Acórdão nº 599/10.3TAMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução26 de Junho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório Nos autos de processo comum com intervenção do tribunal singular nº 599/10.3TAMGR do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande o arguido A..., identificado nos autos, foi submetido a julgamento acusado pela assistente “B...

, SA”, da prática de um crime de ofensa a pessoa colectiva sob a forma agravada, p. e p. pelos artigos 187º, nº 1 e 183º, nº 2, por força do nº 2 do citado art. 187º, todos do Código Penal.

O Ministério Público acompanhou a acusação particular deduzida pela assistente.

A assistente deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia de € 1.000,00 a título de danos não patrimoniais sofridos.

Realizada que a audiência de julgamento, em 11 de Janeiro de 2012 foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: Pelo exposto, decide-se: -Condenar o arguido A... pela prática de um crime de ofensa a pessoa colectiva na forma agravada, p. e p. nos artigos 187º, nºs 1 e 2 e 183º, nº 1, al. a), todos do Código Penal, em pena de admoestação; -Vai ainda o arguido condenado no pagamento das custas criminais, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC’s; Quanto ao pedido cível: Julga-se parcialmente procedente o pedido de indemnização cível, e em consequência: -condena-se o demandado a pagar ao demandante, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o montante global de € 500,00 (quinhentos euros), acrescida de juros de mora desde a presente decisão até efectivo e integral pagamento; -julgando-se o pedido improcedente quanto ao mais, em conformidade se absolvendo o demandado.

» Custas do pedido de indemnização cível: pelo demandado e pelo demandante na proporção do respectivo decaimento.

Inconformado, recorreu o arguido A...

, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões:

  1. A Srª Juiz "a quo" errou, notoriamente, na apreciação da prova.

    B) Já que, tendo em consideração os factos considerados provados, deveria ter tomado outra decisão, a qual seria a da absolvição do arguido; C) Na verdade, ao considerar provado que a organização sindical Fiequimetal organizou para aquele dia 8 de Julho de 2010, um "Dia Nacional de Protesto e Luta"; D) E que emitiu "Declaração de Greve" que publicou no Jornal Correio da Manhã; E) Que tal jornada se estendeu a várias empresas; F) Que foi no âmbito desse cenário de luta que o arguido se dirigiu às instalações da assistente; G) Que foi a organização sindical que decidiu manifestar-se daquela forma junto das instalações da assistente; H) Que o cartaz com os dizeres em causa nos autos foi elaborado por membros do Sindicato; I) Que o arguido, nesse dia, deparando-se com tal cartaz, decidiu empunhar o mesmo; J) Que corre termos um processo no Tribunal do Trabalho em que o arguido impugna o despedimento de que foi alvo, então K) Teria o Tribunal que concluir, face às regras da experiência comum e tendo em conta o comportamento que um homem médio adoptaria, colocado naquela situação, concluiria, dizíamos, que não era exigível outra atitude ao arguido que não fosse a de, tendo em conta o cenário com que se deparou, segurar o dito cartaz; L) E não deveria ter considerado provado que, ao empunhar o cartaz, com tais dizeres, o arguido poderia dar a entender que a entidade patronal lhe imputava factos falsos, fabricando processos, utilizando meios não idóneos para tal; M) A conclusão que a Srª Juiz tira e que dá como provada de que tais dizeres poderiam dar a entender a todos os que lessem o cartaz que a entidade patronal lhe estava a fabricar processos disciplinares "utilizando meios não idóneos para tal"é, salvo o devido respeito, altamente rebuscada, forçada até! N) Pergunta-se: quem visse e lesse tal cartaz, porque haveria de pensar que a assistente "lhe imputava factos falsos, fabricando processos, utilizando meios não idóneos para tal..."?!' O) Perguntamos nós: Meios não idóneos para fabricar processos? Que meios não idóneos podem ser esses? Exemplos?! Nem sequer descortinamos exemplos de "meios não idóneos" para fabricar processos disciplinares ...

    P) A expressão "meios não idóneos" foi inventada pela assistente e plasmada na sentença, sem qualquer suporte testemunhal ou documental.

