Acórdão nº 3968/2008-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelSIMÕES DE CARVALHO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em conferência, na secção criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa: No Processo n.º 783/07.7TDLSB do 1º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, o assistente (L), por não se conformar com o despacho de 19-02-2008 (cfr. fls. 158 a 161), de não pronúncia da arguida (A), id. nos autos, como autora material, dos crimes de injúria e de ameaça p. e p., respectivamente, pelos Art.ºs 181º e 153º, n.º 1, ambos do C. Penal, dele interpôs o presente recurso.

A respectiva motivação é rematada com as seguintes, e únicas, conclusões (cfr. fls. 167 a 180) que se transcrevem: «1. Contrariamente ao afirmado na decisão recorrida, esta não procedeu à análise crítica da prova que refere.

  1. Sendo certo que os autos indiciam suficientemente a prática de factos susceptíveis de integrar não só a tipicidade objectiva mas também a tipicidade subjectiva dos ilícitos pelos quais a arguida vem acusada.

  2. Existindo assim uma probabilidade razoável da mesma vir a ser em julgamento condenada pela prática dos ilícitos de que vem acusada.

  3. Dado o exposto, a decisão recorrida enferma de erro de julgamento - na medida em que não vislumbra indícios subjectivos de imputação onde os mesmos são exuberantes - para além de violar os art°s 283°, n.° 1, 308º, n.° 1 e 2, do Código de Processo Penal.

    Termos em que: O recurso será julgado procedente. Em consequência, a arguida deverá ser pronunciada pelos factos de que vem acusada.» Efectuadas as necessárias notificações, apresentaram resposta a arguida (A) (cfr. fls. 205 a 223) e o Mº Pº (cfr. fls. 224 a 229) que concluíram: I - A arguida (A) «1. Contrariamente ao afirmado na motivação do recurso do RECORRENTE, os autos não indiciam a prática de factos susceptíveis de integrar a tipicidade objectiva dos ilícitos pelos quais a ARGUIDA foi acusada.

  4. Com efeito, as declarações das testemunhas indicadas nos autos, para além de irrelevantes, são também nulas, pois que o hipotético conhecimento probatório por elas obtido é fruto de comportamentos ilícitos e, por via dos artigos 125.° e dos n.°s l e 3 do artigo 126.°, ambos do Código do Processo Penal, essa prova é nula.

  5. Por outro lado, deve registar-se que a gravação da alegada conversa junta aos autos, havida entre RECORRENTE e ARGUIDA, consubstancia um caso de prova proibida, gravação essa que, aliás, surge também penalmente incriminada pela alínea a) do artigo 199.°, do Código Penal, e, por esse motivo, não possui qualquer valor probatório.

  6. Com efeito, nos termos do n.° l do artigo 26.° e do n.° 8 do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, conjugado com os artigos 125.°, 126.° e 167.°, todos do Código do Processo Penal, e com a alínea a) do n.° l do artigo 192.° e as alíneas a) e b) do n.° l do artigo 199.°, ambos do Código Penal, resulta que a alegada prova documental dos crimes imputados à REQUERENTE - ou seja, a gravação - é nula.

  7. Assim, inexistindo elementos probatórios que indiciem a prática de factos susceptíveis de integrar a tipicidade objectiva desses ilícitos, é manifesto que também inexistem elementos que indiciem a pratica de factos susceptíveis de integrar a sua tipicidade subjectiva.

  8. Por outro lado, há ainda que referir que todos os actos processuais conexos à gravação, seja de que natureza forem, são afectados juridicamente pelo designado efeito à distância.

  9. Com efeito, estando em causa a violação do direito à palavra, ocorre a nulidade prevista pelo n.° 8 do artigo 32.°, da Constituição da República Portuguesa, conjugado com o n.° l do artigo 126.°, do Código do Processo Penal, pelo que, nos termos do n.° l do artigo 122.° e n.° l do artigo 126.°, ambos do Código do Processo Penal, será inválido não apenas o acto em que se verifica a nulidade, mas também os que dele dependerem.

  10. Assim, todos esses actos processuais são também nulos e as alegadas provas deles resultantes são abrangidas pela proibição de valoração do artigo 167.°, do Código do Processo Penal, pelo que, não podem igualmente sustentar acusações deduzidas contra a ora REQUERENTE.

