Acórdão nº 87/05.0IDCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. – Relatório.

    Em dissensão com a decisão prolatada no processo supra epigrafado em que na procedência da acusação pública formulada contra os arguidos, “TM, LDA.”, com o NIPC 501.588.566, com sede em Coja, Arganil; JT...

    , casado, reformado, nascido a 3/07/1947, em Coja, Arganil, e AC...

    , solteira, recepcionista, nascida a 27/03/1978, em Sé Nova, Coimbra, filha de JT... , pela imputação da prática: à primeira, como autora material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 7º, n.º 1, e 105º, nºs. 1, 2 e 4, da Lei nº. 15/2001, de 5/06, por referência ao disposto nos artºs. 98, 99 e 101, do CIRS, 26, nº. 1, do CIVA, e no artigo 30, n.º 2, do Código Penal; e ao segundo e terceiro arguidos, como autores materiais e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo artº., 105, nºs. 1, 2 e 4, da Lei nº. 15/2001, de 5/06, artºs. 98, 99 e 101, do CIRS, 26, nº. 1, do CIVA, e 30º, n.º 2, do Código Penal, os condenou: […] ao arguido JT...

    , como autor material de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelo art. 105, nºs. 1, 2 e 4, da Lei nº. 15/2001, de 5/6, e artº. 30, nº. 2, do Código Penal, na pena de 24 (vinte e quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 24 (vinte e quatro) meses, sob a condição de pagamento ao Estado, no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, a contar do trânsito desta decisão, da quantia de imposto em dívida - € 119.453,46 euros (cento e dezanove mil, quatrocentos e cinquenta e três euros e quarenta e seis cêntimos); […] a arguida AC...

    , como autora material de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelo art. 105, nºs. 1, 2 e 4, da Lei nº. 15/2001, de 5/6, e artº. 30, nº. 2, do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 euros (cinco euros), o que perfaz o montante global de € 1.000,00 (mil euros), ou, subsidiariamente, em 133 (cento e trinta e três) dias de prisão (v. artº. 49, do Código Penal); e à terceira “TM, Ldª.”, nos termos do art. 7.º, n.ºs. 1 a 3, da Lei nº. 15/2001, de 5/6, pelo crime de abuso de confiança fiscal continuado, p. e p. pelo art. 105, nºs. 1, 2 e 4, do citado diploma legal, e artº. 30, nº. 2, do Código Penal, na pena de 25 (vinte e cinco) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), no total de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros), recorre o arguido JT...

    que remata a motivação com o quadro conclusivo que a seguir se deixa extractado.

    “1. O Tribunal “a quo” julgou incorrectamente a matéria de facto constante dos pontos 14 e 15.

    2. Para além disso, omitiu matéria de facto que está intimamente relacionada com a motivação da conduta do recorrente.

    3. A confissão do arguido foi relevada e valorada apenas parcialmente, havendo circunstâncias de facto, confessadas pelo arguido, importantes para o doseamento da pena aplicada, que foram omitidas e não foram tidas em consideração na sentença recorrida.

    4. Assim, ouvindo atentamente o depoimento do arguido podemos aferir desse circunstancialismo especial em que ocorreu a prática dos factos vertidos na acusação.

    5. Circunstancialismo esse, reforçado no depoimento da arguida AC…, bem como no depoimento das testemunhas de defesa, da qual se releva o depoimento da testemunha · CG... que afirma sem margem para qualquer dúvida que o arguido toda a vida trabalhou para agora estar na miséria! 6. Dos depoimentos de todas as testemunhas ouvidas em audiência de julgamento resulta clara e inequivocamente que o arguido jamais teve a intenção de elaborar um plano que visasse prejudicar deliberadamente a Administração Fiscal, através da não entrega dos quantitativos de IV A e IRS devidos.

    7. Se não procedeu às entregas dos quantitativos devidos, não foi porque não o quis fazer, mas sim porque não o pôde fazer.

    8. Tendo dado sempre prioridade ao pagamento dos salários devidos aos trabalhadores com o pouco dinheiro que existia.

    9. Neste quadro negro de dificuldades económicas, problemas graves de saúde e outras adversidades que assolaram a vida pessoal e profissional do arguido, este tentou sempre reagir, tentando salvar a empresa, tarefa que se revelou humanamente impossível face a essa conjuntura.

    10. Com as limitações ao nível da formação de base do arguido, com as dificuldade notórias existente no sector dos transportes há vários anos, com a crise económica que atravessa há vários anos o país e as empresas, e com os graves problemas de saúde que o afectaram ao longo destes últimos anos, não é lícito assacar culpa a não ser num grau mitigado ao arguido pela desagregação da empresa e consequente. Incumprimento das suas obrigações fiscais.

    11. Além disso não foi devidamente relevado o facto do arguido jamais se ter aproveitado do dinheiro que não foi entregue ao Estado.