    Q) Não se deveria ter considerado provado, por ausência total de prova nesse sentido, que o arguido visou atingir a assistente no seu bom-nome e que, não obstante, aceitou tal probabilidade, com ela se conformando; R) Já que nunca foi essa a intenção do arguido; S) O arguido pensou e pensa que tais processos disciplinares foram fabricados, segurou o cartaz com tal dizer naquele dia e hora, pretendendo apenas dizer isso mesmo, no âmbito do seu direito de expressão; T) Mas nunca foi sua intenção atingir a empresa no seu bom nome! U) Nem tal faz sentido, atendendo a que não foi ele quem fez o cartaz, nem quem o pensou ou encomendou; V) Apenas o segurou, no contexto supra relatado e nas circunstâncias supra mencionadas! W) Acresce que não se vislumbra como pode a empresa ter sido atingida no seu bom nome; X) Sendo a própria assistente, na pessoa do seu administrador, quem o nega; Y) Por outro lado, o Tribunal" a quo" deveria ter considerado provado, face à prova testemunhal e documental, que o arguido tinha fundamento para, em boa fé, reputar como verdadeiros os dizeres apostos no cartaz que decidiu empunhar.

  2. Tal resulta da prova documental e também da testemunhal; A

  3. Já que o arguido impugnou o despedimento de que foi alvo; BB) Correndo termos o respectivo processo no Tribunal do Trabalho de Leiria; CC) Aí reafirmando, peremptoriamente (e após expor os factos que, na sua óptica, o justificam), que os processos disciplinares foram fabricados; DD) Mesmo junto aos presentes autos encontra-se prova documental que justifica que a Srª Juiz tivesse decidido no sentido de considerar que o arguido tinha fundamento para, em boa fé, reputar como verdadeiros os dizeres apostos no cartaz; EE) O Sindicato a que pertence reuniu com o administrador da assistente focando este, e só este, assunto dos processos disciplinares; FF) Certamente que, tudo conjugado, não é admitir que o arguido (e o seu Sindicato) decidissem levar a cabo todas essas diligências, só para passar tempo ou porque não estivessem convencidos de que tais processos disciplinares eram fabricados! GG) Pelo que, também por tal facto, não deveria o arguido ter sido condenado, antes, absolvido; HH) Tal como resulta, a contrario sensu, do disposto no art. 187º nº 1 do Código Penal; II) O tribunal com competência própria para aferir se os processos disciplinares foram, ou não, fabricados, é o Tribunal do Trabalho.

    JJ) Sendo essa a instância própria para dirimir os conflitos laborais, como é o caso dos autos; KK) A Sr.ª Juiz a quo parece ter chamado a si, erradamente, tal competência; LL) Pois considerou, até, o crime agravado nos termos do art.º 183 do CP, o qual prevê a imputação de factos que o agente conhecia serem falsos.

    MM) Ora, salvo o devido respeito, quem tem competência para determinar tal situação são os Tribunais do Trabalho; NN) É que para se concluir que os processos disciplinares não são fabricados, obrigatório seria analisar-se a questão laboral em si; 00) Isto é, se a entidade patronal tinha razão para injustificar as duas faltas dadas pelo arguido, se a entidade patronal tinha razão para exigir do arguido que assinasse papéis, etc, etc, etc ...

    PP) Análise essa que não tem cabimento no âmbito do processo penal; QQ) Pois só analisando o processo à luz do Direito do Trabalho, se poderá concluir, sem margem para dúvidas, se houve ou não fabricação (no sentido de, do nada, nascerem processos), de processos disciplinares.

    RR) Não tendo este Tribunal competência para o fazer; SS) A Srª Juiz não terá valorado, devidamente, a prova documental junta aos autos pela defesa do arguido; TT) Com a sua conduta o arguido não preencheu os elementos objectivos e subjectivos do tipo legal de crime pelo qual vem acusado; UU) A Srª Juiz a quo terá feito uma interpretação menos conforme do disposto nos arts. 187º e 183º ambos do Cód. Penal; W) Bem como do disposto no art. 31º daquele mesmo diploma legal; Termos em que deverá o arguido ser absolvido assim se fazendo, cremos, a costumada JUSTIÇA! Notificado, o Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo que não merece provimento.

    Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

    Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu resposta.

    Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais foi realizada conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    *** II. Fundamentos da decisão recorrida A decisão recorrida contém os seguintes fundamentos de facto: 1. Factos provados: 1.1. Da discussão da causa, e relativamente à matéria de facto constante da acusação particular deduzida pela assistente a fls. 149-152, resultaram provados os seguintes factos: 1) A “ B..., SA” é uma sociedade comercial que se dedica ao fabrico de produtos em plástico, fundamentalmente para a indústria automóvel; 2) O arguido prestou serviço junto da sociedade B..., SA, por contrato de trabalho celebrado desde 06 de Dezembro de...

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