Acórdão nº 120/12.9YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção do contencioso no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, Juíza de Direito colocada como auxiliar no Círculo Judicial de Vila Nova de Famalicão vem, nos termos dos artigos 168° a 172° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (E.M.J.), 59° do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas (E.D.T.Q.E.F.P.), aprovado pela Lei n° 58/2008, de 9 de Setembro e dos artigos 50° a 65° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (C.P.T.A.), interpor recurso contencioso da deliberação do plenário do Conselho Superior da Magistratura de 11 de Setembro de 2012 que decidiu julgar improcedente a reclamação apresentada pela recorrente, mantendo inalterado o teor da deliberação do Conselho Permanente de 05/06/2012.

Fundamenta o recurso dizendo que com data de 29/04/2011, foi elaborado relatório inspetivo ao serviço que a Recorrente prestou no 2° Juízo do Tribunal de Guimarães, na 2ª Vara Mista de Guimarães, em regime de acumulação de funções e no Circulo de Vila Nova de Famalicão, no período compreendido entre 17/09/2003 e 25/01/2011, data em que se iniciou a inspeção, propondo a classificação de Muito Bom.

No ponto 4.2. do relatório inspetivo, a propósito do pretérito disciplinar da Recorrente, consigna-se: "Tem pendente um processo disciplinar, instaurado em 16/11/2010", reportando-se ao PD n° 333/2010, único que até então havia sido instaurado à Recorrente.

Por deliberação do Conselho Permanente Extraordinário do C.S.M., de 31/05/2011 e face à inspecção judicial a que fora submetida, foi deliberado "proceder apenas à apreciação da proposta de classificação apresentada pelo Exm° Inspetor Judicial Dr. BB, após ser proferida decisão final nos dois processos disciplinares (n°s 333/2010 e 2011- 179/PD) em que a Exmª Srª Juíza de Direito é arguida, uma vez que o desfecho dos mesmos poderá vir a ser relevante para a apreciação dos itens classificativos capacidade para o exercício da função e idoneidade, nos termos em que o prevê o art. 34º/1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, com a classificação constante do art. 13° do Regulamento das Inspeções Judiciais".

Recorrente interpôs recurso hierárquico impróprio do teor da deliberação do Conselho Permanente de 31/05/2011, que decidiu suspender a homologação da proposta de Muito Bom, invocando vícios de erro nos pressupostos de facto e de direito, vício de fundamentação, nulidade da deliberação por falta de audiência prévia e a manifesta do ato a impugnar. Alertando para o facto de só o processo n° 333/2010 estar integrado no horizonte do período inspectivo e, por isso, só ele poder influir na atribuição da notação de temporal mérito.

Por deliberação do Conselho Plenário do C.S.M. de 20/09/2011, foi decidido julgar improcedente a reclamação apresentada e manter a deliberação que decidiu sustar o processo classificativo da recorrente, aí se sustentando que "(...) a suspensão do procedimento classificativo foi bem ordenada as conclusões tiradas pela impugnante quanto à irrelevância de um dos procedimentos e à não abrangência temporal do outro apenas pedem ganhar relevância em momento posterior".

Desta última deliberação não foi interposto recurso contencioso.

Cerca de um ano volvido sobre a suspensão do seu processo inspetivo, foi a recorrente notificada, em cumprimento do teor da deliberação do Conselho Permanente do CSM de 24/04/2012, "(...) de que os presentes autos inspectivos iriam à distribuição e para, no prazo de 10 dias, dizer o que se lhe oferecer por conveniente, uma vez que, face às penas disciplinares aplicadas nos processos disciplinares n°s 333/2010, 2011/179/PD e 269/2011/PD, pode ser ponderada a hipótese da não homologação — e consequente atribuição de nota inferior — da nota proposta pelo Exm° Inspetor".

Ouvida em sede de audiência prévia, a recorrente insistiu no vício de falta de fundamentação, sustentando que os processos disciplinares n°s 179/2011 e 269/2011 estavam fora do horizonte temporal a que a inspeção respeita e que a cessação da suspensão antes do trânsito em julgado das penas aplicadas naqueles processos violava o direito fundamental à presunção de inocência.

Pugnando pela homologação da sua proposta de classificação ou, na pior das hipóteses, pela manutenção da suspensão do processo inspetivo até ao trânsito em julgado da decisão final a proferir no PD. n° 333/2010, único que se integra no horizonte temporal do período inspectivo e cujo desfecho poderá nele influir.

Foi ainda remetido ao CSM um requerimento de reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades, no âmbito do qual foram formuladas 5 questões de direito susceptíveis de influir na decisão final anunciada no projeto.

Por deliberação do Conselho Permanente do C.S.M. de 05/06/2012, foi decidido indeferir o pedido de reenvio prejudicial, julgar improcedente a arguição do vício da deliberação do Conselho Permanente de 24/04/2012 e determinar o alargamento do objecto da presente inspeção de modo que, em complemento, abranja também o período compreendido entre 25 de Janeiro de 2011 e 31 de Dezembro de 2011.