    12. Facto que é notório, já que o arguido vive com muitas dificuldades financeiras, situação essa agravada não só pelos graves problemas de saúde que o afectam e que lhe consomem parte do orçamento familiar, mas também pelo facto de contra ele correram processos de reversão fiscal onde lhe foram penhorados, e vendidos todos os bens de que era titular, entre os quais se encontra a própria casa de morada de família.

    13. Ora todas estas circunstâncias especiais, não foram devidamente relevadas pelo Tribunal a quo, não observando o disposto no artigo 71.º, n.º2 do Código Penal.

    14. Aliás não se compreende como se aplica uma pena de prisão de 24 meses, suspensa, é certo, na sua aplicação por igual período, mas com a condição de pagamento nesse período dos quantitativos em dívida, sem · atender a todo este circunstancialismo especial que esteve na origem da prática do crime e sem atender minimamente à condição económica, à ausência de antecedentes criminais, e à excelente inserção do arguido na comunidade onde habita onde é visto como pessoa muito honesta, séria e, uma trabalhador exemplar.

    15. Atendendo a todas estas circunstâncias, é manifestamente exagerada a aplicação de uma pena de prisão no caso concreto.

    16. Com efeito as necessidades de prevenção geral e prevenção especial subjacentes ao caso concreto serão satisfeitas na íntegra com a aplicação de’ uma pena de multa” já que esta será suficientemente dissuasora para que no futuro o arguido não adopte novamente estes comportamentos desviantes.

    17. Aliás no estado debilitado de saúde em que se encontra o arguido é mais do que óbvio que o arguido não irá mais praticar qualquer crime desta natureza ou de outra qualquer natureza.

    18. Bem como todo o sofrimento que passou ao longo deste · processo, que veio agravar o seu estado de saúde já de si débil, ainda para mais, sabendo-se que também padece de diabetes, para além de ter sofrido dois AVC’s que lhe provocaram a perda de visão de um olho, e de ainda ter de se submeter 3 vezes por semana ao tratamento de hemodiálise, revela-se já castigo mais do que suficiente para o arguido.

    19. Assim sendo, a pena de prisão de 24 meses aplicada pelo Tribunal “a quo” na douta sentença embora suspensa na sua aplicação por, igual período, sob a condição de pagamento ao Estado no prazo de 24 meses, da quantia de 119.453,46€ (cento e dezanove mil, quatrocentos e Cinquenta e três euros e quarenta e seis cêntimos) deverá ser revogada por se revelar manifestamente exagerada face às circunstâncias especiais que rodeiam o caso concreto aplicando-se em sua substituição uma pena de · multa já que esta é a que se revela mais adequada para satisfazer as necessidade de prevenção geral e especial do caso concreto e de realizar o propósito da Justiça Material.

    20- A sentença recorrida violou, assim o disposto nos artigos 70.º; 71.º,n.º 1 e 2 e artigo 72.º, n.º1 e 2 in fine e artigo 40º, todos do Código Penal, e 124° do Código de Processo Penal, entre outras normas.” Na resposta que produziu a Exma. Senhora magistrada do Ministério Público, depois de perorar pelo acerto da decisão, conclui que: “1. Para além de haver fixado prudentemente a matéria de facto provada, a decisão impugnada subsumiu correctamente essa factualidade ao direito.

    2. Mostra-se justificada, por mais adequada à finalidade da punição a opção pela pena privativa de liberdade.

    3. Na determinação da medida da pena, a sentença recorrida ponderou a culpa do arguido/recorrente e, atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, depunham a favor e contra este.

    4. A pena de vinte e quatro meses de prisão, aplicada ao arguido/recorrente, pela autoria de um crime de abuso de confiança, na forma continuada, mostra-se criteriosa e fundamentadamente fixada, sendo ajustada à culpa do infractor e às necessidades de prevenção especial e geral.

    5. A douta sentença condenatória recorrida não deixou de interpretar correctamente qualquer preceito legal, não se mostrando ofendido, designadamente, o disposto nos artigos 40.º, 70.º, 71.º, 72.º, do Código Penal, e 124.º, do Código de Processo Penal, apontados na motivação do recorrente.” Já nesta instância, o distinto Procurador-geral Adjunto é de parecer que: “[…] Resumindo as questões suscitadas pelo arguido recorrente, reconduzem-se as mesmas, por um lado, ao seu inconformismo perante a matéria de facto fixada nos pontos 14 e 15 da sentença, e, por outro lado, à não opção pela pena de multa mas sim pela de prisão, ainda que suspensa na sua execução, e ainda, no que toca a esta, ter a mesma sido condicionada ao pagamento das dívidas à Administração Fiscal, não levando em conta as circunstâncias do caso concreto, designadamente as possibilidades de o recorrente o poder satisfazer, pelo que entende que foi violado o disposto nos artigo 70.º, 71.º, n.º 1 e 2, e 72.º n.º s 1 e 2 in fine e 40.º, todos do C.P., e 124.º do C.P.P..

    Porém, a todas estas questões, respondeu com proficiência a Exma. Procuradora-Adjunta junto da 1.ª instância, defendendo a manutenção da sentença proferida.

    De facto, sobre o objecto do recurso, também nos parecendo que não...

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