Acórdão nº 0654/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução06 de Novembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO 1.1. A……, solteiro, residente na Rua ……, nº ……, ……, 1350 – …… Lisboa, intentou a presente acção administrativa especial contra a Presidência do Conselho de Ministros e o Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qual impugnou os seguintes actos:

  1. Promoção do Ministro Plenipotenciário de 1ª classe B…… à categoria de Embaixador, publicada pelo Decreto nº 8/2001, de 7 de Abril, emitido pela Presidência do Conselho de Ministros e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, datado de 7 de Abril e publicado no Diário da República, 1ª Série, nº 69, de 7 de Abril de 2011; b) Promoção do Ministro Plenipotenciário de 1ª classe C…… à categoria de Embaixador, publicada pelo Decreto nº 9/2011, de 6 de Dezembro, emitido pela Presidência do Conselho de Ministros e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, datado de 7 de Abril e publicado no Diário da República, 1ª Série, nº 69, de 7 de Abril de 2011.

    Indicou como contra – interessados os nomeados embaixadores.

    Na petição inicial pediu a anulação dos actos impugnados por enfermarem: (i) de vício de forma por falta de fundamentação; (ii) de desvio de poder; (iii) de violação de lei; (iv) violação dos princípios constitucionais da igualdade e da imparcialidade.

    1.2. Ambos os Réus contestaram defendendo-se por excepção e por impugnação.

    1.3 Os contra – interessados não contestaram.

    1.4. O Exmº Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do art. 85º do CPTA, pronunciou-se, nos seguintes termos: “Na presente acção administrativa especial o Autor, Ministro Plenipotenciário, vem requerer a anulação dos actos de promoção a embaixador dos Ministros Plenipotenciários B…… e C…….

    Invoca que os referidos actos enfermam dos seguintes vícios: - falta de fundamentação; - desvio do poder; - violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.

    1. Afigura-se-nos que assiste razão ao Autor no que concerne à necessidade de fundamentação dos actos em causa e consequente violação do disposto no art. 124º do CPA, dada a falta da mesma.

      Com efeito, de acordo com o art. 20º do Dec-Lei nº 40-A/98, de 27.2, que contém o Estatuto da Carreira Diplomática, «1. O acesso à categoria de embaixador é aberto a todos os ministros plenipotenciários que tiverem cumprido quatro anos de serviço na respectiva categoria e um mínimo de oito anos nos serviços externos.

      2 – As promoções são realizadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, com base na apreciação das qualidades do funcionário e dois serviços prestados, ouvido o Secretário – Geral, e só podem ter lugar quando se verifique a existência de vagas na categoria» De acordo com o disposto no art. 24º, nº 2, do Dec-Lei nº 204/2006, de 27.10, «a promoção a embaixador é efectuada por decreto, nos termos da Constituição e da lei».

      Como o Autor reconhece, os actos impugnados, sem prejuízo dos requisitos vinculativos, foram praticados ao abrigo de um poder discricionário.

      Contudo, tal como tem vindo a ser entendido pela doutrina e pela jurisprudência (já citadas nos autos nos actos praticados no exercício de poder discricionário o dever de fundamentação impõe-se ainda com maior acuidade.

      A margem de livre apreciação que é concedida à Administração está condicionada pelos princípios de vinculação ao fim, imparcialidade e proporcionalidade, o que significa que, nestas áreas, a actuação administrativa poderá ser contenciosamente sindicada com fundamento na ofensa destes limites

      (Ac. de 28.5.1997, P. 39169).

      Porque os actos impugnados se não encontram fundamentados deverão estes ser anulados (arts. 124º e 135º do CPA).

      2- Dos autos não resulta que tenha existido desvio de poder.

      A prova da sua existência impendia sobre o Autor (cfr. Ac. de 28.01.2004, P. 045631).

      3 – Considerando que os actos impugnados se não encontram fundamentados, encontra-se prejudicada a apreciação da alegada vinculação dos princípios da igualdade e da impugnabilidade.

      Face ao exposto, somos de parecer que a acção deverá ser julgada procedente” 1.5. A fls. 165- 168 foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as questões prévias suscitadas e, por não haver matéria de facto controvertida com relevo para a decisão da causa, ordenou a notificação das partes para apresentarem alegações, querendo, nos termos do art. 91º/4 do CPTA.

      1.6. O Autor apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1. Através da presente Acção Administrativa Especial, o Autor impugnou o Decreto n.º 8/2011 e Decreto n.º 9/2011.

    2. Atento o que foi expendido na Petição Inicial e nas Contestações apresentadas pelos Réus - o que aqui se considera integralmente reproduzido para os devidos efeitos - ficou provado que os Actos de promoção que aqui se impugnam padecem de vícios formais e materiais e ainda de inconstitucionalidade, pelo que os mesmos devem ser anulados, com todas as consequências legais daí resultantes.

    3. Conforme expressamente reconhecido pelos Réus, os Actos impugnados não foram fundamentados nos termos exigidos por lei.

