Acórdão nº 22/08.3FBPVZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução07 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 22/08.3FBPVZ-A.P1 * Acordam no tribunal da Relação do Porto Nos autos de inquérito supra identificado, a fls. 214 o Digno Magistrado do MP lavrou promoção no sentido de que sejam declarados perdidos a favor do Fundo de Turismo os objectos apreendidos, devendo ser ordenada a destruição da máquina apreendida.

O Sr. JIC lavrou o seguinte despacho: Nos termos promovidos a fls. 214, que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais e em relação aos quais, de resto, nenhuma oposição foi deduzida, declaro os objectos apreendidos nos autos perdidos a favor do Fundo de Turismo.

Quanto à promoção de destino a dar aos mesmos, assumindo uma mudança de posição em relação ao nosso anterior entendimento, declaro-me materialmente incompetente para o efeito, porquanto competente é a autoridade judiciária titular do Inquérito: o Ministério Público - cfr. os artigos 17º, 267º, 268º e 269º do Código de Processo Penal, estes dois últimos a contrario, bem como o entendimento preconizado nos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 09-06-2010 e 14-09-2011, ambos in www.dgsi.pt/jtrp.

Não conformado, o Ex.mo Magistrado do MP interpõe o presente recurso, que motivou, apresentando as seguintes conclusões: 1. No domínio da Lei do Jogo, a entidade competente para ordenar a destruição do material e utensílios de jogo apreendidos é o Tribunal, por força do disposto no art. 116º do referido diploma.

  1. Tendo o inquérito sido arquivado, nos termos do art. 282º, n.º 3 do Código de Processo Penal, tal competência será deferida ao Juiz de Instrução - art. 17° e 269º, n.º 1, al. f), ambos do Código de Processo Penal.

  2. Aquela norma (art. 116.°) reproduz o que consta da autorização legislativa - art. 2º, n.º 6, al. i) da Lei n.° 14/89, de 30.06 - e representa uma inovação face ao regime legal anterior, estatuído pelo art. 56º do DL 48.912, de 18.03.1969.

  3. Inovação precisamente na parte em que atribui competência para ordenar a destruição ao Tribunal.

  4. Trata-se de um regime especial relativamente àquele que se encontra fixado nos art.ºs 109º e ss. do Código Penal.

  5. Especial, na medida em que: a) aí se determina sempre a apreensão do material e utensílios de jogo, quando estejam em causa crimes previstos nos art. 108º e ss. da Lei do Jogo; b) esses objectos são sempre destruídos; c) a mandado do Tribunal; d) e a destruição é efectuada pela autoridade apreensora, que lavrará o competente auto de destruição.

  6. Este regime não encontra paralelo em nenhum outro regime especial de perda de objectos, nomeadamente: a) no âmbito da Lei da Droga, art. 35º, 36º, 39º e 62º; b) no âmbito do Regime Jurídico das Armas e suas Munições, art.º 78º; c) no âmbito do Código de Propriedade Industrial, art. 330º.

  7. Presume-se, claro, que o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados - art. 9º, n.º 3 do Código Civil - ainda que de lege ferenda se possa questionar a necessidade de tutela jurisdicional de tal questão.

  8. Sempre que o legislador pretende atribuir competência a entidades diferentes conforme a fase do processo, fá-lo com referência à “autoridade judiciária” - art. 1º, al. b) do Código de Processo Penal.

  9. Assim acontece, entre outros, nos seguintes casos: a) em matéria de destruição da droga remanescente - art. 62º, n.º 4 da Lei da Droga; b) em matéria de apreensão de objectos - art. 178º, n.º 3 do Código de Processo Penal; c) despacho que ordena a perícia - art. 154º, n.º 1 do Código de Processo Penal; d) sujeição a TIR - art. 196º, n.º 1 do Código de Processo Penal 11. Ora, não obstante as diversas alterações que esse diploma foi sofrendo (DL n.º 10/95, de 19/01, Lei n.º 28/2004, de 16/07, DL n.º 40/2005, de 17/02, Lei n.° 64-A/2008, de 31/12 e DL n.° 114/2011, de 30/11, umas mais profundas, outras mais “cirúrgicas”) nunca o legislador teve necessidade/tomou a iniciativa de alterar aquele normativo, actualizando a referência ao Tribunal para autoridade judiciária.

  10. Por outro lado, nem a tal entendimento obsta a interpretação que se faça da al. e) do n.º 1 do art. 268º do Código de Processo Penal, tendo por referência que nesse segmento normativo apenas se faz menção à declaração de perda e já não ao destino subsequente.

  11. Na literatura e no sentido acabado de defender quanto à interpretação do art. 116º da Lei do Jogo, veja-se CONDE FERNANDES, in Comentário das Leis Penais Extravagantes, Vol. 2, Org. Paulo Pinto de Albuquerque e José Branco, UCE, 2011, pág. 386.

  12. Os arestos indicados na douta decisão não terão aplicação directa no caso concreto, uma vez que em nenhuma delas se faz aplicação do referido art. 116º da Lei do Jogo (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09.06.2010 e 14.09.2011).

  13. Por último, a questão não é meramente “platónica”, pois que, se a lei atribuir unicamente essa competência ao Tribunal, a prática desse acto pelo Ministério Público consubstanciará um acto ilegal, susceptível de (para além do mais) gerar responsabilidade disciplinar e/ou civil.

  14. Pelo que o Meritíssimo Juiz de Instrução, ao declarar-se materialmente incompetente para ordenar a destruição do objecto apreendido, violou o disposto no art. 116º da Lei do Jogo.

  15. Deve, por conseguinte, ser revogado o despacho proferido a fls. 227, nesta parte, e substituído por outro que, reconhecendo a competência do JIC para o efeito, ordene a destruição da máquina de jogo apreendida nos autos, nos termos do art. 116º da Lei do Jogo.

    Não foi apresentada resposta.

    O Sr. Juiz sustentou o despacho recorrido: Nos termos do art.° 414º, n.º 4, do Código de Processo Penal, o tribunal recorrido mantém o despacho recorrido porquanto entendemos que a Lei do Jogo não reveste normatividade especial que justifique entendimento diverso das diversas situações por referência à competência para determinar o destino dos objectos em sede de Inquérito, nem se compreendendo, salvo o devido respeito, que em todas as demais situações/crimes, fosse o Ministério Público competente e apenas no âmbito de aplicação da Lei do Jogo se exigisse a intervenção do JIC para tal efeito.

    Nesta Relação, a Ex.ma PGA emite douto parecer do qual se respiga: A Lei do Jogo é clara.

    “Todo o dinheiro e valores destinados ao jogo, bem como os móveis do local em que sejam cometidos os crimes previstos nesta secção, serão apreendidos e declarados pelo tribunal perdidos a favor do Fundo de Turismo”. Art. 117º do Dec-Lei nº 10/95, de 19/01.

    “O material e utensílios de jogo serão apreendidos...

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