Acórdão nº 70/11.6TAMTR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | ERNESTO NASCIMENTO |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo comum singular 70/11.6TAMTR de Montalegre Relator - Ernesto Nascimento Adjunto Artur Oliveira Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. Efectuado o julgamento foi proferida sentença onde, na improcedência da acusação pública, se decidiu absolver o arguido B…, do crime de desobediência, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 160º/3 e 4 do Código da Estrada e 348º/1 alínea a) do Código Penal, que lhe era imputado.
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2. Inconformado com o assim decidido, interpôs o Magistrado do MP. recurso – pugnando pela revogação da sentença e a sua substituição por uma outra que condene o arguido, nos termos em que vinha acusado – sustentando as conclusões, que a seguir se transcrevem: 1. o artigo 160º/1 do Código da Estrada é aplicável quer à sanção acessória de inibição de conduzir (decorrente de uma decisão da autoridade administrativa) quer à pena acessória de proibição de conduzir (decorrente de uma decisão judicial); 2. do teor do artigo 160º/1 e 3 CE há que concluir que o incumprimento da ordem para entrega da carta ou licença de condução faz incorrer o agente na prática de um crime de desobediência, quer se trate de impossibilidade de conduzir decorrente da prática de um crime – pela condenação em pena acessória de proibição de conduzir – quer da prática de uma contra-ordenação – pela imposição da medida de segurança de inibição de conduzir; 3. é de presumir que o legislador intuiu a diferença entre “condutor proibido” e “condutor inibido” de conduzir; 4. é esta a única interpretação que deve ser dada ao artigo 160º/1 CE, quando se refere, a par da cassação da carta ou licença e da inibição de conduzir, à proibição de conduzir; 5. por uma questão de coerência do sistema jurídico-penal, não se compreenderia que uma conduta fosse punida como desobediência, estando em causa um incumprimento de uma decisão administrativa e que a mesma conduta não fosse punida como desobediência estando em causa uma reacção de índole criminal em princípio mais grave que a do foro contra-ordenacional; 6. por outro lado, o intérprete deve presumir na determinação do sentido e alcance da lei, que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados e consagrou as soluções mais acertadas; 7. o facto do artigo 500º C P Penal avançar somente com uma solução - apreensão – para a hipótese de o condenado não proceder à entrega significa, apenas, que o sistema previu essa possibilidade e acautelou-a, estabelecendo-a como salvaguarda para o incumprimento da apreensão do título por parte das autoridades; 8. apesar de o artigo 500º C P Penal não estabelecer qualquer cominação de desobediência para a não entrega deliberada do título de condução, tal não significa que se encontra afastada a punibilidade a esse título, uma vez que tal disposição, designadamente, o seu n.º 3 parte final, deve conjugar-se com o artigo 160º/1, 3 e 4 CE; 9. a conduta do arguido, que condenado na pena acessória de proibição de conduzir, nos termos do artigo 69º C Penal, pela prática de infracção criminal a que corresponde pena acessória, não entregou o título de condução para cumprimento da dita pena, integra a infracção criminal de desobediência prevista pelas disposições conjugadas dos artigos 160º/3 CE e 348º/1 alínea a) C Penal; 10. ao entender que a referida conduta não integrava este crime, o Tribunal a quo violou o citado normativo do artigo 160º/3 CE; 11. perante a factualidade imputada ao arguido e dada como provada e, atendendo ainda às disposições legais aplicáveis, deve a decisão recorrida ser substituída por outra que condene o arguido pela prática de um crime de desobediência, infracção prevista no artigo 160º/1, 3 e 4 CE, conjugada com o artigo 348º/1 alínea a) C Penal.
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3. Não foi apresentada resposta.
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Subidos os autos a este Tribunal o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido, de, igualmente, o recurso merecer provimento.
No cumprimento do estatuído no artigo 417º/2 C P Penal, o recorrente nada disse.
No exame preliminar decidiu-se nada obstar ao conhecimento do mérito do recurso e que ao mesmo fora atribuído o efeito adequado.
Seguiram-se os vistos legais.
Os autos foram submetidos à conferência.
Cumpre agora apreciar e decidir.
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Fundamentação III. 1. Como é por todos consabido, são as conclusões, resumo das razões do pedido, extraídas pelo recorrente, a partir da sua motivação, que define e delimita o objecto do recurso, artigo 412º/1 C P Penal.
Assim, a questão suscitada pelo recorrente para apreciação pelo tribunal de recurso é, tão só, a de saber se comete ou não o crime de desobediência, p. e p. elo artigo 348º/1 alínea a) C Penal, aquele que não entrega a carta de condução, no prazo que para tal lhe foi ordenado na sentença que o condenou na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados.
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2. A jurisprudência vem-se dividindo a tal propósito, oscilando entre uma corrente - onde a posição defendida pelo recorrente se integra - que entende que a desobediência à ordem, dada pelo juiz, de entrega da carta de condução consubstancia o ilícito de desobediência do artigo 348º/1 alínea a) C Penal e, outra - onde se integra a posição defendida pela decisão recorrida - que entende que não.
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2. 1. O texto legal Dispõe o artigo 348º C Penal, que, “1 - Quem faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias se: a) Uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples; ou b) Na ausência de disposição legal, a autoridade ou o funcionário fizerem a correspondente cominação”.
Por sua vez, dispõe o artigo 353º C Penal, na redacção da Lei 59/2007, de 4 de Setembro, que, “quem violar imposições, proibições ou interdições determinadas por sentença criminal, a título de pena aplicada em processo sumaríssimo, de pena acessória ou de medida de segurança não privativa da liberdade, é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias”, dispõe o artigo 69º C Penal - introduzido pelo Decreto Lei 48/95, de 15 de Março e, posteriormente alterado pela Lei 77/2001, de 13 de Julho - que, (…) 3. “no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial, que remete àquela, o título de condução, se o mesmo não se encontrar já apreendido no processo” 4. a secretaria do tribunal comunica a proibição de conduzir à Direcção-Geral de Viação no prazo de 20 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, bem como participa ao Ministério Público as situações de incumprimento do disposto no número anterior”; dispõe o artigo 500º C P Penal – na redacção dada pelo Decreto Lei 317/95, de 28 de Novembro) [1] que, “1. a decisão que decretar a proibição de conduzir veículos motorizados é comunicada à Direcção-Geral de Viação; 2. no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial, que a remete àquela, a licença de condução, se a mesma não se encontrar já apreendida no processo; 3. se o condenado na proibição de conduzir veículos motorizados não proceder de acordo com o disposto no número anterior, o tribunal ordena a apreensão da licença de condução (…)”; Dispõe o artigo 160º do Código da Estrada, na redacção dada pelo Decreto Lei 44/2005, de 23 de...
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