Acórdão nº 0815220 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução26 de Novembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 5220/08-1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No Tribunal Judicial de Baião, nos autos de processo comum (Tribunal Singular) nº .../05.7GBBAO, foi proferida sentença, em 30/11/2007 (fls. 107 a 120), constando do dispositivo o seguinte: "Pelo exposto, o tribunal decide julgar a acusação do Ministério Público parcialmente procedente por provada e, em consequência, decide: a) Absolver o arguido B..........

da prática de um crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. pelo artigo 191.º, do Código Penal; b) Condenar o arguido B..........

pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, nº 1, do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), no montante global de € 400,00 (quatrocentos euros).

  1. Julgar o pedido de indemnização civil formulado pela demandante civil improcedente e não provado e, em consequência, absolver o arguido do pedido civil contra si formulado.

*5.

Custas (...)"*Não se conformando com a sentença, o arguido B.......... interpôs recurso dessa decisão (fls. 126 a 133), formulando as seguintes conclusões: "1ª- O recorrente considera que os pontos de facto acima indicados em I.A).1., por não ter sido feita na audiência qualquer prova, foram incorrectamente julgados; 2ª- Pelo que se impõe decisão diversa, no sentido de os considerar não provados; 3ª- Com efeito, não foi produzida prova de que o arguido teve a intenção de haver para si a chave em causa, e de a integrar no seu património; 4ª- Ou que soubesse que o facto que praticou constituísse uma conduta criminosa; 5ª- Pelo que agiu com falta de consciência da ilicitude do seu acto; 6ª- Não se mostra preenchido o elemento subjectivo do tipo legal de crime de furto por que foi condenado: intenção ou propósito de integrar a coisa no seu património com "animus sibi habendi"; 7ª- Também não foi produzida prova de que o ofendido houvesse sofrido algum prejuízo patrimonial; 8ª- Ou de que a "coisa" (chave) tivesse algum valor pecuniário; 9ª- Em consequência deveria o arguido ter sido absolvido; 10ª- Por outro lado, o arguido é delinquente primário; 11ª- Tem 64 anos de idade; 12ª- Confessou os factos; 13ª- Colaborou com as autoridades judiciárias; 14ª- É bem conceituado no meio em que vive; 15ª- Está perfeitamente integrado na sociedade; 16ª- Pelo que a pena de multa que lhe foi imposta é, por isso, manifestamente exagerada; 17ª- Foram, assim, nomeadamente, violados os artigos 14º, 17º, 40º nº 1, 47º nº 1 e 2, 72º nº 1, 73º nº 1 do CP." Termina pedindo o provimento do recurso.

*Na 1ª instância, o MºPº respondeu ao recurso (fls. 242 a 247)[1], concluindo pelo seu não provimento.

*O Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se pelo provimento do recurso (fls. 264 e 265) uma vez que, na sua perspectiva, não se verificará o tipo subjectivo do ilícito por o arguido ter agido com intenção de prejudicar ou vexar o ofendido.

*Foi cumprido o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.

Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

*Na sentença sob recurso foram considerados provados os seguintes factos: 1. "Em dia e hora não concretamente determinados do mês de Agosto de 2005, o arguido dirigiu-se à C..........., pertencente a D.........., sita no .........., .........., Baião e entrou na referida C.........., por um portão que dá acesso a uma casa, de rés do chão e andar, ali existente e habitada no 1º andar por uma tia sua, de idade avançada.

  1. A C........... encontra-se vedada, uma parte com muro de pedra, outra com blocos de cimento e outra com rede, sendo que tem acesso por um portão e, numa parte, por um caminho de servidão que dá acesso aos consortes para irem abrir e fechar a água, caminho esse sem vedação e de onde se pode aceder à restante C.......... .

  2. O arguido previamente não obtivera o consentimento do ofendido para entrar na C.......... .

  3. À data, o arguido e o ofendido encontravam-se de relações cortadas.

  4. O arguido não é consorte da água a que se tem acesso pelo caminho de consortes.

  5. O arguido transpôs o portão e dirigindo-se à casa que é habitada pela sua tia, a qual no rés-do-chão tem uma arrecadação que o ofendido utiliza para guardar ferramentas e material que estava a utilizar no restauro de uma outra sua casa, fechou a porta dessa arrecadação e levou consigo a chave que se encontrava na porta.

  6. O arguido ao entrar no referido prédio pertencente ao ofendido e habitado naquela parte, 1º andar de uma das casas nele existentes, pela sua tia, fê-lo de modo livre e voluntário, sabendo que estava de relações cortadas com o ofendido.

  7. O arguido bem sabia que a chave que retirou da fechadura da porta da arrecadação não lhe pertencia e que ao leva-la estava a apropriar-se de um bem que sabia não lhe pertencer, colocando-a à sua disposição e a retirá-la da posse do seu legitimo proprietário, o ofendido, e que actuava contra a vontade e sem autorização deste.

