Acórdão nº 44/18.6YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução21 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (Secção do Contencioso) ([1]): I - Relatório 1.

A Associação Sindical dos Juízes Portugueses, na qualidade de representante dos juízes seus associados, intentou esta acção administrativa de impugnação contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM), pedindo que seja declarada nula ou, pelo menos, anulada a deliberação deste de 10-05-2018, no âmbito do Movimento Judicial Ordinário de 2018, concretizada na parte constante do ponto n.º 19 do Aviso (extrato) n.º 6475-A/20018, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 15.05.2018, págs. 13738‑(2) a 13738-(7), por violação dos princípios constitucionais da protecção da confiança, da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da colaboração da Administração com os particulares e por violação do n.º 5 do artigo 183.º da LOSJ.

  1. O R contestou, concluindo pela improcedência da impugnação.

  2. Cumprido o disposto no art. 176.º, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ) ([2]), a A apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões (sic): «(1ª) Atenta a natureza do procedimento em causa, todos os requisitos/condições de candidatura ao MJO2018 deveriam constar ab initio do Aviso, não sendo o mesmo suscetível de posteriores alterações quanto aos seus termos/condições; (2.ª) E tal era exigido ao R. tal como aliás o mesmo sublinha em sede de contestação, uma vez que admite que a inerente alteração ao Aviso do movimento é um aperfeiçoamento do sistema no que concerne as alterações introduzidas relativas à admissibilidade de requerimento de apresentação a movimento condicional e a concessão de prazo suplementar de desistência, relativamente ao MJO2017; (3.ª) Considerando a experiência do sucedido nos processos judiciais nº 43/17.5YFLSB, 45/17.1YFLSB, 46/17.0YFLSB, 47/17.8YFLSB e 78/17.8YFLSB, deveria ter o R., aquando da abertura do MJO2018, acautelado no respetivo Aviso todas as condições/requisitos tal como se lhe exige enquanto órgão que tem inerente a responsabilidade pela realização do procedimento referente aos Movimentos Judiciais e aqui em particular ao MJO2018; (4.ª) Sendo essa exigência maior e mais perene exatamente pelo ocorrido no MJO2017 em que muitos dos Magistrados viram-se confrontados com uma notação à qual foi atribuído um efeito desfavorável – a imediata vacatura do lugar – sem que lhes tivesse sido permitido oporem-se eficazmente, exatamente porque, no momento em que apresentaram requerimento, porque não sabiam – nem tinham de saber – que a sua notação iria baixar, e não podiam fazê-lo depois porque ao apresentarem requerimento, isso implicava – como implicou – a imediata transferência para o lugar escolhido, esgotando-se os efeitos da consequência da baixa de classificação.

    (5.ª) Ao não fazê-lo violou o R. os princípios da proteção da confiança, da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da colaboração da Administração com os particulares sede de petição inicial, para onde se remete; (6.ª) Mas, ainda que se admita por mera hipótese académica que o Aviso pudesse ser alterado, como veio, a suceder pela inerente alteração ao Aviso do movimento, entende-se que, ainda assim, a mesma é ilegal por violação dos referidos princípios da proteção da confiança, da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da colaboração da Administração com os particulares constitucionalmente consagrados; (7.ª) Assim, se é certo que a mesma foi publicada no site do R. um dia antes do término do prazo para apresentação das candidaturas, é também certo e inequívoco que não foi publicada em Diário da República; (8.ª) Ao não ter sido publicada em Diário da República a inerente alteração ao Aviso do movimento violou-se os princípios da proteção da confiança legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da colaboração da Administração com os particulares constitucionalmente consagrados; (9.ª) E o mesmo se diga para o facto de ao ter sido publicada no penúltimo dia do término do prazo para apresentação dos requerimentos (31.05.2018), não acautelar todas aquelas situações em que os Magistrados já haviam entregue os respetivos requerimentos – nem nada é referido na inerente alteração ao Aviso do movimento quanto a este aspeto; (10.ª) Destarte, com o procedimento adotado pelo R., que o mesmo considera ser válvulas do sistema (cf. 39° da contestação), foram criados, no fundo, e no penúltimo dia do prazo, dois procedimentos sem que inicialmente tal estivesse previsto no Aviso, os quais, pelo menos em abstrato consagram desigualdades entre os Magistrados, violando os supramencionados princípios constitucionais.

    (11.ª) É que, independentemente de poderem concretamente serem ou não afetados os eventuais Magistrados ao MJO2018, o que é certo é que em abstrato tal possibilidade existe, o que basta para a violação dos referidos princípios constitucionais, os quais não pressupõem uma concreta violação dos mesmos, antes se bastando com essa possibilidade.

