Acórdão nº 08P3456 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO No 2º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende foram os arguidos AA e BB, entre outros, condenados, por acórdão de 27.7.2007 (fls. 2530-2576), o primeiro como autor de um crime de associação criminosa, p. e p. pelo art. 28º do DL nº 15/93, de 22-1, na pena de 11 anos de prisão, e ainda como co-autor material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelo art. 24º, c) do mesmo diploma, na pena de 12 anos de prisão, sendo a pena unitária fixada em 16 anos de prisão; e o segundo, como co-autor material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, na pena de 7 anos de prisão.

Desse acórdão recorreram para a Relação de Guimarães estes arguidos, além de outros, e ainda o Ministério Público (MP).

Por acórdão de 7.1.2008 (fls. 3284-3306), a Relação anulou a decisão da 1ª Instância, ordenando que fosse reformulada a matéria de facto, com indicação das provas utilizadas e exame crítico das mesmas ou, caso fosse entendido necessário, que se realizasse novo julgamento.

Tendo sido seguida esta segunda opção na 1ª Instância, foi proferido novo acórdão, em 14.3.2008, que condenou os arguidos nos mesmos termos da primeira decisão (fls. 3485-3538).

Interpuseram novamente recurso o MP e os arguidos para a Relação de Guimarães.

Por acórdão de 10.7.2008 (fls. 4153-4205), a Relação decidiu, além do mais:

  1. Alterar parcialmente a matéria de facto, eliminando dos factos provados os nºs 3 e 42 e modificando a redacção dos nºs 1, 4, 7, 10, 18, 44 e 45; b) Negar provimento ao recurso do MP; c) Desqualificar o crime imputado ao arguido BB, mantendo embora a pena de 7 anos de prisão em que vinha condenado; d) Conceder provimento parcial ao do arguido AA, absolvendo-o do crime de associação criminosa.

    Desse acórdão recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) ambos os arguidos.

    Concluiu assim a sua motivação o arguido AA: 1 - Dispõe o artigo 379 n° 1 al. c) do C.P.P.: "É nula a sentença: c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (...)".

    2 - O arguido recorreu invocando que o acórdão padecia de insuficiência prevista na al. a) do n° 2 do artigo 410 do C.P.P. Tal insuficiência tinha subjacente a não valoração por parte do tribunal recorrido do depoimento da testemunha M...V... conjugado com os depoimentos das arguidas CC, DD e EE e o documento que a defesa juntou no dia 14-06-07 - fls. 2318 do 8° volume, cfr. Acta de audiência de julgamento - 2ª secção - fls. 2322, 2323, (cópia de uma fotografia) que as mesmas reconheceram sem sombra de dúvida como sendo a pessoa que juntamente com outra procedeu ao referido arrendamento, no caso da testemunha M...V..., e pelas demais como sendo a pessoa que levou as arguidas até à casa sita à rua dos Sargaceiros, que lhes abriu a porta, esteve no seu interior e aí pernoitou. Cfr. fls. 2404, 2406, 2422.

    3 - Dos factos provados e não provados não resulta que os mesmos tenham ordenado o referido arrendamento, tendo quanto a tal matéria, sido provado os pontos 6 e 31 e não provado o ponto A do acórdão proferido em 1ª instância.

    4 - Face a tal circunstancialismo, entendeu o recorrente que a decisão não ficou suficientemente esclarecida, porque na matéria de facto o tribunal não se pronunciou directa ou indirectamente sobre quem procedeu ao arrendamento das referidas casas, em especial a casa sita à rua dos Sargaceiros, onde foi guardada e encontrada a maior quantidade de produto estupefaciente. O tribunal podia e devia ter ido mais além, explicitando se não se provou ou se se provou quem fez o referido arrendamento e qual a relação entre este indivíduo e a droga que se encontrava na casa sita à rua dos Sargaceiros. E a sua relação com os demais arguidos. Não o fazendo, a decisão formou-se incorrectamente.

    5 - Violando o disposto nos arts. 410 n° 2 al. a), 339 n° 4 e 374 todos do C.P.P.

    6 - A considerar-se verificado tal vício, nos termos do artigo 426 do C.P.P e não for possível decidir da causa, o tribunal determina o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do processo ou a questões concretamente identificadas na decisão do reenvio.

    7 - Vício que o recorrente expressamente invoca, nos termos do artigo 410 n° 2 al. a) do C.P.P.

    8 - Da leitura do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, constata-se que o mesmo não se pronunciou sobre questão suscitada.

    9 - Tal omissão de pronúncia, "... nos termos das combinadas arts. 379, al. c), 410 n° 2 al. a) e 428, todos do C.P.P., tem como consequência a expressamente prevista no n° 1 do art. 122 do referenciado Diploma Processual Penal.

    10 - Violou-se o disposto nos arts. 379, n° 1 al. c), 410, n° 2 e 428 do C.P.P.

    11 - O arguido nas conclusões do recurso por si apresentado perante o tribunal da Relação manteve o interesse no recurso por si interposto aquando da decisão instrutória dando assim cumprimento ao preceituado no artigo 412 n° 5 do C.P.P.

