Acórdão nº 1442/11.1TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Janeiro de 2013

Data23 Janeiro 2013
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório AA, BB e CC instauraram acção declarativa com processo comum contra Rádio e Televisão de Portugal, SA, pedindo a condenação da ré a: - atribuir a cada um dos autores a remuneração correspondente ao nível 3 C da Tabela Salarial constante do Anexo III ao Acordo Colectivo de Trabalho/Jornalistas em vigor na ré; - pagar ao autor AA a quantia de € 42 743,57, ao autor BB a quantia de €45 123,69 e ao autor CC, a quantia de € 34 234,17, acrescidas de juros de mora à taxa legal, desde o vencimento de cada prestação remuneratória em que ocorreu a diferença salarial, até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão, alegaram, em síntese, o seguinte: - trabalham sob as ordens direcção e fiscalização da ré, desde 1993, 1994 e 2001, respectivamente; - detêm actualmente a categoria profissional de “jornalista-repórter”, tendo ascendido a esta categoria no âmbito de um concurso interno em que a ré fixou como requisito que os candidatos não auferissem remuneração superior ao nível 9 da sua tabela salarial; - em 2006 todos os autores estavam enquadrados no nível de desenvolvimento II constante do Acordo Colectivo de Trabalho celebrado entre a ré e o Sindicato dos Jornalistas, e auferiam a remuneração prevista para o nível 2 A da Tabela Salarial do Anexo III do mesmo Acordo Colectivo de Trabalho; - Em Janeiro de 2006 a ré abriu concurso para a categoria de jornalista-repórter mas, desta vez, indicou como único requisito a pertença aos “quadros do grupo RTP”; - em tal concurso ficaram aprovados DD e EE com a remuneração correspondente ao nível 3A e FF, com remuneração correspondente ao nível 3C; - após terem superado as provas inerentes a tal concurso os três trabalhadores em apreço foram integrados na categoria de jornalista-repórter, mas mantiveram a remuneração que auferiam anteriormente; - tal situação faz com que exerçam funções em quantidade, género e qualidade não superior às desempenhadas pelos autores, mas aufiram remunerações superiores às que os autores recebem; - por força do princípio “para trabalho igual, salário igual” os autores têm direito a auferir remuneração correspondente ao nível 3C.

Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação da ré para contestar, o que ela fez, concluindo pela improcedência da acção com a sua absolvição.

Para tal, além de arguir a prescrição dos créditos peticionados e o abuso de direito, alegou que: - a diferença de tratamento remuneratório entre os autores e os três colegas que mencionam se justifica porque antes de se candidatarem ao concurso para acesso à categoria de jornalista-repórter os mesmos já auferiam remunerações correspondentes ao nível 3A e 3C; - a ré não podia baixar a sua retribuição por força do princípio da irredutibilidade da retribuição; - quando integrou estes trabalhadores na categoria de jornalista-repórter, lhes atribuiu o nível de desenvolvimento e o nível salarial a que correspondia a retribuição que anteriormente auferiam ou, não sendo tal possível, aquela que se achasse mais próxima da anterior remuneração, sendo certo que esta não poderia ser reduzida.

Instruída e julgada a causa foi proferida sentença julgando a acção improcedente e absolvendo a ré dos pedidos.

Inconformados, os autores vieram interpor recurso de apelação dessa decisão, tendo sintetizado a sua alegação nas seguintes conclusões: (...) A ré contra-alegou pugnando pela manutenção do julgado.

Nesta Relação, o Exmo. Magistrado do M.P. teve vista nos autos nos termos e para os efeitos do disposto no art. 87.º, nº 3 do Cód. Proc. Trab..

Colhidos os demais vistos legais cumpre apreciar e decidir.

Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente – tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis Código do Processo Civil Anotado vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156).

No caso em apreço, não existem questões que importe conhecer oficiosamente.

