Acórdão nº 756/07.0TACTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Novembro de 2013
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 27 de Novembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 5ª Secção (Criminal), do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1. Nestes autos de Instrução nº 756/07.0TACTB, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco, em que são arguidos A...
e B...
e em que é assistente C...
, na sequência de instrução requerida por ambos os arguidos (que pelo Ministério Público tinham sido acusados, cada um deles, de um crime de homicídio negligente p. e p. pelo artigo 137º nº 1 e 10º nº 2, do Código Penal), a Mma Juiz, em 06/12/2012, proferiu decisão instrutória de não pronúncia dos arguidos.
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Inconformado com tal despacho de não pronúncia, o assistente (por requerimento, de fls. 756 e segs., enviado por correio registado no dia 14.01.2013 (cfr. talão de registo aposto na parte inferior de fls. 756), interpôs recurso, retirando da correspondente motivação as conclusões seguintes (transcrição): “CONCLUSÕES: 1.ª - A M. Juíza não pronunciou os arguidos, pelos crimes, de que vinham acusados pelo M.° P.°, por entender que, não havia indícios de sinais da ocorrência, donde se possa formular um juízo de prognose favorável à futura condenação.
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- Com o devido respeito, o recorrente entende que há indícios, quer no que respeita à prova recolhida, no âmbito do inquérito e que conduziu à Acusação Pública, quer em sede de instrução.
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ª - Além do mais, à douta decisão falecem os elementos essenciais, que conduzem à imprescindível fundamentação, que deve ser clara, inteligível e congruente.
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- Não obstante ter efectuado uma análise crítica da prova, não indica, de forma sintética, sequer, os factos, que possibilitam chegar à conclusão da insuficiência da prova indiciária, como impõem os art.°s 283.°, 3 e 308.°, 2 do Cód.Proc.Penal.
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- Tão pouco, se explicitam, no douto despacho recorrido, os factos não indiciados e a razão da insuficiência.
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- Outrossim, os elementos objectivos e concretos, contidos no Relatório do IGAS e no relatório pericial, concatenados com os depoimentos, impunham uma fundamentação de facto e de direito, que é inexistente.
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- Para mais, a Prova Pericial é a de maior relevo, porque adequada à descoberta da verdade, demonstrando a desconformidade com a legis artis, bem como, a ausência de diligências, necessárias para evitar a morte da paciente, no caso concreto e que foi desvalorizada.
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- Trata-se, assim, de nulidade, que, aqui, se invoca — cfr. art.°s 283.°, 3 e 308.°, 3 do Cód.Proc.Penal.
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- Acresce que, os arguidos detectaram a febre, edemas, as crepitações pulmonares, aumento do coração ao RX, leucocitose, com neutrofilia evidente e progressiva e com sinais de infecção generalizada e sistémica, teve ALTA.
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- Foi excluído o enfarte agudo do miocárdio, mas não foi efectuado o ecocardiograma de urgência e já que, só às segundas-feiras é possível realizá-lo, poderia e deveria ter sido enviada para o Hospital mais próximo.
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- A doente morreu, na Enfermaria, sem estar monitorizada.
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- Não houve quaisquer medidas terapêuticas e de suporte hemodinâmico, nem de vigilância e controlo dos sinais vitais, num quadro de infecção sistémica.
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- O relatório pericial, bem como, o do IGAS, não foram tomados em consideração, no que à violação dos cuidados, diligências e acompanhamento da doente se exigia.
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- O depoimento do Perito Médico, de 2 de Novembro de 2012, das 14.30.33 às 15.46.46 horas, mantém o teor do Relatório Pericial, junto aos autos, onde se evidenciam as gravíssimas faltas de atenção, cuidados e diligências, em completa articulação, que foi desprezada.
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- Os diagnósticos têm de ser efectuados, com cuidado, atenção e de acordo com os conhecimentos e instrumentos ao dispor, tal como, as prescrições e acompanhamento da terapêutica adequada e pedir a colaboração de colegas da especialidade e o concurso de unidades hospitalares, em face da ausência de meios.
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- Naquele hospital, só às segundas-feiras, eram e são, efectuados ecocardiogramas, que, face à urgência, impunham a presença do médico, para ser efectuado e na sua ausência, a evacuação da doente para outro hospital, o que não foi efectuado.
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- O sofrimento da doente estava patente nas dores precordiais, na angústia e ansiedade reveladas, encontrando-se bem, no período das 72 horas, que antecederam a sua morte, tendo tido ALTA, com sinais de infecção sistémica.
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- Todo e qualquer médico, além dos deveres profissionais, tem o dever de tratar qualquer doente, independentemente da idade, com humanidade e compreensão, suavizar-lhe o sofrimento e prolongar-lhe a vida.
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- A conjugação dos documentos, em sede de inquérito e de instrução, com os depoimentos do Senhor Perito, apontam para conclusão diferente da que consta do douto despacho recorrido.
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- Foram violados os art.°s 283.°, 3 e 308.° do C.P.Penal e art.°s 137.°, 1 e 10.º do Cód. Penal.
Termos em que, deve o douto despacho recorrido ser substituído por outro, que pronuncie os arguidos, com o que se fará JUSTIÇA.
