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos de prisão.

    De acordo com o artigo 23º, nº 2, a tentativa é punível com a pena aplicável ao crime consumado especialmente atenuada.

    Nos termos do art. 73º, nº 1º, a) do Código Penal "Sempre que houver lugar à atenuação especial da pena, observa-se o seguinte relativamente aos limites da pena aplicável: a) o limite máximo da pena de prisão é reduzido de um terço; b) o limite mínimo da pena de prisão é reduzido a um quinto se for igual ou superior a 3 anos e ao mínimo legal se for inferior; c) o limite máximo da pena de multa é reduzido de um terço e o limite mínimo é reduzido ao mínimo legal".

    A moldura abstracta do crime de coacção em apreço por aplicação do citado preceito e diploma legal, situa-se entre 1 mês e 3 anos e 4 meses.

    Importa, seguidamente, determinar a medida da pena que, em concreto, se adequa ao comportamento do arguido, para o que, de acordo com o disposto no artigo 71º, do Código Penal, se tem de atender à culpa do agente e às exigências de prevenção de futuros crimes, bem como, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte dos elementos essenciais da infracção, deponham a seu favor ou contra ele.

    Na determinação da medida da pena, far-se-á tendo em conta as exigências de prevenção de futuros crimes.

    No domínio atinente às exigências de prevenção geral, a pena satisfaz aqui necessidades de fortalecimento da consciência jurídica comunitária, isto é, visa a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, sendo certo que em sede de criminalidade contra o património, se fazem sentir particulares necessidades de prevenção, atento o elevado número de crimes desta natureza.

    No tocante às exigências ao nível da prevenção especial, torna-se necessário usar a pena na sua função subordinada de advertência do agente, alertando-o para uma maior conformação com os padrões axiológicos vigentes.

    Em sede de culpa, importa salientar que o arguido agiu com dolo directo.

    Favoravelmente ao arguido, importa ponderar a circunstância de o mesmo não possuir antecedentes criminais pela prática deste crime.

    Tudo ponderado, afigura-se-nos necessário e adequado aplicar ao arguido, a pena de 18 (dezoito) meses de prisão.

    O facto de o arguido não possuir antecedentes criminais pela prática deste crime e apenas ter sido condenado até ao momento por crimes de emissão de cheque sem provisão, todos eles punidos com penas de multa, consideramos que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

    Assim, nos termos do artigo 50º, nºs 1 e 5, do Código Penal (na redacção introduzida pela Lei nº 59/2007, de 04/09), decide-se suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido pelo período de 18 (dezoito) meses."*II- FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso, demarcado pelo teor das suas conclusões (art. 412 nº 1 do CPP), suscita a apreciação das seguintes questões: 1ª - Verificar se, por o arguido não ter sido ouvido em julgamento (o qual se realizou na sua ausência), ficou impossibilitado de exercer o contraditório; 2ª - Analisar se o recorrente/arguido cumpriu os ónus previstos no art. 412 nº 3 e 4 do CPP, uma vez que discorda da decisão proferida sobre a matéria de facto; 3ª - Ver se do texto da decisão sob recurso resulta haver insuficiência de provas, errada apreciação da prova (quanto à valoração do depoimento da testemunha/ofendido), violação do disposto no art. 127 do CPP e, ainda, do princípio do in dubio pro reo; 4ª - Apurar se existe erro de interpretação na subsunção dos factos ao direito (na sua perspectiva a sua conduta apenas integraria crime de ofensa à integridade física simples); 5ª - Ponderar a medida da pena (na sua perspectiva a pena que lhe...

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