Acórdão nº 2049/11.9PAVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DOLORES SILVA E SOUSA
Data da Resolução19 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 2049/11.9PAVNG.P1 Vila Nova de Gaia.

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto.

  1. secção.

I-Relatório.

No Processo Comum com intervenção de Tribunal Singular nº 2049/11.9PAVNG. do 1º Juízo Criminal de Vila Nova de Gaia foi submetido a julgamento o arguido B…, solteiro, gestor, nascido a 06.12.1969, no Brasil, filho de C… e D…, residente na Rua …, n.º .., …., …, Maia.

A sentença de 09 de Maio de 2012, depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, julgo a acusação procedente, por provada, e, em consequência, condeno o arguido B…: 1.1.

Pela prática, como autor material, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo art. 152º, n.º 1, al. b) e nº 2 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão cuja execução, ao abrigo do disposto pelos art. 50º do Código Penal, suspendo pelo período de 2 (dois) anos, acompanhada de regime de prova - que incida, fundamentalmente, na prevenção da violência doméstica e com a obrigação de frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica - e sujeita à regra de conduta de proibição de contactar com a ofendida.

1.2.

No pagamento das custas, fixando-se em 3 UC a taxa de justiça e nos demais encargos a que a sua actividade deu causa - art. 513º, n.º 1 do CPP e art. 3º, nº 1, 8º, nº 5 do RCP e Tabela III do mesmo.

*Após trânsito: - Remeta boletim à D.S.I.C da DGSJ; - Comunique à APAV; - Cumpra o disposto pelo art. 37º da Lei 112/09 de 16/9, comunicando a presente decisão, sem dados nominativos, à Direcção Geral da Administração Interna e à Comissão para a Cidadania e Igualdade do Género; - Comunique o teor da presente sentença aos serviços de reinserção social nos termos do disposto pelo art. 494º, nº 2 do Código de Processo Penal; - Solicite aos serviços de reinserção social que, no prazo de 30 dias, procedam à elaboração do plano de readaptação nos termos do disposto pelo art. 494º, nº 3 do Código de Processo Penal, que incida na prevenção da violência doméstica; - Comunique a extinção das medidas de coacção – art. 214º, nº 1, al. e) do Código de Processo Penal – ao OPC da área da residência da ofendida (fls. 74) e à ofendida; - Cumpra o disposto pelo art. 191º, al. a) da Lei 23/07 de 4/7 remetendo cópia certificada da presente decisão ao SEF.” * Inconformado, o arguido interpôs recurso, apresentando a motivação de fls. 266 a 274, que remata com as seguintes conclusões: “

  1. Os pontos 3, 5, 6, 7 e 8 dos factos da matéria de facto, considerados provados na Sentença posta em causa, foram apenas afirmados em audiência de julgamento pela pretensa vítima, a ofendida, sem no entanto terem sidos referidos, muito menos confirmados por qualquer outra testemunha apresentada pela Acusação.

    A própria fundamentação da matéria de facto considerada como provada apresentada na Sentença recorrida, não apresenta quaisquer referências a estes factos.

    Assim, considera-se que existe uma manifesta insuficiência de prova para dar como provados estes factos contidos nos pontos 3, 5, 6, 7 e 8 da matéria de facto considerada provada, pelo que deve o arguido não ser condenado pelos mesmos.

  2. Os factos 9, 10, 11, 12 da matéria de facto dada como provada não se podem considerar como provados, uma vez que apenas forma relatados em audiência de julgamento pela ofendida, sem terem sido confirmados por qualquer testemunha apresentada.

    Assim os factos aludidos nos pontos 9° a 12° dos factos provados na sentença recorrida, não se encontram fundamentados, carecem de prova, pois nenhuma testemunha à excepção da própria queixosa, confirmaram os mesmos factos, razão pela qual devem ser considerados como não provados, sendo o arguido absolvido da prática dos mesmos.

  3. Não deve o recorrente ser condenado pela prática dos factos contidos no ponto 15° da matéria de facto dada como provada.

    Devem Vª EXªs Juízes Desembargadores entender que o recorrente foi atacado pela mãe da ofendida, E… e ainda cercado pela ofendida, o que levou o recorrente a empurrar a ofendida, para se proteger da mesma Razão pela qual devem ser considerados estes factos como não provados, sendo o arguido absolvido da prática dos mesmos.

  4. O Arguido não tem antecedentes criminais. O Arguido encontra-se inserido socialmente na sociedade. O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste, a intensidade do dolo, no caso em análise, não se apresentam de grau elevado.

    Assim sendo, é de inteira justiça invocar para os devidos efeitos legais, no caso concreto, a atenuação especial da pena, ao abrigo do disposto nos artigos 72° nº 1, 2 e 73° do Código Penal, devem os Excºs Sr Juízes Desembargadores deste Tribunal, perante estes factos, atenuar a pena em que o Recorrente foi condenado, entre outros, e assim, reduzir a pena ao seu mínimo legal.

