Acórdão nº 3529/04.8TBMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução06 de Dezembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA instaurou uma acção contra BB pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização de € 245.671,80 – € 118.315,50 “referente a reparações dos danos infligidos ao prédio do autor, em consequência directa das obras realizadas no prédio do réu” e € 127.356,30, “referente ao valor das rendas que se venceriam até ao final do contrato de arrendamento de espaço comercial celebrado entre o autor e o seu inquilino ‘CC, Lda’ e rescindido por esta em 31 de Julho e de 2003, relativamente à loja do piso inferior do prédio do autor” , confinante com o do réu.

O réu contestou. Em síntese, reconheceu que as referidas obras tinham causado danos no prédio do autor e disse que sempre tinha estado disposto a repará-los; mas discordou da gravidade que o autor lhes atribui e da forma como pretendeu “resolver o problema”. Quanto ao contrato de arrendamento, pôs em causa que o documento junto aos autos correspondesse ao contrato efectivamente celebrado, questionou a respectiva validade por não ter sido assinado pela usufrutuária, mãe do autor e entretanto falecida, alegou que a arrendatária pôs fim ao contrato para reduzir custos e rejeitou que fosse responsável “a título de lucros cessantes”.

Requereu a intervenção acessória da empreiteira, Construções DD, Lda., que veio a ser admitida pelo despacho de fls. 199.

O autor respondeu.

Construções DD, Lda, contestou, sustentando que os trabalhos de demolição do prédio do réu, escavação e preparação do terreno foram realizados por um outro empreiteiro, “sendo que quando da sua entrada em obra tais trabalhos estavam realizados”, não tendo portanto qualquer responsabilidade nos danos em causa na acção.

Em articulado superveniente, a fls. 389, o réu veio alegar que o autor pretendia demolir parcialmente o prédio e construir um edifício novo; seguiram-se os articulados de fls. 513, 674 e 774, dando conta da evolução das obras, aos quais o autor respondeu.

Pela sentença de fls. 930, a acção foi julgada parcialmente procedente, sendo o réu condenado a pagar ao autor: “a) A quantia de €51.250,00, acrescida do montante correspondente ao IVA à taxa que se encontrar em vigor aquando do pagamento; b) A quantia de €131.601,51: e c) A quantia mensal de €1.415,17 a partir de Maio de 2011 (inclusive), até à data em que vier a ser efectuado o pagamento da quantia referida na alínea a), ou até à data em que seja atingido o montante global peticionado de €245.671,80 (se tal ocorrer primeiro do que o referido pagamento).” Em síntese, o tribunal considerou estar demonstrado que era de € 51.250,00 “o custo estimado da reparação do (…) prédio” do autor; e que, quanto às rendas que deixou de cobrar, “o lucro cessante do Autor surgiu com a cessação do contrato de arrendamento (portanto, a partir de 1/8/2003 (…), tem como medida a quantia mensal de € 1.415,07 (valor da última renda recebida pelo Autor – (…) e perdurará, pelo menos, até que o Réu lhe pague a indemnização devida pelos danos emergentes causados (a referida quantia de € 51.250,00, acrescida de IVA), embora com o limite (somatório de todos os danos) de € 245.671,80, correspondente ao montante global peticionado (princípio do pedido - Artigo 661° do C.P.C.). Até à presente data (Abril de 2011 – cfr. o disposto no Artigo 566°, n° 2, do Código Civil), o montante do dano em causa ascende a € 131.601,51 (€1.415,17 x 93 meses), à qual acresce a quantia mensal de € 1.415,17 a partir de Maio de 2011 (inclusive) até que o Réu pague ao Autor o referido montante de € 51.250,00, acrescido de IVA, ou até que a totalidade dos pagamentos que o Réu efectuar ao Autor atinja o montante global peticionado (€ 245.671,80).” O réu recorreu para o Tribunal da Relação do Porto. Pelo acórdão de fls. 1157, a apelação foi julgada parcialmente procedente: “julga-se a apelação parcialmente procedente e altera-se a sentença, confirmando a condenação na quantia constante da alínea a) do decisório, e revogando a condenação contida nas alíneas b) e c), que se substitui pela condenação do R. no pagamento da quantia de € 58.017”.

A Relação considerou que o autor tinha pedido a condenação no pagamento das rendas correspondente ao tempo que medeia “entre a saída da locatária e o termo previsto para o contrato”, o que conduzia a um limite de 90 rendas, que a sentença não observou; e que, de qualquer modo, o início das obras por parte do autor, “nos moldes em que o fez, sempre teria de suspender o contrato de arrendamento aquando do seu início”; por isso, os danos só poderiam reflectir as rendas que o autor deixou de auferir até ao início das obras (€ 58.017,00).

  1. Ambas as partes recorreram; e os recursos, aos quais não são aplicáveis as alterações introduzidas no Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, foram recebidos como revista, com efeito devolutivo.