  11. Ainda assim, caso se considerasse que existem elementos probatórios que indiciem a prática de factos susceptíveis de integrar a tipicidade objectiva desses ilícitos, o que não se concede e apenas se admite por dever de patrocínio, não merecem censura os fundamentos expendidos na decisão recorrida quanto à inexistência de elementos que indiciem a prática de factos susceptíveis de integrar a tipicidade subjectiva daqueles ilícitos.

  12. Por tudo isto, é manifesto que, dos autos, nada consta que permita considerar previsível a futura condenação da ARGUIDA, sendo mais que provável a sua absolvição.

    NESTES TERMOS, e nos demais de Direito que V. Exas. Doutamente certamente suprirão, deve ser REJEITADO o recurso apresentado pelo RECORRENTE, mantendo-se a decisão recorrida, tudo com as legais consequências, fazendo, assim, a tão costumada JUSTIÇA!» II - O Mº Pº «l - De harmonia com o disposto no artigo 283.° n.° 2 do Código de Processo Penal, determinada pessoa apenas pode ser submetida a julgamento se existirem indícios suficientes da prática de um crime.

    2 - Face às regras gerais da experiência, os elementos probatórios constantes dos autos, em sede de Inquérito e Instrução não permitem imputar à arguida a prática dos invocados ilícitos, já que não foi produzida prova suficiente de que a mesma em algum momento os tivesse praticado.

    3 - Os crimes de injúrias e de ameaça apenas são punidos a título de dolo.

    4 - O modo como as condutas foram praticadas pela arguida são suficientemente elucidativas do comportamento (não ilícito) das mesmas, pelo que terá de inferir-se como hipótese altamente improvável da mesma não ser condenada em qualquer pena ou medida de segurança 5 - A decisão recorrida não violou nem o disposto no artigo 283º n° l, nem o artigo 308° n° l e 2, ambos do Código de Processo Penal, ao não pronunciar a arguida.

    6 - Termos em que a douta decisão de fls. 158 a 161 proferida pela Mmª Juiz "a quo" deverá ser confirmada não se concedendo provimento ao recurso interposto pelo Assistente.

    Contudo Vossas Excelências, melhor decidirão, e assim será feita, Justiça.» Na sequência do que veio a ser admitido o presente recurso (cfr. fls. 231).

    Remetidos os autos a esta Relação, nesta instância a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer (cfr. fls. 238 e 239), no sentido de que o recurso não merece provimento.

    Tendo sido dado cumprimento ao disposto no n.° 2 do Art.° 417° do C.P.Penal, nenhum dos sujeitos processuais se pronunciou.

    Exarado o despacho preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento em conferência, nos termos do Art.º 419º do C.P.Penal.

    Cumpre, agora, apreciar e decidir.

    * Compulsados os autos, há a destacar o seguinte: - Com efeitos reportados a 21-11-2007, veio o assistente (L) deduzir acusação particular contra a arguida (A) imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúrias p. e p. pelos Art.°s 181º e 182°, ambos do C. Penal (cfr. fls. 61 a 63); - Subsequentemente, o Mº Pº decidiu acompanhar a sobredita acusação particular, isto para além de deduzir, também, acusação contra a mesma arguida pela prática de um crime de ameaça p. e p. pelo Art.° 153º, n.º 1 do C. Penal (cfr. fls. 68 a 70); - Requerida a abertura de instrução pela supra aludida arguida (cfr. fls. 78 a 96), e após o respectivo deferimento (cfr. fls. 131), teve lugar o debate instrutório (cfr. fls. 145 e 146); - Encerrado este, sem a arguição de qualquer nulidade, foi proferido o despacho recorrido (cfr. fls. 158 a 161), que, no que interessa agora, assim reza: «Nos presentes autos o Ministério Público procedeu a inquérito, tendo no fim deste pelo Assistente sido deduzida acusação particular contra a arguida (A), identificada a fls. 68 dos autos, na qual o assistente (L) lhe imputa a prática do crime de injurias p. e p. pelo art° 181° do Cód. Penal, tendo o Ministério Público, deduzido contra a arguida acusação na qual lhe imputa a prática de um crime de injúrias p. e p. pelo art° 181° do Cód. Penal e de um crime de ameaças p. e p. pelo art° 153° do Cód. Penal.

    * A arguida veio requerer a abertura da instrução conforme consta do requerimento que faz fls. 78 a 96 dos autos.

    * Procedeu-se à realização do debate instrutório com observância das formalidades legais.

    * CUMPRE DECIDIR: O Tribunal é competente.

    O Ministério Público tem legitimidade para exercer a acção penal.

    Não existem nulidades, excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

    *...

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