Acórdão nº 0846482 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO.
Data da Resolução17 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 6482/08-04 Relator - Ernesto Nascimento Processo sumário .../08.5PAPVZ do .º Juízo criminal da Póvoa do Varzim Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No processo supra, em epígrafe, identificado, foi o arguido B.........., condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º/1 e 69º/1 alínea a) do Código Penal, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária € 5.00, o que perfaz a multa de € 300.00, bem como, na pena acessória de proibição de conduzir qualquer tipo de veículos motorizados pelo período de 3 meses; na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, durante 3 meses, com excepção dos veículos de matrícula ..-..-RF e ..-..-XA, no período compreendido, entre as 9 e as 19 horas de 2º a 6ª feira.

  1. 2. Inconformado, com o assim decidido, recorreu a Magistrada do MP, apresentando as seguintes conclusões: 1. o arguido foi condenado pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º/1 e 69º/1 alínea a) C Penal, na pena principal de 60 dias de multa à taxa diária de € 5,00, o que perfaz a quantia de € 300,00 e na pena acessória de proibição de conduzir qualquer tipo de veículos motorizados pelo período de 3 meses com excepção dos veículos de matrícula ..-..-RF e ..-..-XA, no período compreendido entre as 9 e as 19 horas, de 2ª a 6ª feira; 2. esta excepção diz respeito aos veículos que o arguido utiliza na sua profissão durante o seu horário de trabalho, entendendo a Mma. Juiz, para fundamentar a sua decisão no que à pena acessória concerne, que tal sanção não deve implicar necessariamente a perda de emprego; 3. é ilegal e não faz qualquer sentido condenar na proibição de conduzir veículos motorizados e depois restringir e excepcionar dessa proibição os veículos inerentes à profissão do arguido que sejam por ele conduzidos durante o seu horário de serviço; 4. é contraditório aplicar a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, porque se verificam os respectivos pressupostos e porque se reputa a mesma de necessária e, logo em seguida, desvirtuar essa pena, tornando-a meramente virtual; 5. a condenação por crime de condução em estado de embriaguez é fundamento de aplicação da proibição de conduzir pelos perigos que potencia para os restantes utentes das vias públicas ou equiparadas. E tais perigos não resultam da natureza do veículo, mas antes do estado em que se encontra quem o conduz; 6. por isso, a proibição de conduzir, quando tem como fundamento a condenação pelo crime do artigo 292º C Penal, não pode limitar-se a uma categoria de veículos, desde que destinados a circular em vias públicas ou equiparadas; 7. efectivamente, se a perigosidade da condução, que é a razão de ser da proibição, é alheia ao tipo de veículo que se conduz, por respeitar à pessoa do condenado, ela poderá verificar-se na condução de qualquer veículo com motor; 8. a interpretação que e feita ma decisão recorrida do artigo 69º C penal, não é admissível, não sendo possível uma condenação na sanção acessória de inibição de conduzir com determinadas ressalvas, designadamente a possibilidade de condução em determinados períodos do dia e de determinados veículos, e concreto, pois a admitir-se tal tipo de excepção a sanção acessória teria sempre um efeito inexistente; 9. os custos de ordem profissional e familiar que advirão para o arguido do facto de a proibição abranger a condução de todo o tipo de veículos motorizados, incluindo os que utiliza na sua actividade profissional, são próprios das penas, que só o são se representarem para o condenado um verdadeiro sacrifício, com vista a encontrarem integral realização, as finalidades gerais das sanções criminais, sendo que tais custos nada têm de desproporcionado em face dos perigos para a segurança das outras pessoas criadas pela condução em estado de embriaguez e que a aplicação da pena pretende prevenir; 10. assim, a segurança recorrida, na medida em que condenou o arguido na sanção acessória de proibição de conduzir pelo período de 3 meses, ficando o memos autorizado a, durante o horário de serviço (das 9 às 19 horas de 2ª a 6ª feira) conduzir os veículos inerentes à sua profissão, nomeadamente os de matrícula ..-..-RF e ..-..-ZA, violou o disposto no artigo 69º C Penal.

  2. 3. O arguido não respondeu.

  3. Subidos os autos a este Tribunal o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto, no seu parecer, defendeu, da mesma forma, dever ser dado provimento ao recurso.

    No cumprimento do estatuído no artigo 417º/2 C P Penal, nada mais foi acrescentado.

    Seguiram-se os vistos legais.

    Foram os autos submetidos à conferência.

    Cumpre agora apreciar e decidir.

