Acórdão nº 1145/06.9TAACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Fevereiro de 2009

Data11 Fevereiro 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam – em conferência – na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO O arguido …, filho de … e de …, natural da freguesia de A…, concelho de Alcobaça, casado, residente na Estrada do F…, Rua … S. Martinho do Porto, foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de desobediência, p. e p. pelas disposições conjugadas previstas nos artigos 14.º, nº1, 26.º, e 348.º, nº1, al. b), do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à razão diária de 30 € (trinta euros), o que perfaz o montante global de 2.100 € (dois mil e cem euros).

Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: Os factos dados como provados nos presentes autos foram-no ao arrepio da prova produzida e gravada em audiência de julgamento; Existiu um erro na apreciação da prova carreada para os autos, tanto em sede de inquérito, de instrução, como em sede audiência de discussão e julgamento, pelo que o presente recurso versa sobre a matéria de facto; Dado ter existido o erro supra referido, o enquadramento jurídico daí advindo, na aplicação da pena, não tem qualquer sentido, até porque como a seguir demonstraremos, todas as provas existentes levam à absolvição do arguido; Baseou, a Meritíssima Juiz, a sentença e a sua convicção apenas nos depoimentos das testemunhas de acusação, … e …, tendo interpretado toda a prova documental constante dos autos de forma errónea e ignorado o depoimento das testemunhas de defesa; As transcrições que se seguem são obtidas através da audição de uma cópia da gravação em da audiência de julgamento, efectuada pelo Tribunal "a quo", constante de um CDR Imation, 1x52S, de 80 minutos, reproduzidos pelo arguido, num leitor de CDR; Os depoimentos das testemunhas de acusação e das testemunhas de defesa porque contraditórios em factos essenciais, aliados à incorrecta apreciação da prova documental deveriam conduzir a uma decisão absolutória, mais que não seja pela dúvida que se levanta, face às contradições verificadas nos relatos dos acontecimentos e dos documentos e os factos provados da sentença.

Não tem qualquer fundamento o alegado pela Meritíssima Juiz, quando qualifica e considera o depoimento da testemunha A..., constante da faixa n.º 112411, como não isento e parcial; O facto de a testemunha trabalhar para o filho do arguido, só por si não pode ser considerado um facto determinante para a falta de isenção do depoimento da testemunha, sendo que nenhum outro ficou provado, que determinasse assim a qualificação do seu depoimento; Ficou provado, conforme depoimento constante da faixa n.º 113149, que a testemunha … conhece o arguido apenas por a empresa de que é sócio manter com aquele uma relação de arrendatário/senhorio, tendo esta testemunha declarado ter interesse neste processo por ter aquela qualidade; Mas, apesar do interesse declarado, tal não determina, necessariamente, falta de isenção do seu testemunho, uma vez que, o que a testemunha declarou é coincidente com o que foi declarado pelas outras testemunhas do arguido, nomeadamente no que respeita à propriedade da obra, visita dos fiscais do PNSAC; No que respeita à testemunha de …, conforme consta da faixa n.º 114923, ficou demonstrado que esta não tem qualquer relação pessoal com o arguido, apenas teve relações comerciais acerca de 12 anos; As declarações da testemunha, I..., não podem determinar parcialidade e falta de sinceridade do seu testemunho, uma vez que apenas se mostraram contraditórios os factos que relativos à elaboração do auto de embargo, a sua apresentação ao arguido e leitura dos autos na presença do arguido e que a obra se encontrava embargada, por qualquer dos fiscais. Declarações que a testemunha manteve, mesmo, em sede de acareação, que se encontra gravada na faixa n.º 120536.

Não se mostra minimamente fundamentada a parcialidade, falta de sinceridade e isenção das testemunhas de defesa, pelo que a validade do seu depoimento não pode ser posta em causa, e devem os mesmos ser valorados em sede de prova.

E não pode a Meritíssima Juiz alegar parcialidade, falta de isenção e sinceridade, apenas porque são testemunhas de defesa.

Pelo que deveriam ter sido dado como provados os factos constantes dos factos não provados nas alíneas a) e b).

Quanto ao facto de a obra estar a ser construída a cargo da empresa …, Lda., diga-se que as testemunhas de defesa e o arguido, constantes das faixas n.ºs 113149, 114923 e 102230, respectivamente, foram unânimes quanto a este aspecto, daí que este facto deveria, também, ter sido considerado como provado A Meritíssima Juiz ao apenas considerar os depoimentos das testemunhas de acusação, para fundamentar os factos considerados provados sob os n.ºs 1, 4 e 5, violou o principio de "in dubio pró réu", uma vez que é notório que foi levantada uma dúvida razoável no que se refere á comunicação pessoal do embargo ao arguido, já que a prova em contrário é abundante, como se deixou exposto.

