Acórdão nº 30/11.7TAMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução17 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 30/11.7TAMTS.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO 1. No 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, nos autos de processo comum nº 30/11.7TAMTS, foi proferida sentença, em 12.4.2012 (fls. 158 a 174 do 1º volume), constando do dispositivo o seguinte: Pelo exposto: Julgo a acusação particular parcialmente procedente e, em consequência: Condeno o arguido B… pela prática de um crime de injúria p. e p. no art.° 181.° do Cód. Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 15'00 (quinze euros) , perfazendo o quantitativo global de € 1.200'00 (mil e duzentos euros).

Absolvo o mesmo arguido da prática, em concurso real de um crime de difamação tal como p. e p. pelo art° 180.° do Cód. Penal por que também havia sido acusado.

Julgo o pedido de indemnização civil parcialmente procedente e, em consequência: Condeno o demandado a pagar ao demandante uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de €1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros).

Custas criminais pelo arguido, que se fixam em 2UC e meia - art.° 513.°, n.° 1 e 514.°, n.° 1 do Cód. de Processo Penal e 8.°, n.° 9 do Reg. das Custas Processuais.

Sem custas cíveis - art.° 523.° e 524.° do Cód. Proc. Penal e art.° 4.°, n.° 1, al. n) do Reg. das Custas Processuais.

(…).

*2. O arguido B… não se conformou com essa sentença, razão pela qual dela interpôs recurso (fls. 184 e 185), formulando as seguintes conclusões: I) Da matéria de facto dado como provado pela Douta sentença recorrida, a exemplo do que sucedia com a acusação, não resulta a mínima referência ao elemento intelectual do dolo, traduzido no conhecimento dos elementos objectivos do crime, ou seja, de que sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.

II) Donde não se poder imputar ao recorrido o crime porque foi condenado.

Ill) Violando, assim, a Douta Sentença recorrida o disposto no art. 181° do Cód.

IV) Pelo que deve ser revogada, absolvendo-se o aqui recorrente.

Termina pedindo o provimento do recurso, revogando-se a sentença impugnada, com a sua consequente absolvição do crime pelo qual foi condenado.

*3. O Ministério Público respondeu ao recurso (fls. 192 a 202 do 1º volume), concluindo pela sua improcedência.

*4. Nesta Relação, a Srª. PGA emitiu parecer (fls. 212 do 2º volume) no sentido da improcedência do recurso.

*5. Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

*6. Na sentença sob recurso: Foram considerados provados os seguintes factos: 1. No dia 27 de Outubro de 2010, o assistente, recebeu, via fax, uma carta que lhe foi enviada pelo arguido, na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito do pai de ambos.

  1. Na carta referida em 1., o arguido proferiu as seguintes expressões: Não merecem aprovação os factos que passo a discriminar: - Entrar na casa da quinta utilizando os mesmos métodos de um vulgar delinquente; - Que o cão seja também seu companheiro de lençóis não me diz respeito, mas deixar quartos, roupas, etc, com lixo de animal isso, sim, já me diz respeito; 3. O arguido referiu-se ainda às companhias do assistente/pessoas que o acompanhavam nas deslocações à quinta, nos seguintes termos: Que conte às "meninas" a historinha do menino rico, desamparado e mal amado pela família, por mim tudo bem. Mas as sucessivas "meninas" frequentarem a casa e usarem os aposentos da casa e serem exibidas ao pessoal, isso já me diz respeito.

    Seria bem melhor no caso de serem de 1.a categoria, instalá-las no C… ou no D… ou no caso de serem de 2.a dou como sugestão o E… ou o F… no …. Volto a repetir que tenho o direito a não querer que levem para a quinta "meninas" e que as exibam no meio dos funcionários.

  2. Sabia que tais expressões eram susceptíveis de ofender a consideração, honra e dignidade do assistente e, ainda assim, quis proferi-las, tendo actuado livre, voluntaria e conscientemente.

    Mais se apurou que: 5. O fax referido em 1. foi enviado para o local de trabalho do assistente, onde foi recebido por uma funcionária e lido por uma outra colega de trabalho do assistente.