A única questão colocada no recurso delimitado pelas respectivas conclusões (com trânsito em julgado das questões nela não contidas) – arts. 684.º, nº 3 e 685.º-A, nº 1 do Cód. Proc. Civil – consiste em saber se os autores aqui recorrentes têm direito à retribuição base auferida pelo colega FF por aplicação do princípio “a trabalho igual salário igual”.

Fundamentação de facto Os factos materiais fixados pela 1.ª instância não foram objecto de impugnação e não se vislumbra qualquer das situações referidas no nº 4 do art. 712.º do Cód. Proc. Civil.

Por conseguinte, face ao disposto no art. 713.º, nº 6 do Cód. Proc. Civil, dá-se aqui por inteiramente reproduzida essa factualidade, sem embargo de serem discriminados, pontualmente, aqueles factos que se afigurem relevantes para a decisão do objecto do recurso.

Fundamentação de direito A 1.ª instância fez amplas e pertinentes considerações gerais sobre o princípio da igualdade, na perspectiva aqui relevante, (a salarial, a trabalho igual salário igual), que não vêm postas em causa e concitam, na generalidade, o nosso sufrágio, o que nos dispensa de mais alargadas referências e nos permite um enquadramento sintético do mesma, que passamos a fazer.

O princípio da igualdade, na perspectiva aqui relevante encontra suporte Constitucional no art. 59.º, nº1, alínea a), que concretiza, especificamente, o princípio programático proclamado no art. 13.º, nº 1 ambos da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual [t]odos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a Lei.

Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual – art. 13.º, nº 2.

Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna – art. 59.º, nº1, alínea a).

É pacificamente entendido e aceite, que o princípio da igualdade pressupõe uma igualdade material, reportada à realidade social vivida, e não uma igualdade meramente formal, massificadora e uniformizadora (Ac. do STJ de 22.4.2009, disponível em www.dgsi.pt), o que implica que se trate por igual o que é essencialmente igual e desigualmente o que é essencialmente desigual.

São exemplos lapidares disso, ao nível da jurisprudência do STJ, entre tantos outros contendo fundamentação igualmente impressiva, o Ac. do STJ nº 16/96, de 22.10.1996, (DR, I Série-A, de 4.12.1996) e, mais remotamente, referido a título apenas demonstrativo do entendimento há muito firmado no Tribunal Constitucional, o Ac. deste Tribunal nº 313/89 (“Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 13.º vol., T. II, págs. 917 e segs.), em cujos termos o que o princípio em causa proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, porque assentes designadamente em meras categorias subjectivas.

Importa reter, na parametrização do problema, enquanto corolário do princípio em causa, que a igualdade de retribuição pressupõe a prestação de trabalho de igual natureza, quantidade e qualidade, apenas sendo proscrita a diferenciação.

Isso sem embargo de a proibição postulada não abranger as situações em que trabalhadores com a mesma categoria profissional, na mesma empresa, são pagos diferentemente ante a diversa natureza, qualidade ou quantidade do trabalho prestado, em consideração nomeadamente do seu zelo, eficiência ou produtividade.

A resposta que buscamos implica, porém, deixar previamente esclarecido a quem compete o respectivo ónus da prova.

Os autores pretendem a condenação da ré a integrá-los em determinado nível salarial com efeitos desde 2006, invocando como fundamento factos ocorridos nesse mesmo ano.

Atendendo a que os factos em causa ocorreram em plena vigência do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto, que entrou em vigor no dia 1 de Dezembro de 2003, rectificado nos termos da declaração de rectificação nº 15/2003, de 28 de Outubro e alterado pela Lei nº 9/2006, de 20 de Março – art. 8.º, nº 1 daquela Lei nº 99/2003 e 7.º, nº 1 da Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro - aplica-se o regime jurídico acolhido naquele Código, a que pertencem as disposições que, de ora em diante, viermos a citar sem indicação de origem.

Integrado na Subsecção III, sob a epígrafe “Igualdade...

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