Acórdão nº 2375/08.4TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2013

Data02 Dezembro 2013
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB - …, S.A., pedindo que a R. seja condenada a pagar à A. a quantia de € 35.789,38 a título de créditos emergentes da vigência e cessação do respectivo contrato de trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da propositura da acção até integral pagamento, sobre a quantia de € 34.646,02.

Invocou como fundamento da sua pretensão que trabalhou para a R., primeiro como porteira de recepção de restaurante, mediante a retribuição mensal de € 475,00 e depois, como caixeira, mediante a retribuição mensal de € 801,00, com um horário de trabalho semanal de 66 horas, desde 1 de Julho de 2003 até 20 de Agosto de 2007, data em que cessou, por sua iniciativa, o contrato de trabalho, não lhe tendo a Ré pago as seguintes quantias: € 801,00 a título de retribuição do mês de Julho de 2007; € 534,00 a título de subsídio de Natal proporcional ao trabalho prestado no ano da cessação; € 1.092,28 a título de férias e respectivo subsídio proporcionais ao trabalho prestado no ano da cessação; € 6.800,64 a título de trabalho prestado em 184 meias folgas; € 25.513,44 a título de retribuição de 3.312 horas de trabalho suplementar; e € 438,90 a título de formação profissional não prestada. A tais quantias acresce a de € 1.143,36 a título de juros vencidos entre 20 de Agosto de 2007 e 20 de Junho de 2008.

A acção prosseguiu os seus termos vindo a ser decidida por sentença de 8 de Novembro de 2011, cujo dispositivo, tendo em conta as rectificações de que foi objecto (fls. 170 e ss. e fls. 217/218), é o seguinte: «Pelos fundamentos expostos, julgo a presente acção parcialmente procedente por parcialmente provada e parcialmente procedentes as excepções peremptórias de pagamento e de compensação invocadas pela R., condenando a R. a pagar à A. as seguintes quantias: - retribuição do trabalho suplementar prestado em 184 meias folgas (dia de descanso), € 6.800,64; - retribuição do trabalho suplementar prestado em dias normais de trabalho, € 16.582,08; - formação devida à A., € 273,50, tudo no total de € 23.656,22 (vinte e três mil seiscentos e cinquenta e seis euros e vinte e dois cêntimos).

Absolvo a R. do demais peticionado».

Inconformada com o assim decidido recorreu a Ré para o Tribunal da Relação de Lisboa, que veio a decidir o recurso interposto por acórdão de 10 de Abril de 2013, integrando o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julga-se a apelação parcialmente procedente e, em consequência, altera-se a sentença recorrida e condena-se a R. a pagar à A. a retribuição pelo trabalho suplementar prestado em meios dias de descanso complementar e em dias normais de trabalho, entre 1 de Julho de 2003 e 31 de Julho de 2007, sem prejuízo dos períodos de gozo de férias, com base na retribuição mensal de € 475,00 até Julho de 2004 e de € 801,00 a partir de Agosto de 2004, a apurar no incidente de liquidação respectivo, absolvendo-se a R. da restante parte do pedido.

Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento».

Irresignada com esta decisão dela recorre agora de revista para este Supremo Tribunal a Ré, integrando, nas alegações apresentadas, as seguintes conclusões: «(i) Em face do Art.° 7º n° 4 do DL n.º 421/83, para ter direito à retribuição por trabalho suplementar o trabalhador tem que alegar e provar não só a prestação de trabalho fora do horário normal como também que essa prestação foi determinada pelo empregador, ou então que a mesma foi prestada com o seu conhecimento e sem a sua oposição.

(ii) O Art.° 258° n° 4 do CT/2003 veio inovar nesta matéria estabelecendo que só é exigível o pagamento de trabalho suplementar cuja prestação tenha sido prévia e expressamente determinada pelo empregador, ou realizada de modo a não ser previsível a sua oposição.

(iii) Desta forma, no caso dos autos, não poderá considerar-se que a Recorrida tem direito a qualquer remuneração por trabalho suplementar, nomeadamente em relação ao prestado em "meios dias" de descanso, porquanto nada impedia a Recorrente de alterar os dias de descanso da Recorrida (Art.° 173° n.° 1 do CT/2003), tendo nos termos da lei a Recorrida apenas […] direito a um dia de descanso semanal obrigatório (Art.° 205° n.° 1 do CT/2003).

(iv) E, com referência às horas prestadas a mais em dias normais de trabalho, por não ter provado que essas horas foram prestadas por determinação prévia expressa da Recorrente (conforme havia alegado), e nem sequer alegado que as mesmas foram prestadas com conhecimento e sem oposição desta, ou de modo a não ser previsível a sua oposição.