” * 3. O arguido B..., a fls. 795 a 801vº, respondeu ao recurso terminando com as seguintes (transcritas) conclusões: “CONCLUSÕES 1ª O recurso apresentado é extemporâneo; 2ª Na instrução não existe prova em sentido próprio de cuja decisão possa haver impugnação; 3ª Não é aplicável ao recurso da decisão instrutória o alargamento de prazo previsto no n.º 4 do art.411º do CPP; 4ª Não existe qualquer nulidade na decisão instrutória; 5ª Não se impõe ao despacho de não pronúncia, como se percebe, o cumprimento do previsto no art. 283°, n.º 3, CPP; 6ª O despacho de não pronúncia tem uma natureza similar ao despacho de arquivamento, bastando serem claros e fundamentados os motivos de Direito e de facto que conduziram ao resultado; 7ª Na decisão em crise se faz uma extensa análise da factualidade apurada na instrução e uma aturada explicitação dos meios que lhe estão na base, elencando-se, para cada capítulo, a matéria de prova que se teve em consideração de forma particularmente clara; 8ª Não existem quaisquer indícios da prática pelo arguido do crime de que vinha acusado; 9ª Não foi o arguido que “passou a observar e a tomar as decisões clínicas relativas à doente”; 10ª O arguido apenas se encontrava escalado para a prestação desse serviço de apoio à urgência no período das 8 às 20h, do dia 11; 11ª Limitou-se a pedir análises de enzimas e dar indicação de que se as mesmas estivessem bem podia ser dada alta, do ponto de vista da Cardiologia, à utente; 12ª Os resultados das análises só foram conhecidos após a sua de servido do arguido; 13ª Essas análises não tinham marca de doença cardíaca mas de infeção do foro da Medicina Interna; 14ª Só nessa altura foi afastada a hipótese de enfarte agudo do miocárdio, pelo que, no entender do perito, só após esta exclusão fazia sentido continuar o estudo com a realização de um ecocardiograma; 15ª Tal obrigação não impedia sobre o arguido, que já não se encontrava ao serviço; 16ª Não existe nos autos qualquer prova de que a utente tenha sofrido de uma pericardite; 17ª Essa é apenas uma hipótese, entre diversas outras possíveis causas de morte; 18ª Não existe também uma relação causal direta entre a suposta pericardite e a morte.
Nestes termos e demais de Direito deve o recurso: 1. Ser recusado por extemporâneo ou, caso assim se não entenda; 2. Ser julgado totalmente improcedente no que ao arguido B... se refere Com o que se fará a costumada JUSTIÇA” 4. O Ministério Público junto da 1ª instância, a fls. 803 a 813, também respondeu ao recurso, terminando com as seguintes: “CONCLUSÕES: 1. Da prova produzida na fase de instrução não resulta qualquer indício da violação por parte dos arguidos de qualquer dever objectivo de cuidado.
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Com efeito, essa prova, produzida, apreciada, ponderada e valorada pelo tribunal suportam objectivamente a decisão de não pronúncia dos arguidos e ainda, a insuficiência da prova indiciária.
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A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, quer de facto quer de direito, e não é possuidora de qualquer vício que inquine a sua validade substancial ou formal, devendo ser mantida nos seus precisos termos, julgando-se assim o recurso improcedente.
Termos em que julgando os presentes recursos improcedentes farão V.ªs Ex.ªs como é de lei.
” 5. O arguido C... não respondeu ao recurso.
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Admitido o recurso, fixado o respectivo regime de subida e efeito (foi-lhe atribuído efeito suspensivo certamente por lapso dado que o efeito correcto era o meramente devolutivo), foram os autos remetidos a este Tribunal.
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Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto, a fls. 825 e 826, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta.
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Aquando do exame preliminar, o aqui relator, por considerar verificada uma questão prévia relacionada com a extemporaneidade do recurso, nos termos do artigo 417º nº 6 al. b) do Código de Processo Penal, a fls. 830 a 848, proferiu decisão sumária que culminou com o seguinte dispositivo: “Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se em rejeitar o recurso, por extemporâneo.
Nos termos do disposto no artigo 420º nº 3 do Código de Processo Penal, condena-se o recorrente na importância correspondente a 4 (quatro) UC´s.” * 10.
Não se conformando com a assim decidida extemporaneidade do recurso, o assistente, nos termos do artigo 417º nº 8 do Código de Processo Penal, apresentou reclamação para a conferência, pelos fundamentos constantes de fls. 854 a 856 (fax, sendo que o original consta a fls. 858 a 860) que se passam a transcrever: “1. Com o devido respeito, foi suscitada uma questão prévia, relacionada com a extemporaneidade do recurso, obstando ao conhecimento do objecto do recurso, mas de forma infundada.
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Com efeito, a decisão foi notificada ao Assistente, com data de 7 de Dezembro de 2012, contendo a indicação expressa do art. 113.°, 2 do C.P.P.
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Isto é, o Assistente foi notificado em 10 de Dezembro de 2012.
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Contados os prazos legais e na tese sufragada pela douta decisão, os 20 dias expiraram...
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