Acórdão nº 117/11.6TTFUN.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução10 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO I.1 No Tribunal do Trabalho do Funchal, AA, através da apresentação de formulário próprio, intentou contra “BB, Lda”, a presente acção declarativa de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com processo especial, emergente de contrato individual de trabalho, pedindo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do despedimento com as legais consequências.

Foi realizada audiência de partes, mas sem que tenha sido alcançada a conciliação das mesmas.

Notificada para apresentar o seu articulado motivando o despedimento, a entidade empregadora veio a fazê-lo, alegando os factos da nota de culpa, para sustentar que a conduta da Autora constitui justa causa de despedimento nos termos das alíneas e) e i) do art.º 351º do Código do Trabalho em vigor.

No essencial, os factos imputados na nota de culpa e alegados, consistem no seguinte: - A A. foi admitida ao seu serviço a autora, a 01 de Fevereiro de 2006, com a categoria profissional de "Empregada de Balcão”, recebendo o salário líquido de 514,76€.

- Em 21 de Junho de 2010 a ré, a pedido da autora, para esta poder obter um empréstimo bancário no âmbito da sua vida pessoal e familiar e para fins exclusivos de apresentação a uma entidade bancária, procedeu ao preenchimento de uma Declaração, nela mencionando que aquela auferia mensalmente 650,00€.

- A Ré acedeu ao pedido tendo em atenção a necessidade manifestada e de acordo com os fins a que aquela se propunha.

- Contudo, no início do 4°trimestre do ano de 2010, a autora, ao contrário do solicitado, direccionou aquela declaração para um fim completamente contrário à vontade manifestada pelo pedido, indo participar à Inspecção Regional do Trabalho, para reclamar da sua categoria profissional e no sentido de estar a auferir um valor inferior aos 650,00 € mensais.

- Pela IRT foi iniciado processo contra-ordenacional contra si, no qual apresentou defesa expondo as suas razões, as quais não foram atendidas, tendo sido considerado o valor constante daquele documento e proferiu decisão condenatória.

- O comportamento da trabalhadora, para além de injurioso para com a sua entidade patronal e à pessoa do seu sócio gerente, é extremamente grave, pondo em causa o vinculo laboral, nomeadamente, quanto aos princípios da responsabilidade, da confiança, da lealdade, da boa fé contratual e lesão dos interesses patrimoniais, de entre outros.

Conclui, pedindo que se declare a improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.

A autora contestou, no essencial alegando o seguinte: - Aufere a retribuição base de € 546,47.

- Como afirmou na resposta à nota de culpa solicitou a emissão pela Ré da referida declaração, sendo a mesma de facto necessária e utilizada para efeitos de pedido de empréstimo bancário.

- Jamais foi utilizada para outros fins, designadamente os indicados pela Ré.

- A queixa junto da Inspecção Regional de Trabalho, surgiu por outras razões e já no final do ano, ou seja, a Autora foi reivindicar a sua actualização ao nível da categoria profissional, e consequentemente o aumento da sua retribuição.

- A atitude da Ré é ilegítima e ilegal, uma vez que nenhum trabalhador pode ser penalizado pelo facto de reivindicar os seus direitos laborais.

- A Autora não violou qualquer dever, que ponha em causa a subsistência do seu vínculo laboral.

Conclui, reiterando o pedido de declaração de ilicitude do despedimento e a condenação da R. no pagamento das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até á decisão final transitada em julgado, reservando-se no direito de opção previsto no art.º 391.º do CT.

I.2 Concluída a fase dos articulados foi proferido despacho saneador e dispensada a selecção da matéria de facto.

Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, tendo o Tribunal fixado a matéria de facto, que não sofreu reclamação.

Nessa sede, a Autora optou pela reintegração.

O Senhor Juiz a quo, ao abrigo do disposto no art.º 265.º, n.º 3 do C.P.C., determinou a junção aos autos de cópia certificada da participação que deu origem ao procedimento administrativo n.º ...-CO/2010, a que corresponde o processo de recurso de contra-ordenaçâo n.º.../11.6TTFUN, a correr termos no mesmo Tribunal, bem como cópia da decisão administrativa e decisão judicial que sobre o mesmo recurso recaiu.

Subsequentemente foi proferida sentença, nos termos seguintes: - “Nestes termos e com tais fundamentos, decide este tribunal julgar a presente acção totalmente improcedente e, em consequência: A) – Declarar lícito o despedimento promovido pela Ré, por procedência da justa causa invocada.

  1. – Absolver a Ré dos créditos laborais peticionados.

I.3 Inconformado com essa decisão, a A. apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito próprios.

Com as alegações a recorrente apresentou as respectivas alegações, delas constando o seguinte: (…) I.4 Não foram apresentadas contra-alegações.

I.5 O ilustre magistrado do Ministério Público proferiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Notificadas as partes para se pronunciarem sobre o mesmo, nada vieram dizer.