    12 - Conforme se constata do acórdão ora recorrido, o Tribunal da Relação não se pronunciou sobre o mesmo, quando a tal estava obrigado por força do disposto nos artigos 379 n° 1 al. c), 412 n° 5 e 428, todos do C.P.P.

    13 - Tal omissão torna o acórdão nulo por violação do disposto nos arts. 379 nº 1 al. c), 412 n° 5 , 428 e 122 n° 1 do C.P.P 14 - Entende o recorrente, face à alteração da matéria de facto, designadamente, a redacção dos pontos 1, 4, 7, 10 e 18 conjugados com a decisão de considerar não provados os factos n° 3 e 42 todos do acórdão proferido em 1ª instância, não ser integrada a conduta do recorrente no crime p. p pelos artigos 21 n° 1 e 24 al. c) do D.L 15/93 de 22-01.

    15 - Na verdade, para qualificar o tráfico de estupefacientes em função da «avultada compensação remuneratória» é necessário demonstrar, ainda que aproximadamente, a envergadura do benefício, não se exigindo, é certo, uma contabilidade rigorosa, que será difícil de detectar numa actividade clandestina, mas impondo-se que a conclusão se extraia de dados seguros, sendo que essa conclusão não se pode tirar só do volume da droga que está em jogo, porque há toda uma série de condicionantes a atender, como a posição que o agente ocupa no negócio (se é dono, ou se é intermediário e que tipo de intermediário), que espécie de comparticipação nos proveitos é que vai obter (lucros, remuneração fixa), etc. Presumir do volume de negócios em jogo e da latitude de poderes do recorrente no que se refere ao domínio da acção que ele iria obter avultada compensação remuneratória é extrair uma presunção contra reo e, portanto, uma forma de violar o princípio da presunção de inocência consagrado no art. 32.°, n.° 2, da CRP, ou o princípio in dubio pro reo, que é outra vertente do mesmo princípio. O facto da 1ª instância ter dado como provado que «o recorrente visava alcançar um lucro pecuniário avultado» e alcançou, constitui um facto conclusivo que não deve ser levado em conta, devendo ter-se por não escrito - cf. art. 646.°, n.° 4, do C.P.C., tanto mais que o Tribunal da Relação de Guimarães entendeu que nenhuma prova é indicada que permita saber o concreto conteúdo do acordo quanto à repartição dos lucros, nem se o acordo implicava o "investimento" conjunto dos lucros e, não se tendo dado como provado os pontos 3 e 42 do acórdão, referentes aos lucros obtidos, montantes, ganhos individuais, e forma de aplicação dos mesmos, não se pode, considerar que pelo facto do recorrente ser um dos donos do negócio, obtivesse ou fosse obter elevados lucros, tendo por subjacente a quantidade de droga apreendida.

    16 - Violou-se o disposto no art. 24 al. c) do Decreto-Lei 15/93 de 22-01.

    17 - Os critérios que presidem à medida concreta da pena são os indicados no art. 70 do C.P. A actividade ilícita praticada pelo recorrente, deve ser entendida de acordo com o circunstancialismo descrito nos pontos 3 e 4 da medida da pena, os seus antecedentes criminais, embora de idêntica natureza foram praticados, no ano de 1992, estando à data da prática dos factos, inserido familiar e profissionalmente. Mantém apoio familiar e ocupação laboral no E.P.

    18 - Face aos critérios legais (arts. 70 e 71 do C.P.) o recorrente deveria ser punido, atento as razões aduzidas na motivação do recurso ora interposto, pelo crime de tráfico de estupefacientes p. p. no artigo 21 n° 1 do Dec.-Lei n° 15/93 de 22/01, em medida não superior a 9 anos de prisão.

    19 - Caso não seja esse o entendimento do tribunal, e a considerar que a conduta do recorrente tipifica o crime de tráfico agravado, face ao aduzido nos números 3 e 4 do item da motivação de recurso - medida da pena - a pena não deveria exceder os 10 anos e 6 meses de prisão.

    20 - A decisão recorrida violou, nessa parte, os arts. 70 e 71 , ambos do C. P.

    Por sua vez, o arguido BB concluiu desta forma a sua motivação: I. Como melhor se vê a fls. 31 e ss. do acórdão de que se recorre, a Relação de Guimarães deu inteira razão ao ora recorrente na parte atinente à impugnação da matéria de facto que havia sido dada como provada na 1ª instância, que corrigiu, tendo assim ficado definitivamente assente, no que a ele concerne, a factualidade enunciada supra, no item 3 da motivação do presente recurso; II. Além disso, foi dado definitivamente como não provado que: [1] ao disponibilizar-se a realizar o transporte do produto estupefaciente para Espanha, o aqui recorrente tivesse conhecimento da actividade de tráfico de estupefacientes levada a cabo pelos demais arguidos, contribuindo assim para a sua distribuição, o que quis e fez; e, [2] ele soubesse ao certo quanta droga levava - facto esse que o Tribunal a quo não incluiu na matéria de facto provada e/ou não provada, mas que expressamente reconhece a fls. 46 do acórdão em recurso; III. Atenta a factualidade assim apurada e corrigida, nenhuma dúvida resta de que, conforme aliás foi expressamente reconhecido no acórdão sub judicibus, o aqui recorrente era um simples "pau mandado", que tinha somente a função de "correio" e agia exclusivamente de acordo...

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