  8. O arguido ao levar a chave consigo agiu de modo livre, voluntário consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  9. O arguido restituiu a chave ao ofendido cerca de 2 meses depois.

  10. Não são conhecidos antecedentes criminais ao arguido, constando do seu certificado de registo criminal junto aos autos que os não tem.

  11. O arguido é uma pessoa respeitada e considerada entre os seus conhecidos e no meio em que vive.

  12. O arguido á agricultor, vive em casa própria com a esposa que é doméstica, não se tendo apurado o montante dos seus rendimentos excepto que vende vinho anualmente no montante de 200 euros, pelo menos.

  13. O arguido tem um automóvel com matrícula QD-..-.. .

  14. Tem também um veículo tractor.

  15. Os filhos pagam-lhe os consumos de electricidade.

  16. Tem um filho maior a viver consigo que trabalha na construção civil." Quanto aos factos não provados, consignou-se o seguinte: "Com relevo para a decisão da causa, não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos supra. Designadamente não se provou que: 1. O arguido estivesse de relações cortadas com a sua tia que habita no 1º andar da casa onde se dirigiu para retirar a chave da porta.

  17. A tia do arguido tivesse guardado pertences seus na arrecadação de onde o arguido retirou a chave.

  18. O arguido tivesse retirado a chave da porta por a tia não estar em casa e estar preocupado que alguém pudesse retirar dali bens seus.

  19. O ofendido tivesse ficado preocupado durante todo o tempo em que o arguido reteve a chave e, actualmente ainda se sinta preocupado com receio que o arguido tenha ficado com uma cópia da chave, por temer que ele ou alguém pudesse invadir a habitação do ofendido, danificar ou furtar quaisquer objectos do seu interior." Da respectiva fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, consta o seguinte: "Dar-se-á de seguida cumprimento ao disposto no artigo 374.º, nº 2, do Código de Processo Penal, expondo-se os motivos de facto que fundamentaram a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para fundamentar a convicção do tribunal, explicitando-se os fundamentos lógicos da decisão final.

A convicção do Tribunal para dar como provados os factos supra descritos resultou da apreciação crítica e selectiva de toda a prova produzida em audiência conexionada com as regras de experiência comum.

Designadamente, das declarações do próprio arguido que confirmou que retirou a chave que se encontrava na porta da arrecadação do rés-do-chão.

Já não convenceu a explicação do arguido que o fez por a tia se encontrar ausente e temer que furtassem alguma coisa dali que lhe pertencesse.

Na verdade, o próprio arguido foi pouco convincente nesta sua explicação, pois, caso fosse essa a razão, sempre teria restituído a chave à tia logo de seguida, mesmo que não fosse nesse dia, no dia seguinte restituiria a chave e não como aconteceu, pelo menos dois meses depois. Com certeza que se levasse a chave por estar preocupado com a tia também teria igual preocupação em lha restituir, de imediato, para que ela pudesse utiliza-la para ir buscar ou guardar na arrecadação qualquer coisa que precisasse.

Por outro lado as testemunhas ouvidas em audiência, que presenciaram o arguido a levar a chave, E.......... e F.........., afirmaram que andavam a guardar ferramentas no local e que a tia do arguido se encontrava sentada no cimo das escadas, ora, o arguido poderia e deveria apurar com as mesmas a razão porque estavam a guardar tais objectos na "arrecadação da tia", ela até poderia ter-lhes concedido autorização para isso. Portanto, não é plausível que estando presentes duas pessoas, que se encontravam a trabalhar ali, decorrendo obras de restauro noutra casa da mesma quinta, facto que o arguido vivendo no mesmo lugar não deixaria de saber, levasse a chave sem cuidar de saber se a tia estava em casa ou se as pessoas que ali estavam tinham instruções para ali guardarem objectos. Um vulgar ladrão não leva objectos para guardar no local que está a assaltar.

Embora não se tenha apurado os verdadeiros motivos que levaram o arguido a retirar a chave da porta e levá-la consigo, o certo é que o fez e reteve-a consigo, pelo menos, dois meses, privando a posse da mesma ao seu legitimo dono, o ofendido.

O Tribunal acreditou no depoimento destas duas testemunhas por os mesmos serem coerentes em si e entre si, objectivos, espontâneos, afigurando-se absolutamente verdadeiros.

Quanto aos factos constantes do pedido de indemnização civil, o Tribunal não se convenceu dos mesmos uma vez que, o ofendido, que prestou declarações em Tribunal, caso efectivamente estivesse preocupado com o facto do arguido estar na posse da chave da sua arrecadação e que pudesse aproveitar tal facto para retirar dali qualquer objecto, de imediato, teria substituído a fechadura da porta, o que todavia não fez.

Por outro lado, as testemunhas ouvidas em audiência não relataram ao Tribunal qualquer facto de onde pudesse extrai-se qualquer conclusão no...

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