  3. O arguido é casado.

  4. Reside em casa própria, com a esposa.

  5. Não tem despesas relativas à residência, mormente relacionadas com a amortização de qualquer tipo de empréstimo bancário.

  6. Tem dois filhos, já maiores e economicamente independentes.

  7. É economista e exerce funções de administrador de empresas, auferindo um vencimento mensal declarado resultante de tais actividades num valor não precisamente apurado no mínimo na ordem dos €1.000,00, a que acrescem os demais rendimentos que também não foi possível apurar e que incluem ainda sua actividade empresarial desenvolvida na quinta acima aludida.

  8. A esposa do arguido é economista e exerce funções de directora de um banco, auferindo um vencimento mensal cujo valor não foi possível apurar.

  9. O arguido não tem antecedentes criminais.

  10. O arguido e o assistente continuam desavindos e de relações cortadas, assumindo aquele para com este, seu irmão, uma postura de algum escárnio e desconsideração.

    Quanto ao pedido de indemnização civil, provou-se que: 14. Na data referida em 1. o assistente era casado e vivia com a esposa.

  11. O facto referido em 6. gerou no assistente sentimentos de vexame e constrangimento perante colegas de trabalho e funcionários da empresa.

  12. Atento o teor da carta e a forma como chegou às suas mãos e conhecimento, gerou-se no assistente intranquilidade e receio de vir a ser alvo de comentários por parte dos funcionários na sua ausência.

  13. O comportamento do arguido provocou no assistente início de depressão nervosa, para a qual foi medicado.

  14. O estado de saúde referido em 16. causou desassossegos e oscilações de humor ao assistente durante cerca de 4 meses.

    Quanto aos factos não provados, consignou-se o seguinte: A) Na carta referida em 1., o arguido proferiu as palavras "és um vulgar delinquente".

    (O demais alegados em cada uma das peças processuais tomadas em consideração - acusação particular/pedido cível e contestação reveste carácter conclusivo e/ou jurídico; para além da mera impugnação por negação por parte do arguido/demandado).

    Da respectiva fundamentação da decisão sobre a matéria de facto consta: O Tribunal formou a sua convicção na apreciação crítica e conjugada da prova produzida, designadamente nos documentos juntos aos autos, nas declarações do arguido e do assistente e nos depoimentos das testemunhas arroladas, pelas razões que passa a descrever.

    Para prova dos factos 1, 2 e 3 o Tribunal relevou o fax junto a fls. 5, que o arguido confessou ter enviado ao assistente, onde se encontram vertidas as expressões que aquele dirigiu a este.

    O Tribunal não deu como provado que o arguido tenha dito ao assistente que ele era um vulgar delinquente, pois tal imputação não resulta do referido fax.

    Por outro lado, da prova produzida não resultou que, através das expressões consignadas em 2., o arguido tenha tido em vista ofender a honra e consideração do irmão (aqui assistente), mas antes manifestar o seu desagrado e reprovação pelo facto de este ter arrombando um portão de acesso à quinta e de o seu cão dormir nos aposentos da quinta - sendo que estes factos foram reconhecidos pelo assistente e o sentido das expressões proferidas foi esclarecido peio arguido.

    Relativamente ao sentido das expressões referidas em 3., a convicção do Tribunal baseou-se na análise e interpretação da carta (considerando a forma como as mencionadas expressões foram redigidas), conjugadas com as declarações do arguido.

    Em todo o caso convém desde já salientar que o arguido teve sempre uma postura demasiado evasiva ou pretensamente justificativa e desculpabilizante, tornando até por vezes difícil a obtenção de respostas directas e mais simples a perguntas directas e igualmente simples; sendo certo que assumia até um postura irónica perante os factos, sempre crítica e de indignação perante a acusação particular e de desconsideração em relação ao assistente/seu irmão - decorrente desde logo das chamadas de atenção à sua atitude ou reacções por vezes menos adequadas e excessivas durante o julgamento, em sede de produção de prova e em particular até com presença e tomada de declarações do assistente.

    No que toca à imputação de uma vida sexual promíscua, atentou-se na expressão "sucessivas «meninas»", que aponta inequivocamente...

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