    4. Assim, aqueles Actos não apresentam qualquer motivação que justifique a escolha de cada um dos diplomatas promovidos à categoria de Embaixador, escolha esta feita em detrimento da promoção de outros diplomatas que preenchiam (também eles) os requisitos vinculativos exigidos para o efeito (cfr. Art. 20.° do Decreto-Lei n.º 40-A/98 - diploma que estabelece o Estatuto da Carreira Diplomática).

    5. Ora, o facto de os Actos impugnados terem sido praticados ao abrigo de um poder discricionário (cfr. Artigo 20.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 40-A/98), não exclui o imperativo legal de fundamentação dos mesmos, ao contrário do que é alegado pelos Réus.

    6. Não colhe igualmente o argumento apresentado pelos Réus de que os Actos impugnados se assumem como "actos de alta administração”, praticados no exercício da função política e que, como tal, não só não necessitariam de ser fundamentados, como seriam insusceptíveis de controlo pela jurisdição administrativa.

    7. Com efeito, os Actos impugnados não se assumem como "actos de alta administração equiparados a actos políticos”, sendo ao invés, actos administrativos que se abrigam "no artigo 199.º, e) da Constituição, ou seja, são emitidos no quadro da competência do Governo no exercício de funções administrativas, em particular em matéria de funcionalismo do Estado, conforme decidido no Despacho proferido por esse Douto Tribunal.

    8. Assim, cumpre concluir que os Actos administrativos impugnados foram praticados em violação do dever de fundamentação, expressamente consagrado no Artigo 268.°, n.º 3 da CRP e nos Artigos 123.° e 124.°, n.º 1, alínea a), ambos do CPA.

    9. Pelo que devem os Actos administrativos impugnados ser anulados, nos termos gerais (cfr. Artigo 135.° do CPA).

    10. Ademais, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, ao promover à categoria de Embaixador os então Ministros Plenipotenciários B……. e C……, não atendeu ao fim expressamente consignado no Artigo 20.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 40-A/98.

    11. Com efeito, aquela norma pretende que sejam promovidos à categoria de Embaixador apenas os diplomatas que, tendo uma longa carreira de empenho e dedicação ao serviço do país, possuam experiência comprovada e as capacidades necessárias ao exercício de funções naquela categoria.

    12. Ora, conforme demonstrado pelo Autor, o Ministro não promoveu os diplomatas reveladores de mais experiência e mérito, "atropelando" indiscriminadamente diplomatas que se encontravam mais bem posicionados para tal promoção − como o Autor − e promovendo outros.

    13. Assim, ao prosseguirem fins alheios aos fins expressamente definidos no Artigo 20.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 40-A/98, os Actos impugnados assumem-se como decisões arbitrárias e não como decisões discricionárias.

    14. Existindo, assim, uma discrepância entre o fim legal e o fim real do Acto praticado, os Actos impugnados enfermam do vício de desvio de poder, devendo os mesmos ser anulados nos termos gerais (cfr. Artigo 135.° CPA).

    15. Acresce que, apesar da ampla margem de discricionariedade conferida pela lei, o exercício do poder de promoção à categoria de Embaixador (pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros) encontra-se sempre vinculado pelos princípios gerais que delimitam a actuação dos órgãos da Administração.

    16. Assim, ao determinar a promoção daqueles Ministros Plenipotenciários em detrimento de outros diplomatas que cumpriam (também eles) os requisitos vinculativos previstos por lei, o Ministro atentou contra o Princípio da igualdade e contra o Princípio da imparcialidade, expressamente consagrados no Artigo 266.° da CRP e nos Artigos 5.° e 6.° do CPA.

    17. A violação destes princípios é geradora de anulabilidade nos termos gerais previstos por lei.

      Nestes termos e nos mais de Direito, e sempre com o Mui douto suprimento de V.Exa., deverá a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, serem os Actos administrativos aqui impugnados anulados, por enfermarem de vício de forma por falta de fundamentação e dos vícios materiais de desvio de poder e de violação de lei, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da imparcialidade, tudo com as demais e legais consequências.

      Mais deverão ser as entidades demandadas condenadas em custas e procuradoria condigna.» 1.7. A Presidência do Conselho de Ministros, através Primeiro – Ministro, contra – alegou, concluindo: A ) Face ao disposto conjugadamente nos artigos 2º, 3º, nº 1, alínea a), 4º, 17º e 20º do Decreto-Lei nº 40-A/98, o acto de promoção a embaixador insere-se num procedimento especial; B) Na verdade, e diversamente daquilo que se passa com as restantes categorias do pessoal da carreira diplomática – v. g., os ministros plenipotenciários, cujo mérito é apreciado pelo conselho diplomático, devendo a proposta de promoção ser objecto de fundamentação (cfr. artigo 19.°, n.° 4, do mencionado diploma legal) —, o acesso à categoria de embaixador faz-se por livre escolha do...

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