Acórdão nº 13/05.6TAAND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Novembro de 2008

Data05 Novembro 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO Nos presentes autos o arguido … casado, empresário, filho de … e de …, nascido em 31/5/37, natural de Aguada de Baixo, Águeda, residente na Rua das P…, C…, A…, Anadia, foi condenado, pela prática de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelo art. 137º nº 1 do Código Penal (em concurso ideal com a prática de uma contra-ordenação de realização ilegal da marcha-atrás, prevista e punida pelos art. 46º nºs 1 e 2, e 146º al. e) do Código da Estrada), na pena de dez meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de dois anos, e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de dois meses.

O pedido de indemnização civil deduzido pelos pais do falecido … e da acidentada … foi julgado parcialmente provado e procedente e em consequência a Zurich – Companhia de Seguros, SA foi condenada a pagar a … e … a quantia de € 106.416 (cento e seis mil, quatrocentos e dezasseis Euros), acrescida de juros, à taxa legal supletiva em vigor (actualmente fixada em 4% ao ano), desde 17 de Novembro de 2006, até efectivo e integral pagamento; foi Julgado o pedido de reembolso de despesas hospitalares parcialmente provado e procedente e em consequência a Zurich – Companhia de Seguros, SA condenada a pagar ao Centro Hospitalar de Coimbra a quantia de € 8.033,50 (Oito mil e trinta e três Euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros, à taxa legal supletiva em vigor (actualmente fixada em 4% ao ano), desde 17 de Novembro de 2006, até efectivo e integral pagamento.

O arguido … foi absolvido da prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artº 148º, nº 1, do Código Penal, e da prática de uma contra-ordenação de excesso relativo de velocidade, prevista e punida pelo artº 24º, nºs 1 e 3, do Código da Estrada; o pedido de indemnização civil e o pedido de reembolso de despesas hospitalares em relação à Generali – Companhia de Seguros, Spa foi julgado não provado e improcedente.

Inconformado, com esta decisão, o arguido … interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: I Para efeitos do disposto no n° 5 do art° 412°, do Código do Processo Penal, expressamente se declara que pretende o agora recorrente ver apreciadas previamente as duas questões aí suscitadas no recurso interlocutório.

II Nessa medida, como o despacho que declarou finda a produção de prova e concedeu a palavra para alegações orais sem apreciar o pedido formulado para deslocação do Tribunal ao local onde ocorreu o acidente de viação, para aí obter esclarecimentos das testemunhas da acusação, consubstancia omissão absoluta de pronúncia, geradora de nulidade - arts. 379°, nº 1, al.c), e 380°, n.º3, do Cód. Proc. Penal, e; III Ao decidir como decidiu, não se admitindo a junção aos autos de documentos que assumiam repercussão no exame e boa decisão de toda a causa, violou a decisão recorrida o disposto nos citados artigos 165° nº3, 98° e 340° n° 1 do Código do Processo Penal, bem assim os arts. 11°, nº 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 6°, n° 2 da Declaração Europeia dos Direitos do Homem, o art. 14°, n° 3 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e políticos, além do que, ao coarctar, de forma inaceitável os direitos de defesa do arguido, tal Decisão, ao sustentar-se no preceituado no art. 165°, n° 1 e 340°, n° 4, aI. a) e c), violou e fez oposta interpretação ao preceituado nos arts 20°, n° 4 e 32°, n° 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa, pelo que, deve ser declarado nulo todo o julgamento, e ordenada a realização de nova audiência, nos termos do art. 426.º-A do C.P.P., de modo ao arguido poder exercer o contraditório relativamente a toda a prova arrolada pela acusação pública.

IV Por outro lado, para além das consequências referidas, sempre existe também nulidade da sentença, nos termos do art. 359, n° 1 e art. 1°, aI. f) do Código do Processo Penal, pois a mesma condena por factos substanciais que não constavam na acusação, os quais nunca foram dados a conhecer ao arguido, para em relação a eles se pronunciar e exercer o seu direito de defesa, assim o tendo apanhado de completa surpresa.

V Factos esses substanciais, porque da acusação apenas constava que a morte resultara do impacto provocado pelo veículo do outro arguido, …, e os aditados na sentença, referem, ao invés, que não fosse a manobra do agora recorrente …, que projectou o veículo do …, e não teria o mesmo passado para a faixa contrária e provocado o impacto no ciclomotor, sendo que toda a censura criminal da sentença dirigida ao recorrente, assenta exclusivamente na valoração deste nexo causal.

VI Nesta perspectiva, é até inconstitucional o normativo processual penal constante do art. 1º aI. f), art. 359º, nº 1 e 379º, nº 1, aI. b), caso seja interpretado no sentido de que não constitui alteração substancial dos factos constantes da acusação, a adição de factos na sentença relativamente a homicídio negligente, que, em si só, vão para além de um carácter fortemente agravante da responsabilidade criminal do arguido, mas passam a ser apenas o elemento consubstanciador da violação do dever objectivo de cuidado, directamente conexionado com o resultado, e, nessa medida passar a assumir carácter tipicamente relevante para a condenação.