    Nas alegações de recurso, o autor formulou as seguintes conclusões: “1º O presente recurso tem por objecto a impugnação do acórdão recorrido no que toca à decisão que estabeleceu o quantum indemnizatório a que foi condenado o réu, ora recorrido, BB a título de lucros cessantes, seja € 58.017,87 (cinquenta e oito mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos), porquanto o autor, aqui recorrente, discorda quer desse montante, por manifesto defeito quer da fundamentação – ou ausência dela – que levou àquela quantia.

    1. O pedido de indemnização formulado pelo recorrente na petição inicial tem na sua génese as obras que o recorrido realizou no seu prédio e os danos que essas mesmas obras provocaram no prédio vizinho, propriedade do recorrente.

    2. O recorrente pediu a condenação do recorrido no montante de € 118.315,50 a título de danos emergentes sofridos no seu prédio e no montante de € 127.356,30, a título de lucros cessantes resultantes da perda de rendas que deixou de auferir.

    3. O recorrente discorda do montante, do raciocínio – e da (falta) de fundamentação – em que o acórdão de que se recorre condenou o recorrido a título de lucros cessantes, seja € 58.017,87 (cinquenta e oito mil e dezassete euros e oitenta e sete cêntimos).

    4. O pedido de indemnização, formulado pelo recorrente visa compensá-lo pela frustração do ganho que ocorreu com a denúncia do contrato de arrendamento, por parte do seu inquilino "A CC, Lda.", em virtude de o seu imóvel, por causa dos danos provocados pelas obras no prédio do recorrido BB, ter deixado de reunir as condições necessárias para que a aludida sociedade comercial continuasse a desenvolver, naquele local, a sua actividade.

    5. O montante de € 127.356,30 peticionado pelo recorrente corresponde ao valor das rendas mensais que o recorrido deixou de auferir desde o último pagamento de renda realizado pela "CC, Lda.", em Julho de 2003, até ao final do contrato de arrendamento, seja 31 de Dezembro de 2010 (€ 1.417,07 X 90 meses = € 1-27.536,30} 7º O tribunal de primeira instância condenou o recorrido no pagamento ao recorrente, a título de lucros cessantes, das seguintes quantias: '... b) A quantia de € 131.601,51; c) A quantia mensal de € 1.415,17, a partir de Maio de 2011 (inclusive), até à data em que vier a ser efectuado o pagamento da quantia referida na alínea a), ou até à data em que seja atingido o montante global peticionado de € 245.671,80 (se tal ocorrer primeiro do que o referido pagamento)'.

    6. O Acórdão recorrido revogou esta parte da sentença substituindo-a pela condenação do recorrido no pagamento ao recorrente do montante de € 58.017,87, a título de lucros cessantes.

    7. A causa de pedir que subjaz ao valor peticionado a título de lucros cessantes, seja €127.536,30, "... é a interrupção do percebimento das rendas entre a saída do locatário e o termo previsto para o contrato (cfr. art.s 24º, 25º, 33º e 48º da p.i.).".

    8. O recorrente, com o devido respeito, discorda do montante e dos fundamentos com que o acórdão recorrido condenou o recorrido ao pagamento da indemnização a título de lucros cessantes.

    9. O acórdão recorrido violou o artigo 564º do Código Civil, no que tange ao direito à indemnização do recorrente, a título de lucros cessantes, na medida em que a indemnização em que o recorrido foi condenado não compensa o recorrente da totalidade dos lucros que deixou de auferir em consequência dos danos infligidos no seu prédio pelas obras realizadas no prédio do recorrido.

    10. A indemnização, a título de lucros cessantes, a atribuir ao recorrente, e que foi solicitada, teria de compensá-lo pela totalidade dos lucros cessantes que efectivamente teve, seja € 127.536,30, correspondentes às noventa rendas mensais que deixou de auferir até ao final do contrato de arrendamento celebrado com a CC, Lda, que ocorreria em 31 de Dezembro de 2010.

    11. Em razão dos danos provocados no seu prédio e da denúncia do contrato de arrendamento, o recorrente viu o seu ganho frustrado em € 127.536,30, valor correspondente às 90 rendas que deixou de receber desde a denúncia do contrato de arrendamento até ao termo previsto para a vigência desse contrato.

    12. As obras que o autor, ora recorrente, realizou no seu prédio foram obras forçadas e urgentes, que se ficaram a dever à extensão dos danos que foram infligidos no seu prédio e ao perigo que esses danos representavam para esse mesmo imóvel, facto que o próprio acórdão recorrido reconhece.

    13. O recorrente alegou e demonstrou, como ficou reconhecido em primeira instância assim como pelo acórdão recorrido, a urgência em realizar obras urgentes no seu prédio, bem assim que as obras que submeteu a apreciação junto da Câmara Municipal de Matosinhos não alteram a volumetria do edifício e se traduziam na remodelação da compartimentação interior do R/chão e do lº Andar.

    14. Do acórdão recorrido não resulta o raciocínio lógico que levou à fixação do montante indemnizatório em que o recorrido foi condenado.

    15. O acórdão recorrido não especifica qual a previsão normativa em que se baseia para fixar tal indemnização.

    16. O acórdão recorrido padece de omissão da fundamentação de facto e de direito...

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