Acórdão nº 279/10.0PBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução18 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: A) No âmbito do processo comum (tribunal colectivo) n.º 279/10.0PBCTB que corre termos no Tribunal Judicial de Castelo Branco, 3º Juízo, em 21/1/2013, foi proferido Acórdão, cujo Dispositivo é o seguinte: “Atento o exposto, julgamos procedente por provada a acusação pública, em função do que, enquanto autor material, na forma consumada, condenamos o arguido A…: 1. Pela prática de um crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163.º/1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

2. Custas pelo arguido com taxa de justiça no equivalente a 6 UC, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.

* Declara-se perdida a favor do Estado a arma apreendida nos autos a fls. 8, desde já se ordenando a sua oportuna destruição, atendendo a que não tem qualquer valor comercial.

Após trânsito: - Remeta boletins ao registo criminal.

- Envie cópia da presente decisão ao I.R.S.

- Passe mandados de detenção do arguido e condução ao E.P., para cumprimento da pena de prisão que lhe foi aplicada.

” **** B) Inconformado com a decisão recorrida, dela recorreu, em 21/1/2013, o arguido, pedindo a sua revogação e sua substituição por outra que o absolva ou, caso assim se não entenda, o condene em pena que não exceda um ano de prisão, suspensa na sua execução, sem embargo de, em primeiro lugar, ter suscitado a questão do impedimento legal da Meritíssima Juiz Presidente que o julgou, extraindo da motivação as seguintes conclusões: 1.Prevê a alínea c) do art.º 40.º do C.P.P. que “Nenhum Juiz pode intervir em julgamento, … relativos a processo em que tiver: c) Participado em julgamento anterior;” 2. Os dois acórdãos proferidos pelo Tribunal “a quo” foram elaborados pela mesma relatora, encontrando-se, ambos, pela mesma assinados.

  1. Na versão actual do art.º 40.º do CPP, a norma em causa, aplica-se a qualquer juiz que tenha participado em julgamento anterior ou em decisão de recurso anterior, independentemente de ter sido em fase anterior do processo ou não.

  2. Nos presentes autos, o Meritíssimo Juiz Presidente que julgou o arguido e proferiu o acórdão declarado nulo pelo Tribunal da Relação de Coimbra é o mesmo Juiz Presidente que julgou e proferiu o acórdão agora em crise.

  3. Considera o arguido que, no novo julgamento, existe impedimento do Meritíssimo Juiz Presidente por já ter participado em julgamento anterior.

  4. Assim, tendo o Meritíssimo Juiz Presidente participado em julgamento e decisão anterior, que apreciou o mérito da causa, encontrava-se impedido de intervir em novo julgamento, no qual foi proferido o acórdão condenatório de que agora recorre, dúvidas não existem de que estamos perante a nulidade prevista nas alíneas a) e e), do artigo 119.º, o que importa a anulação do julgamento e do subsequente processado com ele relacionado (artigo 122.º, n.º 1 Código Processo Penal).

  5. O Tribunal fundou a sua convicção nas declarações do arguido que considerou “… manifestamente incredível e inconsistente…”, nos depoimentos conjugados das testemunhas; no auto de exame de fls. 160; no certificado de nascimento de fls. 142; no auto de apreensão de fls. 8; na fotografia de fls. 10; no Certificado de Registo Criminal do arguido de fls. 266 e seguintes; e no relatório social de fls. 252 e seguintes.

  6. No referente ao depoimento prestado pela testemunha B..., fluí do acórdão em crise que: “… entretanto a irmã mais nova começou a bater na porta da sala e o tio acabou por abrir a porta mas antes mostrou-lhe uma faca, dizendo-lhe “se contares a alguém…”, enquanto passava a faca pelo pescoço, tendo dito a testemunha que ficou convencida que com tal gesto o arguido pretendia dizer que se ela contasse a alguém o que se havia passado ele cortava-lhe o pescoço;” (negrito e sublinhado nosso).