VII Tendo o Tribunal dado como provado que a carrinha do agora recorrente saía repentinamente, de marcha atrás na altura em que vinha o veículo XI, e que a mesma continuou até breves instantes depois do embate, erra notoriamente na valoração da prova, na medida em que nenhum depoimento testemunhal o refere, e mesmo as fotos tiradas pela G.N.R., ao veículo XI, evidenciam que o vinco existente no veículo, em local algum denota aprofundamento progressivo, mas um vinco absolutamente constante na profundidade, que desaparece até logo após o final da porta dianteira, sem um risco na pintura que seja depois. Nessa medida, tais factos nunca poderiam ter sido dados como provados, pelo que se mostra violado o disposto no art. 127º do Código do Processo Penal, cf. registos magnéticos das testemunhas …, rotação 2360 a 2622 da cassete nº 2, lado A e do lado B, 2521 a 1522; …, desde 0000 ao nº 1050 e ss; …, desde o nº 1051 ao 2525 lado A e nº 2524 ao 0000 do lado B, e cassete na 2 do lado A 0000 a 0437; …, desde o nº 0438 ao nº 2015 do lado A da cassete na 2; …, desde o nº 0000 ao nº 2456, lado A, nº 2457 a 2523, do lado A e nº 2522 ao nº 1755 do lado B; …, desde o nº 1754 ao 0000 do lado B e cassete na 2, lado A 0000 ao 0012; …, desde o nº 0013 ao 1929 da cassete n° 2, lado A; …, desde o nº 1930 ao 2527 da cassete nº 2 do lado A e do nº 2526 ao nº 1565 da cassete nº 2, lado B; …, nº 1564 ao nº 0000 da cassete nº 2 do lado B e do nº 0000 ao n° 410 da cassete nº 3 do lado A; …, desde o nº 0000 ao nº 0989 do lado A; …, gravado desde o nº 0989 até ao final do lado A e desde o nº 2600 até ao nº 2303 do lado B; …, desde o nº 2302 até ao final do lado B; …, desde o n° 0000 ao nº 0305 do lado A, …, desde o nº 0305 até ao final do lado A e desde o nº 2600 até ao nº 1719 do lado B; …, desde o nº 1211 até ao final do lado B e desde o n° 0000 até ao nº 0988 do lado A, tudo conforme documentado em acta.

VIII Erra ainda notoriamente o Tribunal A Quo na valoração da prova e, sobretudo, revela insuficiência de meios de prova, para poder concluir que o veículo XI conduzido pelo outro arguido foi projectado pelo do agora recorrente, sendo por isso que invadiu a faixa contrária, quando nenhum testemunho o permite concluir, muito menos as fotos dos veículos, conforme já se referiu, e o XI demora 17 metros, numa estrada com largura total de 4 e 70, a ir para o lado esquerdo (ver início dos rastos do croqui), deixando depois tais rastos expressos no alcatrão, durante 18 metros, sendo que, entre o início e o fim da travagem, esta apresenta apenas de desvio na sua trajectória, de 20 cm relativamente ao eixo da via, sempre portanto em absoluto controlo da viatura, e nunca com evidência de qualquer projecção ou desgoverno. Nessa medida, violou o Tribunal, pelo menos, igualmente o conteúdo material que lhe era permitido pelo art. 127º do Código do Processo Penal, cf. registos magnéticos das testemunhas …, rotação 2360 a 2622 da cassete na 2, lado A e do lado B, 2521 a 1522; …, desde 0000 ao nº 1050 e ss; …, desde o nº 1051 ao 2525 lado A e nº 2524 ao 0000 do lado B, e cassete nº 2 do lado A 0000 a 0437; …, desde o nº 0438 ao nº 2015 do lado A da cassete nº 2; …, desde o nº 0000 ao n° 2456, lado A, na 2457 a 2523, do lado A e n° 2522 ao n° 1755 do lado B; …, desde o n° 1754 ao 0000 do lado B e cassete n° 2, lado A 0000 ao 0012; …, desde o n° 0013 ao 1929 da cassete nº 2, lado A; …, desde o nº 1930 ao 2527 da cassete nº 2 do lado A e do n° 2526 ao n° 1565 da cassete n° 2, lado B; …, n° 1564 ao n° 0000 da cassete n° 2 do lado B e do n° 0000 ao n° 410 da cassete n° 3 do lado A; …, desde o n° 0000 ao n° 0989 do lado A; …, gravado desde o n° 0989 até ao final do lado A e desde o n° 2600 até ao nº 2303 do lado B; …, desde o n° 2302 até ao final do lado B; … desde o n° 0000 ao n° 0305 do lado A, …, desde o nº 0305 até ao final do lado A e desde o nº 2600 até ao n° 1719 do lado B; …, desde o n° 1211 até ao final do lado B e desde o n° 0000 até ao n° 0988 do lado A, tudo conforme documentado em acta.

IX Ter o Tribunal A Quo ainda escolhido, a pena de prisão, e em moldura concreta que se situa em quase um terço da abstracta, mesmo que a realidade dos factos tivesse sido a descrita na sentença, mostra violado o disposto no art. 70° e 40° n° 1 do Código Penal, por excessivo, pois, não se trataria de uma violação de cuidado consubstanciada num absoluto descontrolo de velocidade, de manobras perigosas, de condução sob influência do álcool, mais, e está em causa um homem, com 70 anos de idade, com irrepreensível passado do ponto de vista criminal, contra-ordenacional ou mesmo social.

X A aplicação da inibição de condução, que de verdadeira pena se trata, quando é ela já imputada a título de causa...

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