Acórdão n.º 321/2008, de 11 de Agosto de 2008

Acórdáo n. 321/2008

Processo n. 1090/07

Acordam, na 3.ª Secçáo, do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - O presente recurso vem interposto pelo Ministério Público, com natureza obrigatória, ao abrigo do artigo 280., n. 1, alínea a) e n. 3 da CRP e dos artigos 70., n. 1, alínea a) e 72., n. 3, ambos da LTC, do acórdáo proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 03 de Outubro de 2007 (fls. 447 a 459) que recusou aplicar o "n. 7 da Portaria n. 234/97, na parte em que prevê a responsabilidade dos proprietários ou os responsáveis legais pela exploraçáo dos postos autorizados para a venda ao público do gasóleo colorido e marcado pela diferença entre o montante do ISP e IVA liquidado e pago e a que seria devida se se tratasse de gasóleo rodoviário [por ser] orgânica e materialmente inconstitucional, por violaçáo dos artigos 106., n. 2, e 168., n. 1, alínea i), da CRP, na redacçáo vigente em Abril de 1997" (fls. 459).

Entre outras consideraçóes, a decisáo recorrida entendeu que:

"[...]

A determinaçáo da incidência, subjectiva e objectiva, dos impostos bem como as suas taxas está sujeita a reserva de lei formal, nos termos dos artigos 106., n. 2, e 168., n. 1, da alínea i), da CRP, na redacçáo vigente em Abril de 1997 [103., n. 2, e 165., n. 1, alínea i), da CRP, nas redacçóes posteriores].

A parte final deste n. 7, na parte em que prevê o pagamento de ISP correspondente à venda de gasóleo rodoviário e respectivo IVA aos proprietários ou os responsáveis legais pela exploraçáo dos postos autorizados para a venda ao público do gasóleo colorido e marcado que o vendam a quem náo seja titular de cartáo com microcircuito, é uma norma que prevê o pagamento da taxa correspondente ao gasóleo rodoviário relativamente a factos tributários que náo consistem na comercializaçáo deste tipo de mercadoria, sendo desta perspectiva, uma norma definidora da incidência objectiva do ISP.

Ou, doutra perspectiva, aquele n. 7 impóe a quem náo vendeu gasóleo rodoviário o pagamento do imposto correspondente à sua comercializaçáo, na parte em que este imposto excede o correspondente à comercia-lizaçáo de gasóleo marcado e colorido, sendo, desta óptica, uma norma que define a incidência subjectiva do ISP.

Ou, ainda doutra perspectiva, aquele n. 7 reconduz -se a aplicar a taxa correspondente à comercializaçáo de gasóleo rodoviário, à comercializaçáo de gasóleo marcado e colorido, sendo, por isso, uma norma defini-dora da taxa aplicável à comercializaçáo deste tipo de gasóleo, em termos diferentes da prevista no Código, nas circunstâncias aí indicadas.

Qualquer que seja a perspectiva, a estatuiçáo contida neste n. 7 insere -se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, à face das normas constitucionais indicadas.

Assim, a constitucionalidade desta imposiçáo do pagamento da diferença de ISP e correspondente IVA, depende se ela estar contida em lei formal ou Decreto -Lei emitido ao abrigo de autorizaçáo legislativa.

No caso em apreço, constata -se que a definiçáo da tributaçáo para estas situaçóes náo estava, ao tempo em que ocorreram os factos dos autos, contida em diplomas com este valor legislativo.

Na verdade, embora o artigo 3., alínea e), preveja genericamente que sáo sujeitos passivos do imposto «as pessoas singulares ou colectivas que, em situaçáo irregular, produzam, detenham, transportem, introduzam no consumo, vendam ou utilizem produtos sujeitos a impostos», desta norma apenas decorre que, quando houver irregularidade, essas pessoas podem ser responsabilizadas pelo pagamento do imposto que deveriam cobrar e náo cobraram, relativo à mercadoria que transaccionaram, mas já náo resulta que possam ser responsabilizadas pelo pagamento de um imposto que náo devia ser cobrado pela transacçáo da mercadoria que efectivamente transaccionam.

No caso em apreço, o que foi transaccionado foi gasóleo marcado e colorido e náo gasóleo rodoviário e o imposto que deveria ser cobrado pela venda do mesmo era o correspondente ao gasóleo marcado e colorido e náo o correspondente ao gasóleo rodoviário, como resulta do n. 1 do artigo 74. do C.I.E.C. ao estabelecer que «sáo tributados com taxas reduzidas o gasóleo, o gasóleo de aquecimento e o petróleo coloridos e marcados com os aditivos definidos por portaria do Ministro das Finanças».

Isto é, náo se está perante uma situaçáo de falta de liquidaçáo do imposto devido relativamente à mercadoria vendida, pois o que foi vendido, apesar do náo cumprimento das formalidades legais, foi gasóleo marcado e colorido vendido e náo gasóleo rodoviário, e o ISP à taxa reduzida que incide sobre a comercializaçáo daquele primeiro tipo de gasóleo foi liquidada e paga. Pelo facto de náo terem sido cumpridas essas formalidades, o gasóleo referido náo deixou de ser marcado e colorido e náo passou a ser considerado gasóleo rodoviário, náo deixando de continuar a ser punida a sua utilizaçáo como gasóleo rodoviário, se eventualmente o adquirente o utilizou como tal.

Assim, com base nas normas de incidência que constam do CIEC e do CIVA náo se chega à conclusáo de que, no caso de o gasóleo marcado e colorido náo ser vendido com os requisitos e o destino legal, a taxa de ISP que deve ser aplicada (e o correspondente IVA) náo sáo que a lei prevê para a sua comercializaçáo, mas antes a taxa aplicável a qualquer outro produto petrolífero, designadamente o gasóleo rodoviário.

Ou, doutra perspectiva, náo resulta daqueles códigos que quem vendeu gasóleo marcado e colorido deva pagar algum imposto correspondente a gasóleo rodoviário, que náo vendeu.

Por outro lado, também náo é forçoso concluir, em termos lógicos, que a náo observância dos requisitos de um regime de tributaçáo privilegiado implique a aplicaçáo do regime normal, pois a puniçáo das ilegalidades cometidas na comercializaçáo pode ser eficientemente efectuada apenas com as sançóes criminais ou contra -ordenacionais...

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