Acórdão nº 56/05.0GCPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução20 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO: No processo comum que deu origem a este recurso em separado, A..., com os demais sinais dos autos, foi condenado por acórdão do Tribunal do Círculo Judicial de Pombal de 07/12/2006, ulteriormente confirmado por Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12 de Setembro de 2007, como autor material de um crime de incêndio, p. p. pelo art. 272º, nº 1,al. a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão, suspensa por um período de três anos, sob condição de o arguido pagar aos demandantes cíveis, no prazo máximo de um ano, o valor total indemnizatório liquidado no acórdão condenatório.

Na parcial procedência do pedido de indemnização civil formulado pelos demandantes, foi o ora recorrente condenado a pagar a ambos os demandantes, B... e C..., a título de indemnização pelos danos patrimoniais liquidados que sofreram, a quantia total de € 18.258,37 acrescida de juros de mora à taxa legal desde a notificação do pedido até ao seu pagamento, bem como a quantia a liquidar em execução de sentença, até ao limite do pedido, referente aos danos que sofreram relacionados com o valor da palha e barracão ardidos, e ainda a cada um dos demandantes, por danos não patrimoniais, a quantia de € 750 acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da decisão condenatória.

Em 24 de Maio de 2011 a Mmª Juiz exarou nos autos decisão com o seguinte teor: “A..., arguido nestes autos, foi nos mesmos condenado, por Acórdão proferido em 7 de Dezembro de 2006, na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, suspensão esta subordinada à obrigação de pagamento do valor indemnizatório aos demandantes cíveis, no prazo de um ano.

Por Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido a 12.09.2007, foi decidido manter a decisão recorrida.

Em 26 de Setembro de 2008 e 2 de Junho de 2009, o arguido requereu a prorrogação do prazo para pagamento do valor indemnizatório, pela ocorrência de circunstâncias modificativas da sua condição económica, prorrogações que lhe foram concedidas.

Em Março de 2010, o arguido pagou aos demandantes a quantia de € 2.000,00, permanecendo por pagar o remanescente.

Em Abril de 2010, foi determinada uma nova prorrogação do prazo de seis meses para cumprimento da injunção imposta.

Nessa altura, o arguido comprometeu-se a pagar o montante global em falta até ao Verão de 2010, o que não conseguiu fazer.

Até ao momento o arguido pagou aos demandantes a quantia de € 2.000,00, o que é manifestamente reduzido atendendo à data da decisão judicial e ao montante global em causa.

Vem agora o arguido requerer nova modificação dos deveres impostos, nomeadamente a prorrogação do prazo para a liquidação dos valores em causa, pelo prazo nunca inferior a 12 meses.

A Exmª Magistrada do Ministério Público pronunciou-se nos termos constantes de fls. 784 e seguintes.

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do disposto no artigo 51º, nº 3, do Código de Processo Penal, os deveres impostos podem ser modificados até ao termo do período da suspensão sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o Tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento.

Ora, tal como consta da promoção que antecede verifica-se que o arguido vem protelando o cumprimento da injunção imposta, alegando circunstâncias supervenientes, numa tentativa de obviar ao pagamento do montante que se encontra judicialmente obrigado a cumprir.

O Tribunal tem acedido aos seus pedidos sucessivos, por entender justificada a dificuldade económica do agente, numa altura de crise económica como a que o país vive actualmente.

Todavia, volvidos quatro anos desde que foi proferida a decisão torna-se necessário optar por uma decisão definitiva que impeça o sucessivo protelar do dever imposto ao arguido.

Estabelece o artigo 50º, nº 1, do Código Penal que “o tribunal suspende a execução da pena aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

A suspensão da execução da pena de prisão confere ao arguido a possibilidade de não cumprir pena de prisão caso se verifiquem determinados pressupostos, designadamente um pressuposto de índole formal, o limite máximo de duração da suspensão, e um pressuposto de índole material, a realização de um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, quando o tribunal entender que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Refere o artigo 51º, nº 1, alínea a) do Código Penal que a suspensão da execução pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente pagar dentro de certo prazo, no todo ou em parte que o tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado, ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea.

No caso dos autos a suspensão da execução da pena de prisão ficou efectivamente subordinada ao cumprimento de um dever, nomeadamente o dever de pagar, dentro de certo prazo, o valor indemnizatório fixado na decisão judicial aos demandantes civis.