    (12.ª) Por outro lado, a admitir-se como legalmente possível a inerente alteração ao Aviso do movimento tal implica, salvo melhor opinião, que se esteja a admitir que, relativamente ao MJO2017, o modo de atuação do R. foi ilegal, pois que aquando da publicação do Aviso em Diário da República referente ao MJO2017 não foram criadas quaisquer válvulas do sistema, de que são exemplo os processos referidos peio R. no artigo 34º da contestação, processos nºs 43/17.5YFLSB, 45/17.1YFLSB, 46/17.0YFLSB, 47/17.8YFLSB e 78/17.8YFLSB, em que foram as ações foram julgadas improcedentes, não tendo sido reconhecidas quaisquer ilegalidades ao MJO2017; (13.ª) Na verdade, atentos os referidos princípios da proteção da confiança, da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da colaboração da Administração com os particulares constitucionalmente consagrados, as condições/requisitos dos Movimentos Judiciais, no caso, de 2017 e 2018, devem ser iguais sob pena de violação dos mesmos; (14.ª) De facto, a admitir-se as válvulas do sistema do MJO2018, não existindo paralelo no regime procedimental do MJO2017, estamos, pelo menos assim se julga, numa manifesta e evidente violação dos supra citados princípios constitucionais, com prejuízo efetivo e real de todos aqueles Magistrados do MJO2017, que não puderam beneficiar de quaisquer válvulas do sistema (até então inexistentes), e o mesmo se diga em relação aos Magistrados do MJO de 2018 que à data de 30.05.2018 (publicação no site do R. da inerente alteração ao Aviso do movimento) que já haviam apresentado os seus requerimentos e com eles estavam conformados; (15.ª) No que respeita à não conformidade de atuação do R. com o disposto no n.º 5 do artigo 183ª da LOSJ, mormente quanto ao facto de o mesmo considerar que, a perda de requisitos por efeito da baixa de notação, tem aplicação no Movimento Judicial em curso/ presente e não, como refere o citado preceito legal no movimento judicial seguinte, reiterando‑se o já referido em sede de petição inicial, acrescenta-se que sendo certo que se trata de uma coincidência anual, tal não significa que os efeitos visados pelo n.º 5 do artigo 183º da LOSJ tenham aplicação imediata, isto é, no Movimento Judicial em curso, senão que devem ter no Movimento Judicial seguinte.

    (16.ª) Não é o facto de haver coincidência anual que torna ilegal o vertido no n.º 5 do artigo 183° da LOSJ tal como se encontra atualmente consagrado. O que é, isso sim, ilegal e também inconstitucional é a interpretação que o R. faz do disposto no n.º 5 do artigo 183.º da LOSJ.

    (17.ª) Com efeito, determina expressamente o artigo 183.º, n°5, da LOSJ, que a perda dos requisitos exigidos pelos n.ºs 1 e determina que o lugar seja posto a concurso no movimento judicial seguinte.

    (18.ª) Face à redação da norma jurídica em apreço dúvidas não há de que a perda dos requisitos determina que o lugar do respetivo Magistrado é colocado a concurso no Movimento judicial seguinte, o que é bem diferente de dizer, por hipótese, "Movimento Judicial em curso"; (19.ª) Ora, como resulta expressamente consagrado na jurisprudência atentas as regras da interpretação jurídica, o elemento gramatical é o primeiro e principal ponto de partida na interpretação da lei (cf. artigo 9.º do Código Civil), pelo que o intérprete deve, pois, presumir que o legislador soube consagrar na lei o seu pensamento e não pode retirar do elemento literal aquilo que lá não consta. Se o intérprete não pode fazer uma interpretação contrária à letra da lei também não pode retirar da lei os termos que lá constam. Por outras palavras, onde o legislador não distingue não cabe ao intérprete distinguir. A não ser assim, estar-se-ia a desvirtuar o sentido e alcance da lei e até a criar novas normas, totalmente divergentes das que estão em vigor e foram devidamente aprovadas (neste sentido, vide, entre outros, Ac. do STJ n.º 5/2016, publicado em Diário da República, Iª série - N.º 54-17 de março de 2016); (20.ª) Deste modo, atento a redação do normativo em apreço outro sentido não pode ser extraído do mesmo do que aquele expresso na letra da norma pelo legislador que se refere ao Movimento Judicial seguinte e não ao Movimento Judicial em curso, sendo certo que por Movimento Judicial seguinte entende-se aquele que seja aberto no ano seguinte ao da perda dos requisitos; (21.ª) Caso assim não fosse este o único sentido e alcance do n° 5 do artigo 183.º da LOSJ, ou seja, que a perda de requisitos opera efeitos no Movimento judicial seguinte, colocar-se-ia, também, em causa as garantias de impugnação que assistem aos administrados, no caso, Magistrados de impugnarem judicialmente, quer em ação principal, quer em ação cautelar (cf. artigos 168º e seguintes do EMJ) as respetivas notações, atenta a coincidência anual do Movimento Judicial com a deliberação ou homologação das notações; (22.ª) A prática reiterada de sentido contrário à lei...

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