Acórdão nº 297/13 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelCons. José Cunha Barbosa
Data da Resolução28 de Maio de 2013
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 297/2013

Processo n.º 495/2011

  1. Secção

Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos vindos do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, em que é recorrente o Ministério Público e são recorridos A., Unipessoal, Ldª, B. e C., foi interposto recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), para apreciação da (in)constitucionalidade da norma « … do artigo 8.º, n.º 7, do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 05 de junho,…», cuja aplicabilidade foi recusada com fundamento na violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, contidos nos artigos13.º, n.º 1 e 18.º, n.º 2 e, bem assim, das normas que proíbem o duplo julgamento criminal e a transmissibilidade da responsabilidade penal, plasmadas nos artigos 29.º, n.º 5 e 30.º, n.º 3, todos da Constituição da República Portuguesa.

    2. O recorrente, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões:

      1. Diferentemente do que ocorre com o artigo 7.º-A do RGIFNA e artigo 8.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RGIT, não se vislumbra no n.º 7 do artigo 8.º deste último diploma, que a responsabilidade solidária pelas multas, decorra de uma qualquer conduta própria e autónoma relativamente àquela que levou à aplicação da sanção penal à pessoa coletiva.

      2. Deste modo, essa responsabilidade solidária equivale a uma transmissão de responsabilidade penal, que é constitucionalmente proibida (artigo 30.º, n.º 3 da Constituição).

      3. Assim, a norma do n.º 7 do artigo 8.º do RGIT, na interpretação segundo a qual, os administradores e gerentes de uma sociedade, condenados pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal (artigo 105.º, n.ºs 1 e 4 do RGIT), cuja pena cumpriram, são ainda solidariamente responsáveis pela multa em que a sociedade, pela prática do mesmo crime, também ela, foi condenada, é inconstitucional por violação do princípio constitucional referido e dos princípios da culpa, da igualdade e da proporcionalidade.

      4. Termos em que deve negar-se provimento ao recurso.

      .

    3. Os recorridos, apesar de notificados, não apresentaram contra-alegações.

      Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.

  2. Fundamentação

    1. Constitui objeto do recurso de constitucionalidade a norma constante do artigo 8.º, n.º 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), cuja redação é a seguinte:

      Artigo 8.º

      (Responsabilidade civil pelas multas e coimas)

    2. Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis:

      1. Pelas multas ou coimas aplicadas a infrações por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa coletiva se tornou insuficiente para o seu pagamento;

      2. Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento.

      […]

    3. Quem colaborar dolosamente na prática de infração tributária é solidariamente responsável pelas multas e coimas aplicadas pela prática da infração, independentemente da sua responsabilidade pela infração, quando for o caso.

    4. […].

      Pretende o recorrente ver apreciada a (in)constitucionalidade da referida norma, tendo em conta os parâmetros constitucionais contidos nos artigos 13.º, n.º 1 (princípio da igualdade), 18.º, n.º 2 (princípio da proporcionalidade), 29.º, n.º 5 (proibição de mais que um julgamento pela prática do mesmo crime) e 30.º, n.º 3 (intransmissibilidade da responsabilidade penal), todos da Constituição da República Portuguesa.

      Vejamos.

    5. Relevam para apreciação das enunciadas questões, os seguintes factos:

      5.1. No Tribunal Judicial da Figueira da Foz (1.º Juízo), no âmbito do processo n.º 1/09.3IDCBR, em 24 de março de 2010, foi proferida sentença penal condenatória, cuja decisão é do seguinte teor:

      Nestes termos o Tribunal julga a acusação totalmente procedente e em consequência decide:

      1. Condenar o arguido B. por crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs 1 e 4 do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, na pena de 200 dias de multa, à razão diária de 3 euros, o que perfaz o montante de 600,00 € a que corresponde subsidiariamente 133 dias de prisão;

      2. Condenar o arguido C. por um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs1 e 4 do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, na pena de 200 dias de multa, à razão diária de 2,50 euros, o que perfaz o montante de 500,00 €, a que corresponde subsidiariamente 133 dias de prisão;

      3. Condenar a arguida “A. Unipessoal, Lda” por um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, 12.º, n.º 3, 105.º, n.º 1 e 4 do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, na pena de 400 dias de multa, à razão diária de 5 euros, o que perfaz o montante de 2.000 €;

      .

      5.2. O Ministério Público, não tendo a sociedade arguida procedido ao pagamento da multa em que havia sido condenada, formulou, em 24.03.2011, promoção em que concluiu da seguinte forma:

      “...

      Face ao que acaba de se expor e tendo em consideração, como já supra se referiu, que os responsáveis da sociedade arguida B. e C. foram condenados, nos presentes autos, como coautores do crime de abuso de confiança fiscal, juntamente com a sociedade arguida, resta concluir que a norma acabada de analisar é aplicável ao caso vertente.

      Nestes termos promovo em conformidade com o disposto no artigo 8º, nº 7, do RGIT, se considerem B. e C. solidariamente responsáveis pelo pagamento da multa a que a sociedade “A., Lda”...

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