Acórdão nº 356/12.2SAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelJORGE DIAS
Data da Resolução18 de Junho de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal: No processo supra identificado foi proferida sentença que, julgou procedente a acusação deduzida pelo Magistrado do Mº Pº contra os arguidos: A...

, casado, taxista, nascido a 14.05.1957, natural de (...) – Guarda, filho de (...) e (...), residente na Rua (...), Vilar Formoso; B...

, casado, taxista, nascido a 3.08.1952, natural de (...)- Guarda, filho de (...) e (...), residente na Rua (...) Gonçalo Sendo decidido: 1. Condenar o arguido A...: - pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz o montante de € 840,00 (oitocentos e quarenta euros); 2. Condenar o arguido B...: - pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz o montante de € 840,00 (oitocentos e quarenta euros); 3. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível formulado pelo ofendido A... e em consequência: Condenar o arguido B... a pagar ao demandante A... o montante de € 800,00 (oitocentos euros) acrescido de juros de mora civis a contar da presente decisão; 4. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível formulado pelo ofendido B... e em consequência: Condenar o arguido A... a pagar ao demandante o montante de € 886,66 (oitocentos e oitenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos); 5. Julgar os pedidos improcedentes quanto ao mais, em conformidade se absolvendo os demandados.

  1. Julgar totalmente procedente o pedido de indemnização cível formulado pela Unidade Local de Saúde da Guarda, E.P.E., contra o arguido A..., e em consequência: Condenar arguido A... a pagar a esta Unidade Local o montante € 108,00, acrescidos de juros de mora à taxa legal de 4% a contar da data da notificação do requerimento do pedido de indemnização civil ao demandado (artigos 566º, nº 2; 805° nº 3; 806º; 559º, todos do Código Civil e Portaria nº 291/03 de 8 de Abril).

    *** Desta sentença interpôs recurso o arguido B...

    , formulando as seguintes conclusões na motivação do mesmo, e que delimitam o objeto: 1- O recorrente foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143, nº 1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz o montante de € 840,00 (oitocentos e quarenta euros).

    2- Salvaguardando melhor e mais avisada opinião, o douto Tribunal a quo julgou incorretamente os factos provados, porquanto, motivou a decisão em prova de validade duvidosa.

    3- A douta sentença proferida fundou-se, para a condenação do arguido B..., nas declarações prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, em depoimento indireto ou depoimento de entidade policial, na "inquirição da testemunha C..., agente da PSP, a prestar serviços nesta cidade ... ".

    4- Ora, concordando-se inteiramente se trate de pessoa séria e fiável, reconheceu-se na douta sentença que "Pese embora a convicção do Tribunal não tenha assentado exclusivamente no referido por esta testemunha, certo é que a mesma foi a única testemunha que nos mereceu total credibilidade ..." 5- O depoimento desta testemunha foi, pois, o elemento decisivo no conjunto das provas produzidas, onde se motivou a decisão.

    6- E perguntamos nós: será admissível e poderá ser valorado o depoimento de um agente policial que reproduz o que ouviu dizer a um suspeito/vítima de um crime, no momento em que chegou ao local para tomar conta da ocorrência? 7- É axiomático que nada impede um inspetor da Polícia Judiciária, um agente da PSP, um soldado da GNR, etc., de depor sobre factos de que tomou conhecimento direto.

    8- Mas, no caso em apreço, a questão coloca-se em relação às declarações não formalizadas em auto prestadas perante um órgão de polícia criminal, será admissível e poderá ser valorado o depoimento de um agente da polícia que reproduz o que ouviu dizer à pessoa que depois vem a ser constituída arguida? Como se enuncia na douta sentença "Este cenário foi imediatamente afastado pelo Tribunal na sequência da inquirição da testemunha C..., agente da P.S.P, a prestar serviços nesta cidade, que relatou de forma séria, isenta e, por isso credível, a forma como foi chamado ao local e tudo o que aí verifico quando chegou." "Mais referiu que ambos os arguidos lhe relataram, imediatamente, o sucedido ...".

    9- São fecundas as decisões judiciais sobre este tema e, em particular, sobre a questão da admissibilidade dos depoimentos dos órgãos de polícia criminal, e pode dizer-se que não existe unanimidade entre a jurisprudência (quer dos tribunais comuns, quer do Tribunal Constitucional) e a doutrina portuguesa sobre esta matéria.

    10- Nesta senda, afigura-se-nos que o Tribunal a quo valorizou contra a lei depoimentos indiretos, ou depoimentos de entidade policial.