(v) Em qualquer caso, tendo a Recorrente sido citada para a presente ação em 29.7.2008 (data em que tem conhecimento da reclamação da Recorrida), em caso algum se poderia considerar provado o trabalho suplementar alegadamente prestado entre 1 e 28 de julho de 2003.

(vi) Pelos motivos referidos a Recorrente deverá ser, sem mais, absolvida, uma vez que a condenação em montante a liquidar pressupõe a existência de um direito (embora não quantificado), o que não é o caso dos autos.

(vii) Assim, ao decidir como decidiu o Acórdão recorrido violou o disposto no Art.º 7° n.° 4 do D.L. n.° 421/83, nos Art.ºs 197°, n.° 1, 258°, n.° 4, e 381°, n.° 2, do CT/2003, e também nos Art.ºs 264°, n.ºs 2 e 3, 514° e 712° do CPC e nos Art.ºs 349° e 351° do Código Civil.» Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido «na parte em que condena a Recorrente a pagar à Recorrida trabalho suplementar».

A Autora não respondeu ao recurso interposto.

Neste Tribunal o Exmº Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer, concluindo nos seguintes termos: «Em conclusão: tendo resultado provado que a autora prestou trabalho para a ré, em dias normais de trabalho e em meios dias de descanso, para além do seu horário normal, o que vale por dizer que prestou trabalho suplementar e que o fez de modo a não ser previsível a oposição da ré, dever-se-ia concluir ter a mesma direito à retribuição devida por tal trabalho, nos termos constantes da parte decisória do acórdão, em censura, aqui dada por reproduzida, pelo que o recurso deveria improceder, antes se confirmando aquele acórdão».

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3 e 639.º do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que correspondem aos artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, do anterior Código de Processo Civil, na versão que lhes foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista saber se estão preenchidos os pressupostos do direito ao pagamento do trabalho suplementar reclamado pela Autora.

II A matéria de facto fixada pelas instâncias é a seguinte: «1. A R. é uma sociedade que se dedica à actividade de restauração.

  1. No dia 1 de Julho de 2003, a R. admitiu ao seu serviço a A., para que esta desempenhasse as funções de porteira na recepção do restaurante explorado pela R., segundo as ordens, instruções e direcção da R..

  2. O contrato teria o seu termo em 30/06/2004, porém, foi objecto de sucessivas renovações, convertendo-se em contrato sem termo em 1/07/2006.

  3. O horário de trabalho era de 40 horas por semana distribuídas por seis dias, sendo cinco dias com sete horas e vinte minutos e um dia com quatro horas.

  4. A R. pagava à A., em contrapartida, a quantia mensal ilíquida de € 475,00.

  5. Assim que começou a prestar a sua actividade, e por ordem da R., a A. passou a gozar, apenas, uma folga por semana.

  6. Durante todo [o] período de prestação de trabalho, após 28 de Julho de 2003, a A. trabalhava entre as 12H00 e as 16H00 e voltava a trabalhar das 20H000 às 2H00[1].

  7. Em Agosto de 2004, a R. promoveu a A. a caixeira.

  8. Passou a pagar-lhe a quantia mensal de € 801,00.

  9. A A. preencheu e entregou à R., em 20/06/2007, uma comunicação escrita pela qual denunciava o contrato de trabalho, com efeitos a partir de 20/08/2007.

  10. A partir do dia 1/08/2007 (inclusive), a A. não mais se apresentou ao trabalho.

  11. A R. pagou à A. a quantia de € 160,20 relativa a folgas trabalhadas no mês de Dezembro de 2006.

  12. A R. pagou à A. a retribuição do mês de Julho de 2007, no dia 30/07/2007.

  13. Em 10/10/2008, a R. pagou à A. as seguintes quantias ilíquidas, pela cessação do contrato de trabalho, no total de € 1.676,93: a. 20 dias de retribuição do mês de Agosto, € 517, 57; b. proporcionais de 2007 de subsídio de férias, € 509,13; c. férias não gozadas de 2007, € 509,13; d. proporcionais de subsídio de Natal de 2007, € 509,70; e. formação profissional, € 165,40; 15. À quantia referida em 14., a R. deduziu € 534,00 relativa a 20 faltas injustificadas.» III 1 – A relação de trabalho existente entre as partes iniciou-se em 1 de Julho de 2003 e terminou no dia 20 de Agosto de 2007, pelo que à aferição dos pressupostos do trabalho suplementar peticionado pela...

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