I.6 Foram colhidos os vistos legais.

I.6 Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 685.º-A e 684.º n.º 3 e artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil), a questão que se coloca para apreciação é a de saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento, ao considerar verificada a justa causa de despedimento invocada pela R.

  1. FUNDAMENTAÇÃO II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO Na decisão recorrida, consideraram-se assentes os factos adiante descritos, que não foram impugnados pela recorrente, aos quais, por nossa iniciativa, na parte onde se remete para documentos, dando-os por reproduzidos, completaremos com a concretização das partes relevantes.

Assim, a matéria de facto a considerar é a seguinte: 1. A Ré tem a sua actividade na área dos similares de hotelaria e é proprietária de um estabelecimento comercial, denominado Padaria e Pastelaria “CC”.

  1. A Autora foi admitida ao serviço da Ré em 01 de Fevereiro de 2006, com a categoria profissional de “Empregada de Balcão de 2ª”.

  2. Elaborada a nota de culpa foi a Autora notificada da mesma, mediante carta expedida por correio registado a 17.01.2011, com o correspondente código de barras RC 5084 7660 2 PT e recebida no dia 20.01.2011, tendo comunicado a sua intenção de proceder ao seu despedimento com justa causa, com base nos fundamentos indicados na nota de culpa, que se encontra junta a fls.46 a 50 e cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido, onde consta, para além do mais, o seguinte: - «(..) "BB, LDA.", representada pelo seu sócio gerente, DD, (..) foi notificada, em finais de 2010, de um Auto de Contra-Ordenação, Proc. nº ...-CO/2010, que corre termos pela Inspecção Regional de Trabalho, da Secretaria Regional dos Recursos Humanos, Governo Regional, desta Região Autónoma da Madeira, (4°) em que, junto ao articulado daquela Inspecção, foi anexado uma Declaração, (5º) conforme cópia que se junta em anexo à presente Nota de Culpa e que se dá por integralmente reproduzida para os devidos e legais efeitos, (6°) Declaração essa que, a pedido da trabalhadora, (7°) por razões que se prendiam com um pedido de empréstimo bancário, (8°) para ultrapassar situações da sua vida pessoal e familiar, (9º) ao que a sua entidade patronal acedeu, (10º) tendo presente o facto de que sem essa Declaração, ser-lhe-ia muito difícil obter a satisfação do seu pedido, (11°) uma vez que o seu salário ilíquido são de 456,08 € que, deduzidos os respectivos descontos, ficam em 405,91 €, (..) (13°) Ora, o que se verificou foi que a trabalhadora, munida dessa Declaração, (14°) desvirtuando completamente o sentido e a vontade real manifestada naquela, (15°) queixou-se à Inspecção de Trabalho, (..) (19°) Esta atitude e comportamento da trabalhadora, para além de injuriosas para com a sua entidade patronal e a pessoa do seu sócio gerente, são por si só extremamente graves, (20°) que põem em causa claramente o vínculo laboral, nomeadamente, quanto aos princípios da responsabilidade, da confiança, da lealdade, da boa fé contratual, lesão dos interesses patrimoniais, de entre outros, (..

    ) (23°) Assim, com aquele comportamento, a trabalhadora em causa na presente Nota de Culpa, de forma premeditada e perversa, (24°) engendrou maneira de extorquir valores à sua entidade patronal, superiores àqueles a que tinha e tem direito, (25°) violando um principio fundamental que é o da confiança e responsabilidade, que deve existir entre empregado e empregador, (26°) com efeitos nefastos nos restantes relacionamentos contratuais com os demais trabalhadores da mesma entidade patronal, (27°) gerando desse modo injustiças, desconfianças, instabilidade, em suma, lesão directa ao trabalho e ao patrimônio da entidade patronal.

    (28°) Ou seja, o comportamento e atitude da trabalhadora atrás descritos, configuram um incumprimento contratual grave, ilícito e culposo, constituindo infracção aos seus deveres e ao disposto nos art.°s 126° e 128°, n° 1, alínea a) e f), do Código do Trabalho que, (29°) pela sua gravidade, reiteração e consequências, quebram a relação de confiança subjacente ao contrato de trabalho, (30º) impossibilitando praticamente a subsistência do seu vínculo laboral e constituindo, desse modo, (31°) justa causa de despedimento da trabalhadora, nos termos previstos no art° 35 1°, n°1 e 2, alíneas e) e i), do Código do Trabalho».

  3. A Autora respondeu à nota de culpa, nos termos do documento de fls.57 e 58 dos autos, cujo teor se dá aqui por inteiramente reproduzido, onde consta, para além do mais, o seguinte: - (1.

    º) «É verdade que a trabalhadora arguida pediu à arguente a declaração referida.

    (2º) Acontece que, tal foi solicitado em Junho e, de facto...

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