Ora, compulsados os autos verifica-se que o arguido não cumpriu esse dever, apesar das sucessivas prorrogações do prazo de pagamento.

O artigo 51º, nº 3, do Código Penal diz que os deveres podem ser modificados sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes.

Efectivamente o arguido alega que as suas condições económicas se alteraram sobremaneira desde a prolação da decisão, encontrando-se actualmente desempregado e impossibilitado de fazer face ao pagamento da indemnização, requerendo a modificação dos deveres impostos, nomeadamente a prorrogação do prazo de cumprimento.

O artigo 56º, nº 1, do Código Penal dispõe que “A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou plano de reinserção social; ou b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”.

Acrescenta o nº 2 da mesma disposição legal que “A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição de prestações que haja efectuado”.

Ora, é evidente, verificarem-se no caso dos autos os pressupostos da revogação da pena suspensa aplicada, à luz do artigo 56º, nº 1, al. a), do Código Penal.

Conclui-se, assim, que a finalidade que se teve em vista com a suspensão da pena nestes autos não foi alcançada.

Compulsados os autos verificamos que é patente que o arguido infringiu culposamente o dever imposto, decorridos que estão quatro anos da data da sentença, tendo este pago apenas a quantia de € 2.000,00 até hoje.

Aqui chegados cumpre analisar se é legítimo ao arguido requerer esta nova modificação, ainda que com fundamento na alteração das circunstâncias económicas ou se, por outro lado este incumprimento sucessivo deve conduzir à revogação da suspensão da execução da pena de prisão.

E isto porque a revogação não opera automaticamente pelo simples infringir dos deveres impostos. Em caso de incumprimento culposo dos deveres impostos ao arguido, deve o tribunal perceber se a violação da suspensão nos moldes em que a mesma foi fixada, importa a sua revogação, atendendo às finalidades que a sanção visa salvaguardar. Deve o tribunal perceber se os fundamentos da suspensão se mantêm válidos ou seja, se o juízo de prognose relativamente às finalidades da punição alcançadas com a mera censura do acto e a ameaça da prisão é ainda favorável ou não.

No caso em apreço dúvidas não temos de que o arguido violou grosseiramente os deveres que lhe foram impostos, tendo em conta o facto de apenas ter pago a quantia de € 2.000,00 em quatro anos.

Acresce que os deveres impostos só podem ser modificados até ao termo do período da suspensão, o qual já decorreu, em 02.10.2010.

Pelo exposto, em conformidade com o doutamente promovido pela Digna Magistrada do Ministério Público declaro, nos termos do disposto nos artigos 51º, nºs 1 e 3, 55º e 56º, nº 1, al. a), do Código Penal, revogada a suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos autos ao arguido.

Notifique.” Inconformado, o arguido interpôs recurso deste despacho, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1- No âmbito do processo acima identificado foi o arguido A... condenado na pena única de três anos de prisão pela prática de um crime de incêndio, na forma consumada, p. e p. pelo art. 272, nº 1, al. a) do Código Penal.

2- Esta pena foi suspensa na sua execução, por um período de 3 anos, suspensão esta subordinada à obrigação do arguido pagar aos demandantes cíveis, no prazo máximo de um ano, fazendo de tal prova no processo, o valor total indemnizatório liquidado neste acórdão.

3- Em 29 de Setembro de 2008, o arguido veio invocar alterações supervenientes das circunstâncias que alteraram de forma irremediável a sua situação económica do arguido, conforme documento que se encontra junto ao processo e que aqui se reproduz para os devidos e legais efeitos.

4- Em 02 de Junho de 2009, o arguido veio comunicar ao processo que a sua situação pessoal tinha alterado em virtude de ter começado a trabalhar e ter sofrido dois acidentes de trabalho, que lhe determinaram incapacidade para o trabalho, conforme melhor consta na requerimento apresentado no âmbito dos presentes autos a 02 de Junho de 2009 e que aqui se reproduz para os devidos e legais efeitos.

5- Em virtude disto ficou impossibilitado de trabalhar por circunstâncias que não lhe são imputáveis, acrescendo o facto de quando foi solicitar subsídio de doença, o mesmo tem conhecimento pelos serviços de Segurança Social Francesa, que constava...

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