    11- O douto Tribunal, salvo o devido respeito, preocupou-se em assegurar a descoberta da verdade material, mas ignorou as garantias de defesa do arguido (v.g de modo a garantir o seu direito à não autoincriminação), direitos antagónicos ambos com tutela constitucional, mas que importa harmonizar.

    12 - Sendo certo que a busca da verdade material é, no processo penal, um dever ético e jurídico não se pretende que seja conseguida a qualquer preço. No âmbito da audiência, a produção probatória encontra-se sujeita aos limites impostos, nomeadamente, pelo art. 129, do C.P.P. e pelo art. 32 da C.R.P.

    13- Sempre que se verifique a existência de uma tensão entre princípios e interesses fundamentais potencialmente conflituantes, há que procurar a sua harmonização.

    14-Ainda entenderiamos que, para o esclarecimento dos crimes de maior gravidade em que se reconhecem as necessidades irrenunciáveis de uma ação penal eficaz, porque se acentua o interesse público numa investigação da verdade, o mais completa possível, poderá prevalecer o princípio da descoberta da verdade material.

    15- A contrario sensu, nos crimes de menor gravidade, como o aqui em apreço, o princípio da descoberta da verdade material deverá ceder perante os interesses e direitos da defesa, nomeadamente o direito à não auto incriminação, valores com tutela constitucional consagrados no art. 32, nº 1 e 5 da CRP.

    16- Assim sendo, ressalvado o devido respeito, a douta sentença, optou, unilateral e exclusivamente, pela descoberta da verdade material, em total prejuízo das garantias de defesa, valor com tutela constitucional.

    17- Em suma, no caso vertente, o depoimento do agente não poderia ter sido valorado, não pode ser considerado válido o depoimento indireto prestado pelo agente da P.S.P., ao sê-lo o Tribunal a quo serviu-se de prova proibida pelos arts. 125 e 129, nº 1 do C.P.P., para fundamentar a decisão que condenou o arguido B..., ao arrepio do que o legislador pretendeu acautelar.

    18- Não sendo válida a prova agora em causa, na falta de testemunhas presenciais, não é possível dar como provado que o arguido B... praticou os factos a ele imputados, daí sendo de excluir a respetiva consequência legal.

    19- Sem prescindir do supra referido, a douta sentença exarada, salvo o devido respeito, determinou de forma desajustada a medida da pena de multa e o quantitativo diário da pena, correspondente ao crime, marcando-a por uma nota de severidade que a tornou excessiva, violando o disposto nos artigos 40, 47 e 71 do Código Penal.

    20- O douto Tribunal, em nosso entender e sempre salvo o devido respeito por opinião contrária, não ponderou de forma criteriosa quer a culpa, quer as exigências de reprovação e de prevenção presentes no art. 40, n.º 1 e 2 bem como as demais exigências do art. 71, todos, do Código Penal.

    21- Quanto á a fixação do quantitativo correspondente a cada dia de multa, de acordo com o disposto no art. 47, nº 2, do C.P., deve ser efetuada em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.

    22- Afastadas aqui reflexões de prevenção geral e especial, bem como o grau de culpa do arguido, (essenciais à determinação da medida da pena) a única averiguação necessária versa sobre a situação económica e financeira do condenado, bem como os seus encargos pessoais.

    23- Assim sendo, com relevância para a definição dessa situação, atentos os factos provados sob os nºs 17 a 23, o quantitativo diário da pena de multa fixado pelo Tribunal a quo e considera-se que peca por excesso, revelando-se desadequado e desproporcionado aos rendimentos auferidos pelo arguido.

    24- Atenta não só a situação económica do arguido B..., bem como a crise que assola o nosso país, não é despicienda a diferença que vai dos €5,00 para os €7,00 diários. Diferença que poderá por em causa a subsistência do arguido e pessoas que dele dependem.

    25- Cremos que o tribunal a quo, no caso em apreço, não tomou em consideração a situação profissional e pessoal do arguido, já que a multa fixada acarreta necessário prejuízo para a subsistência do seu agregado familiar e impõe-lhe um sacrifício financeiro que o impede de satisfazer as necessidades básicas essenciais, aferidas diariamente.

    26- Perante as concretas circunstâncias já expostas, ponderando a situação económica do arguido e seu agregado familiar, afigura-se proporcional a pena de 80 dias de multa devendo o quantitativo diário situar-se no mínimo legal, €5,00, montante que, se nos revela, adequado e suficiente à realização das finalidades da punição.

    27- Sempre se dirá, ainda assim, que em caso de manutenção da condenação, o que se repudia, tal medida da pena continuará a causar ao recorrente um sacrifício económico palpável e que, a irá sentir, como uma verdadeira punição.

    28- Acresce que, tal como consta dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT