Acórdão nº 1751/10.7TXPRT-H.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Julho de 2012

Data04 Julho 2012
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 1751/10.7TXPRT-H.P1 Relator: Joaquim Correia Gomes; Adjunto: Carlos Espírito Santo Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO 1. No Processo n.º 1759/10.7TXPRT do 2.º Juízo do Tribunal de Execução de Penas do Porto, em que são: Recorrente/Arguido: B… Recorrido: Ministério Público foi proferida decisão em 2011/Nov./14, a fls. 2-5 (148-151 do original), que não concedeu a liberdade condicional ao arguido e cumpridos que estão 2/3 da sua pena de prisão.

  1. O arguido insurgiu-se e interpôs recurso por fax expedido em 2011/Jan./04, a fls. 67 e ss., pugnando pela revogação desse despacho e pela concessão da liberdade condicional, acabando por concluir nos seguintes termos(1): conclusões 1.º) O arguido encontra-se a cumprir pena única, em cúmulo jurídico, de quatro anos e oito meses de prisão, pelos crime de homicídio tentado, detenção de arma proibida, injúrias, resistência e coacção sobre funcionários, tendo atingido metade da pena em 2010/Out./08 e os dois terços em 2011/Jul/08, estando aprazado o seu termo para 2013/Fev./08 [I-III]; 2.º) O despacho recorrido que recusou a concessão da liberdade condicional é nulo por não exibir as razões de facto e de direito que conduziram à recusa da liberdade condicional, conforme previsto no artigo 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Penal, já que o mesmo deve observar os requisitos das sentenças, nos termos dos artigos 485.º, n.º 6 e 486.º, n.º 4 do mesmo código [IV-VII; IX, XIII, XIV]; 3.º) São desconhecidos do recorrente, porque não constam do despacho recorrido, as posições assumidas pelos membros do Conselho Técnico, sendo tal despacho escasso na sua fundamentação, não se compreendendo as razões em que se baseou o tribunal “ad quo”, fazendo apenas uma breve referência ao seu trajecto prisional, tendo por base o relatório efectuado pelos serviços de reinserção social [VIII, X, XI, XII, XV-XXI]; 4.º) Os fundamentos invocados são, só por si, muito frágeis e facilmente contraditados, pois apesar do recorrente ter vários registos disciplinares, beneficiou de duas saídas jurisdicionais, uma em 2011/Mai./20 e outra em 2011/Set./24, tendo apoio afectivo-económico familiar e dos amigos, apresentando como seu projecto de vida imediato ir residir com os seus pais e irmão deficiente, bem como procurar ocupação profissional na área de decoração de interiores [XXII-XXX]; 5.º) O despacho recorrido interpretou de forma manifestamente errada a norma do artigo 61.º, n.º 3 do Código Penal violando os princípios constitucionais de adequação, proporcionalidade e necessidade [XXXI-XXXII]; 3. O Ministério Público respondeu a fls. 102 e ss., sustentando que se deve negar provimento ao recurso, porquanto: 1.º) a existir qualquer vício na falta de fundamentação da decisão recorrida, o mesmo seria uma mera irregularidade, que já estaria sanada, para além daquela se encontrar devidamente motivada; 2.º) São razões de prevenção especial, decorrentes da falta de um juízo autocrítico, da existência do registo de várias infracções disciplinares, para além de o arguido não ter apresentado perspectivas concretas de trabalho em meio livre que afastam a concessão da liberdade condicional.

  2. Nesta Relação o Ministério Público emitiu parecer igualmente no sentido da improcedência do recurso.

  3. Cumpriu-se o disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal e solicitaram--se elementos respeitantes ao processo disciplinar que já foi referido, tendo-se colhido de seguida os vistos legais, nada obstando a que se conheça do mérito deste recurso.

*O objecto do presente recurso centra-se na nulidade da decisão recorrida [a)] e na existência ou não de fundamentos para a concessão da liberdade condicional [b)].

* * *II. FUNDAMENTAÇÃO 1. Circunstâncias a considerar 1.1 O despacho recorrido “Corre o presente processo gracioso de liberdade condicional referente ao condenado B…, identificado nos autos.

Foram elaborados os pertinentes relatórios.

Reuniu o Conselho Técnico tendo o respectivo parecer sido no sentido da não concessão da liberdade condicional e procedeu-se à audição do recluso.

O Ministério Público teve vista do processo sendo de parecer no sentido de não ser concedida a liberdade condicional.

*O Tribunal é o competente.

O processo é o próprio, sendo que se mantém a validade e regularidade da instância, não ocorrem quaisquer nulidades, excepções, questões prévias ou incidentes de que cumpra de momento apreciar, pelo que nada obsta ao conhecimento do mérito presente da causa*O instituto da liberdade condicional é regulado pelos artigos 61.º e 63.º do Código Penal e tem em vista a libertação antecipada, mas não definitiva, do recluso, após cumprimento de uma parte da pena de prisão em que foi condenado.

Como escreve a propósito Anabela Rodrigues (in “A Fase de execução de Penas e medidas de segurança no Direito português, BMJ n.º 380, página 26), «a liberdade condicional tem como escopo criar um período de transição entre a reclusão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, de forma equilibrada, não brusca, recobrar o sentido de orientação social necessariamente enfraquecido por efeito do afastamento da vida em meio livre e, nesta medida, a sua finalidade primária é a reinserção social do cidadão recluso, sendo certo que até serem atingidos os dois terços da pena, esta finalidade está limitada pela exigência geral preventiva de defesa da sociedade» A aplicação da liberdade condicional facultativa assenta em vários pressupostos, de natureza formal e material.

Constituem pressupostos de natureza formal os seguintes: a) O consentimento do condenado (artigo 61.º, n.º 1, do Código Penal; b) O cumprimento de pelo menos seis meses da pena de prisão ou da soma das penas de prisão que se encontram a ser executadas (artigos 61.º, n.º 2 e 63.º, n.º 2, do Código Penal); c) O cumprimento de 1/2, 2/3 ou 5/6 da pena de prisão ou da soma das penas de prisão que se encontram a ser executadas (artigos 61.º, números 2, 3 e 4 e 63.º, n.º2, do Código Penal.

Por outro lado, constituem pressupostos materiais ou substanciais a 1/2 da pena: a) Um juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado quando colocado em liberdade (alíneas a) e b), do artigo 61°, do Código Penal), o qual assenta numa apreciação sobre a evolução da personalidade do condenado durante o tempo de execução da prisão (juízo atinente à prevenção especial positiva ou de ressocialização); b) Um juízo de prognose favorável sobre o reflexo da libertação do condenado na sociedade (juízo atinente à prevenção geral positiva), ou seja, sobre o seu impacto nas exigências de ordem e paz social.

Quanto apreciada aos 2/3 a pena, os pressupostos para a concessão da liberdade condicional são apenas os referidos em a).

Por fim, quando referida a 5/6 das penas superiores a seis anos, (liberdade condicional obrigatória), a liberdade condicional não está dependente daqueles pressupostos materiais, sendo indiferente que o juízo de prognose quanto ao comportamento futuro do condenado (apreciação relativa à prevenção especial positiva), seja positivo ou negativo.

Isto posto e quanto ao caso em concreto: O condenado cumpre a pena única de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão, à ordem do Processo n.º 51/07.4PDVNG pela prática dos crimes de homicídio tentado, detenção de arma proibida, injúrias e resistência e coacção sobre funcionário.

Atingiu o meio da pena em 08/10/2010, os 2/3 em 18/07/2011 e o seu termo em 08/02/2013.

Há lugar assim a apreciação da liberdade condicional por referência aos 2/3 da pena.

O recluso beneficiou de uma saída jurisdicional que decorreu sem anomalias.

No meio prisional o recluso tem o registo de várias sanções disciplinares, sendo a última datada de 29/04/2011.

Tem trabalhado no EP estando neste momento afecto à área do refeitório.

O recluso não demonstrou motivação para investir na sua formação escolar.

Resulta do relatório dos serviços de reinserção social (cfr. com folhas 69) que o condenado tem revelado no cumprimento da pena “oscilações comportamentais, caracterizadas pela impulsividade, imaturidade e instabilidade emocional”, sendo “detentor de uma personalidade frágil e influenciável, tendendo a estabelecer as suas relações de amizade com indivíduos também com condutas desviantes”.

No meio livre o recluso perspectiva integrar viver para casa dos pais.

Perspectiva ir trabalhar para a área da decoração de interiores, embora “não tenha nada em concreto” – cfr. com o auto de audição de folhas 143.

Quanto aos factos cometidos, o condenado verbaliza arrependimento, mas desculpabiliza com a circunstância de se encontrar na altura alcoolizado.

Ora há que dizer antes de mais que o percurso do recluso no meio prisional não se pode considerar como positivo tendo em conta o registo de punições disciplinares apresentados pelo recluso.

Considerando também a sua personalidade frágil e o relacionamento com indivíduos com “condutas desviantes”, dúvidas não restam que nesta fase não é possível fazer um juízo de prognose favorável sobre o comportamento futuro do condenado, no sentido de que uma vez em liberdade condicional, leve uma vida socialmente responsável e sem cometer mais crimes.

Acresce que há que ponderar também a postura do condenado perante os factos uma vez que este não demonstra qualquer preocupação nas vítimas, centrando o discurso na sua pessoa e desculpabilizando-se dos factos cometidos com o consumo de álcool.

Esta atitude do recluso evidencia de forma clara que ainda não interiorizou os efeitos da pena, não podendo justificar uma apreciação positiva quanto ao seu projecto de vida em meio livre.

Conclui-se assim que não se mostra preenchido o requisito substancial da concessão da liberdade condicional, a que alude o artigo 61.º, n.º 2, a), do Código Penal, o que a impossibilita, porquanto não de pode afirmar, por mínimo que seja, que fundadamente é de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a...

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