  5. Não se encontram preenchidos os elementos do tipo de ilícito objectivo do crime pelo qual o recorrente foi condenado, crime de violência doméstica, nomeadamente a verificação de uma agressão no corpo ou na saúde da vítima. Ora, como se observou acima, o Tribunal "a quo" não fez prova deste elemento, assim, decorrente das declarações do Recorrente, bem como dos depoimentos das testemunhas não afirmaram terem visto o recorrente a agredir a ofendida, a única coisa que viram foi o recorrente a tentar entrar em casa da ofendida e a defender-se desta e da sua mãe quando já se encontravam na via pública, o que nunca poderá ser considerado como um comportamento agressivo do recorrente para com a ofendida.

    Ainda, da análise da matéria de facto dada como provada, não se afere que o recorrente tenha de forma reiterada violentado a ofendida, nem sequer os acontecimentos ocorridos a 13 de Novembro de 2011 permitem concluir que o arguido praticou adoptou com a ofendida um comportamento violente de extrema gravidade.

    Assim, devem os Exºs Sr.s Juízes Desembargadores deste Tribunal, perante estes factos, entender como não provado que o Recorrente tenha através da sua conduta preenchido os elementos invocados do tipo de ilícito objectivo do crime em análise.

  6. Não se encontra preenchido o elemento do tipo de ilícito subjectivo do crime de violência doméstica previsto pelo artigo 152 do Código Penal.

    O preenchimento do tipo subjectivo, pressupõe uma conduta intencional dirigida à lesão do corpo ou da saúde da vítima.

    Ora, o recorrente apenas empurrou a ofendida para se defender, uma vez que estava a ser abordado por esta e atacado pela mãe da ofendida, na altura em que empurrou a ofendida para evitar uma agressão daquela.

    Assim, devem os Exºs Srºs Juízes Desembargadores deste Tribunal, perante estes factos, entender como não provado que o Recorrente tenha agido com dolo, manifestando a intenção de agredir o corpo da ofendida.

    Perante estes dados, devem os Excrs Sros Juízes Desembargadores, decidir com base no principio "in dubio pro reo" que se encontra constitucionalmente fundado no principio da "presunção de inocência" até ao trânsito em julgado da Sentença condenatório, disposto no artigo 32º nº2 da C.R.P. Ora, não nos parece que haja aqui um convencimento para além de toda a dúvida razoável da veracidade dos factos aduzidos em juízo pela Acusação, tendo em conta os factos que acima referimos, que suscitam grandes dúvidas acerca da veracidade, logo deve ser aplicado o presente princípio e desta forma, serem os factos imputados ao arguido dados como não provados, valorados a seu favor.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando a decisão proferida na Sentença recorrida e em consequência, ser substituída por douto Acórdão que absolva o Recorrente da prática do crime de violência doméstica.

    *O Mº Pº junto do Tribunal respondeu, conforme fls. 283 a 299, formulando as seguintes conclusões: 1º- Em sede de apreciação da prova, em Direito Penal, vigora o Princípio da Livre Apreciação da Prova, consagrado no artigo 127º, do Código de Processo Penal, segundo o qual, “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”, tendo ainda em consideração, no que concerne à prova testemunhal, a imediação e a oralidade com que a prova é produzida, relevando, para além do conteúdo das declarações e dos depoimentos prestados, o modo como os mesmos são assumidos pela testemunha e a forma como são transmitidos ao tribunal.

    1. - Nos presentes autos, o Tribunal procedeu à análise conjugada de toda a prova, efectuada também à luz de juízos de normalidade e experiência comum, analisando os depoimentos prestados de acordo com a oralidade e imediação, tendo o Tribunal efectuado uma correcta apreciação da prova e apuramento dos factos que considerou como provados, tal como se explicita de forma clara e complete na motivação da matéria de facto.

    2. - A circunstância de apenas a ofendida ter relatado alguns dos factos considerados como provados, designadamente os ocorridos no interior da residência comum, não obsta a que o Tribunal os considere provados. Caso contrário, estaria ao Tribunal vedado apreciar e condenar a maior parte dos crimes de violência doméstica, porquanto os mesmos pressupõe actuações que sobretudo ocorrem no interior da residência do casal e das quais não existem outras testemunhas para além das próprias vitimas.

    3. - Essencial é que o Tribunal considere o depoimento das referidas vítimas credível e verdadeiro, tendo em consideração a oralidade e a imediação com que o mesmo é produzido, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova.

    4. - Nos presentes autos, o Tribunal considerou o depoimento da ofendida credível e verdadeiro sendo que os factos ocorridos no dia 13 de Novembro (data em que o arguido por três vezes se dirigiu à residência da ofendida) foram corroborados pelas restantes testemunhas inquiridas.

    5. - Não se verificam os pressupostos previstos para a atenuação especial da pena, sendo que a pena concreta aplicada ao arguido se situa no limite mínimo da pena abstracta aplicável.

    6. - Mostram-se preenchidos os pressupostos...

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