  4. Fundamentação III.1. Como é por todos consabido, são as conclusões, resumo das razões do pedido, extraídas pelo recorrente, a partir da sua motivação, que define e delimita o objecto do recurso, artigo 412º/1 C P Penal.

    Assim, a questão a decidir, reporta-se, tão só, em saber se o artigo 69º C Penal consente no âmbito da aplicação da pena acessória de proibição de conduzir qualquer tipo de veículos motorizados por determinado período, a introdução de ressalvas, no caso, a possibilidade de condução em determinados períodos do dia, em determinados dias da semana, desde que ao volante de determinados veículos.

  5. 2. Na decisão recorrida decidiu-se nesta conformidade, consagrando-se como excepção, à decretada proibição de condução de veículos com motor, os de matrícula ..-..-RF e ..-..-XA, no período compreendido entre as 9 e as 19 horas, de 2ª a 6ª feira.

    Isto no entendimento de que a aplicação da pena acessória não deve implicar necessariamente a perda de emprego.

    Por seu lado, defende a recorrente, ser ilegal e destituído de sentido, condenar na proibição de conduzir veículos motorizados e depois restringir e excepcionar dessa proibição os veículos inerentes à profissão do arguido que sejam por ele conduzidos durante o seu horário de serviço; ser contraditório aplicar a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, porque se verificam os respectivos pressupostos e porque se reputa a mesma de necessária e, logo em seguida, desvirtuar essa pena, tornando-a meramente virtual.

    Afirma, ainda, a recorrente que, se a condenação por crime de condução em estado de embriaguez é fundamento de aplicação da proibição de conduzir pelos perigos que potencia para os restantes utentes das vias públicas ou equiparadas, estes perigos não resultam da natureza do veículo, mas antes do estado em que se encontra quem o conduz, donde, não pode ficar limitada a uma categoria de veículos, desde que destinados a circular em vias públicas ou equiparadas; se a razão de ser da proibição, é a perigosidade da condução, esta é alheia ao tipo de veículo que se conduz, respeitando, antes, à pessoa do condenado, podendo verificar-se na condução de qualquer veículo com motor; os custos de ordem profissional e familiar que advirão para o arguido do facto de a proibição abranger a condução de todo o tipo de veículos motorizados, incluindo os que utiliza na sua actividade profissional, são próprios das penas, que só o são se representarem para o condenado um verdadeiro sacrifício, com vista a encontrarem integral realização, as finalidades gerais das sanções criminais, sendo que tais custos nada têm de desproporcionado em face dos perigos para a segurança das outras pessoas criadas pela condução em estado de embriaguez e que a aplicação da pena pretende prevenir; III. 3. Abordando a questão fundamental colocada no recurso, da susceptibilidade de introdução de ressalvas ou de excepções, à pena acessória de proibição de condução de veículos com motor, importa desde logo referir a constatação da posição firme e segura da jurisprudência no sentido da sua inadmissibilidade, não se conhecendo arestos de tribunais de recurso que o admitam, no actual quadro legislativo.

  6. 3. 1. A origem e a evolução do artigo 69º C Penal Actualmente, o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º/1 C Penal, com pena de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias, é ainda punido, com a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, a fixar entre os 3 meses e os 3 anos, artigo 69º/1 alínea a) C Penal, que, nos termos do nº. 2 da mesma norma, pode abranger a condução de veículos de motor de qualquer categoria.

    Foi no entanto só, através da reforma operada pelo Decreto Lei 48/95, que foi introduzida no Código Penal a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados.

    Matéria esta, até ali, privativa do Código da Estrada e de outros diplomas avulsos.

    A criação desta pena acessória surge na sequência de um conjunto de medidas para combater a elevada taxa de sinistralidade nas estradas portuguesas e reflecte as propostas doutrinárias do Prof. Figueiredo Dias, que já em 1993, defendia que se "... deve, no plano de lege ferenda, enfatizar-se a necessidade e a urgência político-criminais de que o sistema sancionatório português passe a dispor - em termos de direito penal geral e não somente de direito penal da circulação rodoviária - de uma verdadeira pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados. Uma tal pena deveria ter como pressuposto formal a condenação do agente numa pena principal por crime cometido no exercício da condução, ou com utilização de veículo, ou cuja execução tivesse sido por este facilitada de forma relevante; e por pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e a personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável, censurabilidade esta que, dentro do limite da culpa, desempenha um efeito de prevenção geral de intimidação e um efeito de prevenção especial para emenda cívica do condutor imprudente ou leviano, cumprindo, assim, as penas acessórias uma função preventiva adjuvante da pena principal", cfr. Prof. Figueiredo Dias, in As Consequências Jurídicas do...

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