O arguido e a testemunha …, conforme faixas n.ºs 112411 e 102330 confirmam que foi recepcionada uma carta do PNSAC, mas que não continha qualquer auto de embargo; As testemunhas de acusação, conforme faixas n.ºs 104517 e 111248, não procederam ao envio dos autos de embargo e de contra-ordenação pelo correio, pelo que não poderão afirmar que as cartas de notificação incluíam os autos, pelo que a conclusão retirada pela Meritíssima Juiz infere que porque a testemunha A… explicou que a carta de fls. 105 e 106, é referente à contra-ordenação a carta de notificação do auto de embargo de fls. 10 e 11, foi regularmente enviada; A Meritíssima Juiz concluiu sem que tenha apurado quaisquer factos que fundamentam a sua posição, pelo que esta não pode proceder.

Nenhuma testemunha afirmou que a carta do PNSAC, continha o auto de embargo.

A testemunha …, conforme faixa n.º 112411, que abriu a carta remetida pelo PNSAC, afirma, e pode-se dizer, sem qualquer dúvida, que a carta recebida, não continha qualquer auto de embargo. O mesmo é reafirmado pelo arguido, na faixa n.º 102230, a quem a carta foi entregue, pela Testemunha D…..

Além da prova testemunhal produzida, constam nos autos documentos que sustentam estes factos. Veja-se os requerimentos dirigidos pelo arguido, claro, subscritos pela sua mandatária, mas em sua representação e em seu nome, pelo que os documentos de fls. 182, a 184, porque foram corroborados pelas testemunhas apresentadas deveriam ter sido tidos em conta.

Mas, mesmo que se considerasse o arguido regularmente notificado, também não existiu qualquer desobediência, uma vez que a obra foi concluída em finais de Junho, inícios de Julho, tenda a carta sido recebida em 17/07/2006, conforme declarações das testemunhas de defesa, constantes das faixas n.ºs 113149 e 114923, sendo que não foi produzida prova em contrário, devendo o facto não provado constante da alínea c) dos factos não provados ser considerado provado.

Face a tudo que ficou exposto verifica-se que não deveriam ter sido dados como provados os factos constantes dos n.º 1, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 11.

E deveriam ter sido considerados provados os factos constantes das alíneas a), b), c), e) dos factos não provados.

Estamos perante um erro notório na apreciação da prova.

No dia 19/06/2006, o arguido nenhum crime de desobediência cometeu, uma vez que não existiu qualquer ordem, legitimamente comunicada.

No dia 17/07/2006, data em que recebeu uma carta registada com aviso de recepção, que continha uma carta e 2 fotocópias com 2 fotografias cada, também não pode o arguido considerar-se notificado, uma vez que a referida comunicação não continha o auto de embargo, que até hoje não lhe foi comunicado, devendo a notificação considerar-se irregular, não produzindo efeitos; Mas, mesmo que assim se não entenda, o que não se presume, sempre se dirá que as obras estão concluídas desde, pelo menos, 17/07/2006.

Mas, se ainda assim se não entender deve o arguido ser absolvido uma vez que não era ele o dono da obra, esta era responsabilidade e propriedade da empresa …, Lda.

Não estão assim reunidos os elementos constitutivos do crime de desobediência: não se verificou a existência de uma ordem por parte dos funcionários do PNSAC, (que tinha autoridade) regularmente comunicada, nem ficou provada a advertência expressa de que se continuasse a obra incorria na prática de um crime de desobediência.

Pelo que deve ser absolvido do crime em que foi condenado; Foram violados os artigos 410° n.º 2, alínea c) e o artigo 348° do CPP.

Pelo que revogando a douta sentença e decretando a ABSOLVIÇÃO do arguido, V.EXCIAS. FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.

Admitido o recurso, respondeu o Ministério Público, pugnando pela improcedência do recurso, sintetizando a sua posição com as seguintes conclusões: 1ª – Vem o presente recurso interposto pelo arguido … da douta Sentença de fls. 215 a 227 que o condenou pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de desobediência, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14°, n° 1,26° e 348°, nº 1, al. h), do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à razão diária de 30,00 € (trinta Euros).

  1. – O julgamento da matéria de facto produzida cm audiência, tem o seu principal assento no princípio da imediação da prova, pelo que o recurso apresentado pelo recorrente, trazendo aos Autos transcrições parcelares, seccionadas, até genéricas relativamente aos depoimentos prestados em Audiência, não pode, face à demais prova carreada e entretanto recolhida para os Autos, ser apreciado separadamente desta demais prova; 3ª – Da análise e audição da transcrição da prova produzida em julgamento, nada resulta que justifique a formulação de um juízo valorativo diferente do assumido pelo tribunal a quo, designadamente no que tange aos pontos considerados incorrectamente julgados pelo recorrente: 4ª – Pelo que, perante o funcionamento daqueles princípios da imediação e da oralidade e não resultando do texto da decisão recorrida nenhum dos vícios a que alude o artigo 410°, n° 2, do...

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