  7. O Tribunal “a quo” deu por provado que “… o arguido, (…), ainda disse à menor B... "se contas a alguém …", ao mesmo tempo que exibia uma faca, (…), passando com a mesma pelo pescoço, tendo a menor ficado convencida de que o arguido a estava a avisar de que se ela contasse a alguém o que se havia passado ele lhe cortaria o pescoço.” (Cfr. II – Fundamentação A) Julgam-se provados os seguintes factos ponto 9.), no entanto o mesmo não resulta da prova produzida em sede de audiência e julgamento nem tão pouco do depoimento da testemunha B… que só no final do seu depoimento, a instâncias Exmo. Sr. Procurador do M.P., questionada sofre a faca é que a ofendida ( B...) se recordou que o arguido tinha uma faca exclamando “Ah, pronto. Quando eu sai da sala ele chamou-me outra vez e disse olha se contares isto a alguém, e apontou para a faca que tinha guardada nas calças e fez o gesto com a mão.”, mas logo de seguida afirmou que só viu a faca quando “… fui pedir o meu telemóvel”.

  8. A forma serena e previdente com que a ofendida relata os factos não se coaduna com os sentimentos e emoções de alguém que os tenha vivenciado, não sendo por isso um depoimento credível e autêntico.

  9. O Tribunal “a quo” deu por provado que “Nessa altura, em virtude da menor B... ter começado a gritar, veio em seu auxílio a sua irmã, que desferiu murros na porta, e apenas por essa razão o arguido abriu a porta da sala.” (Cfr. II – Fundamentação A) Julgam-se provados os seguintes factos ponto 8.), no entanto o mesmo não resulta da prova produzida em sede de audiência e julgamento, nem das declarações da testemunha C... que afirmou que o barulho que ouviu “Foi a mesa do meio, da sala.”, aliás nem a própria B..., no seu depoimento, diz que gritou mas sim que chamou a irmã.

  10. Os depoimentos das testemunhas B... e C... não são coincidentes, pelo contrário, esses depoimentos mostraram-se contraditórios e frágeis.

  11. Salvo melhor entendimento, o Tribunal “a quo” baseou-se no depoimento conjugado de testemunhas que não assistiram aos factos pelos quais o arguido vêm acusado, pelo que nada puderam esclarecer o Tribunal quanto aos mesmos.

  12. Observados os depoimentos das testemunhas B... e C..., existem grandes discrepâncias: - A testemunha B... disse que quando saiu da sala foi ao quarto ver como estava a irmã, por sua vez a testemunha C... disse que estava junto à porta da sala; - Do depoimento da B... resulta que esta foi a primeira sair da sala quando, inicialmente, a testemunha C... refere que foi o tio, e mais tarde vem dizer foi a B...; - A testemunha B... refere que começou a chamar (gritar) pela a irmã e esta veio em seu auxílio, quando na verdade a irmã ( C...) esclarece que não ouviu gritos mas sim o barulho da mesa da sala; - A testemunha B... menciona que o tio tinha a faca guardada nas calças e por sua vez a testemunha C... afirma que viu o tio calcar as botas e meter a faca mas meias; - A testemunha B... disse que só viu a faca quando foi novamente à sala para ir pedir o telemóvel, enquanto a testemunha C... no seu depoimento nunca referiu que a irmã tivesse voltado uma segunda vez à sala.

15. Com efeito, tais depoimentos (de B... e C...) são incoerentes, não credíveis e desprovidos de qualquer valor probatório, insuficientes para suportar uma condenação do arguido, existindo, assim, insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

16. O Tribunal a quo violou, entre outros, os artigos 355.º do Código de Processo Penal.

17. Pelo que se deixou escrito nos antecedentes artigos é manifesto que o douto Acórdão não observou nem as regras da experiência nem o máximo rigor, violando pois o citado art. 127.º do Código Processo Penal.

18. O que é fundamento de recurso, pois configura ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA – art. 410º, nº 2, alínea c) do C.P.P.

19. Com base em tudo o que foi atrás exposto, a decisão recorrida padece, ainda, do vício da insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, previsto no art.º 410.º n.º 2 al. a) do Código Processo Penal, determinante do reenvio do processo para novo julgamento quanto ao recorrente.

20. No mínimo, coloca-se a dúvida insanável quanto à veracidade da versão apresentada pela ofendida, dúvida que, em decorrência do Princípio “in dubio pro reo” – emanação do Princípio da...

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