Mais se determinou que o Ex.mo Sr. Inspector elabore Relatório Complementar em conformidade com o ora deliberado.

Nessa deliberação acabou por se reconhecer o que há muito tempo parecia óbvio à Recorrente: que apenas os factos considerados no processo disciplinar n° 333/2010 ocorreram no período considerado no presente processo inspetivo e que, atento o disposto no art. 15° do RIJ, à partida apenas este processo poderia ser aqui considerado.

Sustenta-se, no entanto, que a nota a atribuir não pode deixar de refletir os restantes factos, atenta a sua, pelo menos aparente, gravidade e possível reflexo na imagem global da prestação a avaliar.

Razão pela qual se determina o alargamento do objecto do processo inspetivo, passando a abranger também o período compreendido entre 25 de Janeiro de 2011 e 31 de Dezembro de 2011.

Desta deliberação de 05/06/2012 foi interposto Recurso hierárquico impróprio, tendo sido invocados os vício de desvio de fim, de violação de lei por preterição do princípio da boa fé, de erro quanto aos pressupostos de facto e de direito e de forma por falta de fundamentação, de ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais - direito constitucional da presunção de inocência e da proibição de dupla valoração sancionatória, in idem" - do segmento em que determina que o inspetor elabore relatório em conformidade com o decidido.

Por deliberação do Plenário do C.S.M. de 11/09/2012 foi julgada improcedente a reclamação, mantendo-se inalterada a deliberação do Conselho Permanente de 05/06/2012.

Nessa deliberação considera-se que não é despicienda a questão colocada pela recorrente no que respeita à violação do direito fundamental da presunção de inocência, posto que ainda não estão transitadas as condenações disciplinares que o Órgão de Gestão e Disciplina se propôs considerar para efeitos de atribuição da notação de mérito à Recorrente.

Sustenta-se, todavia, que a questão só pode ser colocada num momento posterior: "Quando for elaborado relatório complementar será então expresso o entendimento do Exm° Inspector Judicial quanto ao relevo que retira de tais condenações, não obstante o estado das mesmas, por ora não transitado. A Exm.a Juíza será dada oportunidade de se pronunciar e o Conselho Superior da Magistratura, então, será chamado a decidir sobre o peso das condenações para efeitos inspetivos sendo-lhe legítimo até concluir que não o poderá fazer pois as mesmas ainda não estarão transitadas. Será uma ponte a atravessar em momento próprio, ou seja quando chegarmos a tal rio".

É desta deliberação que vem interposto o presente recurso.

II. Dos fundamentos de Direito do presente recurso contencioso: A) DO VÍCIO DE DESVIO DE FIM: O ato administrativo consubstanciado na deliberação impugnada enferma do vício de desvio de fim, sendo por isso nulo.

Por deliberação do Conselho Permanente de 31/05/2011 foi deliberado: "proceder apenas à apreciação proposta de classificação apresentada pelo Exmo Inspetor Judicial Dr. BB após ser proferida decisão final nos dois processos disciplinares (n°s 333/2010) e 2011-179/PD) em que a Exma Sra Juíza de direito é arguida, uma vez que o desfecho dos mesmos poderá vir a ser relevante para a apreciação dos itens classificativos capacidade para o exercício da função e idoneidade, nos termos em que o prevê o art. 34/1 do Estatuto dos Magistrados Judicias, com a densificação constante do art. 13° do Regulamento das Inspeções Judiciais.

O relatório inspectivo teve por objecto a avaliação do mérito da Recorrente, no que respeita ao serviço pela mesma prestado no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, na 2º Vara Mista do Tribunal Judicial da Comarca Guimarães - em regime de acumulação de funções - e no Tribunal do Círculo Judicial de Vila Nova de Famalicão.

A referida inspeção abrangeu o período compreendido entre 16/09/2003 e 25/01/2011, data em que teve início a presente inspeção.

Ou seja, a presente inspeção teve por objecto mais de sete anos de serviço.

Nesse relatório é proposta a notação de Muito Bom, com impressivos fundamentos.

Ao cabo de mais de um ano de suspensão do processo inspectivo foi a Recorrente notificada, para efeitos de audiência prévia, do projeto de decisão no sentido de remeter os autos à distribuição (o que supõe que a entidade administrativa tenha considerado cessada a suspensão do processo inspectivo), e do propósito de decisão de não homologação daquela proposta de notação e consequente atribuição de notação inferior à proposta.

Projeto esse que aludia às penas disciplinares aplicadas em todos os processos entretanto instaurados à Recorrente - PD. n° 333/2010, 179/2011 e 269/2011 - e não já apenas às aplicadas nos dois processos disciplinares que determinaram a suspensão do processo inspectivo - e muito embora só o PD. n° 333/2010 estivesse integrado no horizonte temporal do período inspetivo.

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