Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2013, de 15 de Janeiro de 2013

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2013 Revista nº 772/10.4TVPRT.P1.S1 Acordam no Pleno das Secções Cíveis deste Supremo Tribunal de Justiça: I - ROSA CRISTINA SILVA FERREIRA JORGE instaurou contra o INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL, I.P., ao abrigo do disposto na Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, ac- ção destinada ao reconhecimento da titularidade do direito a obter prestações sociais por óbito de António Fernando Ferreira Vieira, ocorrido em 6 de Agosto de 2008, bene- ficiário da Segurança Social, com quem vivia em união de facto desde 1997. O R. contestou e concluiu pela improcedência do pedido.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença que julgou a acção improcedente com fundamento na falta de prova da situação de necessidade de alimentos e da impossibilidade de a Autora os obter de terceiros.

Nela se considerou ainda que era inaplicável o novo regime legal instituído pela Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto, que alterou o que constava da redacção original da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio.

A Autora apelou mas, com um voto de vencido, o Tri- bunal da Relação do Porto confirmou a sentença com os mesmos fundamentos.

Interpôs a Autora recurso de revista no qual concluiu essencialmente que:

  1. Depois da Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto, que alte- rou a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, deixou de ser exigida a necessidade de alimentos do companheiro sobrevivo para beneficiar da protecção social, tendo a Autora direito às prestações sociais por morte do beneficiário da Segurança Social com quem vivia em união de facto.

  2. A protecção social prevista na al.

  3. do art. 3.º e no art. 6.º da Lei n.º 7/01, de 11 de Maio, na redacção intro- duzida pela Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto, tem lugar também relativamente ao que já era membro sobrevivo da união de facto ao tempo da entrada em vigor desta.

  4. A Lei n.º 23/2010 tem natureza interpretativa, pelo que se integra na lei interpretada, tendo, pois, efeitos retroactivos.

    E mesmo que assim se não entendesse, seria pelo menos aplicável, nos termos do art. 12.º, n.º 2, 2ª parte, do Código Civil, às situações semelhantes à do recorrido, em que o beneficiário da Segurança Social faleceu antes da entrada em vigor da Lei n.º 23/2010, dado que esta lei veio dispor directamente sobre o conteúdo da relação/situação jurídica em causa, abstraindo do facto que lhe deu origem.

  5. No acórdão recorrido foram violadas as normas le- gais supra referidas pela recorrente, tendo o acórdão feito uma errónea interpretação e aplicação da lei pertinente aos factos provados, bem como desrespeitou as normas e os princípios constitucionais relativos à igualdade dos cida- dãos, à protecção da família e à segurança social, previstos, nomeadamente, nos arts. 13.º, 36.º, 63.º e 67.º da CRP. Nas suas contra-alegações a entidade recorrida defendeu simplesmente a manutenção do acórdão recorrido.

    Ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 732º-A do CPC, foi determinado pelo Exmº Presidente do Supremo Tribunal de Justiça o julgamento ampliado da revista.

    O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal de Justiça emitiu Parecer no qual suscitou a in- competência material do Supremo Tribunal de Justiça, concluindo que, “no quadro de aplicação do novo regime de protecção das uniões de facto, instituído pela Lei 23/2010, de 30 de Agosto, são os tribunais judiciais incompetentes, em razão da matéria, para conhecer de qualquer pedido de tutela jurisdicional, designadamente nos casos em que o pedido fora inicialmente destinado à atribuição de pensão de sobrevivência, ao abrigo do disposto nos arts. 8º do Dec.

    Lei nº 322/90, de 18 de Outubro, e 6º da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, na redacção originária, bem como no art. 3º do Decreto Regulamentar 1/94”. Quanto à questão da uniformização de jurisprudência, concluiu que, “a querer, porventura, conhecer-se do pe- dido, deverá, então, conceder-se a revista, revogando-se o segundo segmento decisório da Relação e, a final, uni- formizada jurisprudência neste outro sentido: «O novo regime de protecção das uniões de facto, insti- tuído pela Lei 23/2010, de 30 de Agosto, designadamente no que respeita aos direitos e prestações previstos nos arts. 8º do DL 322/90, de 18 de Outubro e 6º da Lei 7/2001, de 11 de Maio, na nova redacção, aplica-se às situações em que o óbito do beneficiário haja ocorrido em momento anterior ao início de vigência daquela mesma lei»”. Foram processados os vistos.

    Cumpre decidir.

    II – Questão prévia: Ainda que a intervenção do Ministério Público nos recursos de revista submetidos a julgamento ampliado, nos termos dos arts. 732º-A e 732º-B do CPC, tenha fun- damentalmente por objectivo obter Parecer sobre a questão de direito “que origina a necessidade de uniformização de jurisprudência” (nº 1 do art. 732º-B), foi preliminarmente suscitada pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto a excepção de incompetência material deste Supremo Tribunal de Justiça, tendo em conta o novo regime legal decorrente da Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto.

    Centrados na necessidade de uniformizar o entendimento jurisprudencial relativamente à questão da aplicabilidade da Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto, a situações emergentes de óbitos ocorridos antes da sua entrada em vigor, não pode negar-se a possibilidade de, através daquela especial forma de julgamento, se concretizar tal desiderato.

    A questão cuja resposta se pretende uniformizar surgiu em momento ulterior ao da propositura da acção, mais precisamente com a prolação da sentença de 1ª instân- cia, depois de ter sido realizado julgamento que incidiu sobre factos que a Autora alegara como fundamento da sua pretensão deduzida no âmbito da acção declarativa (a decorrer “perante os tribunais cíveis”) proposta ao abrigo da redacção original do art. 6º da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio.

    Até então, o objecto do litígio, através do qual essencialmente se define a competência material, esteve unicamente centrado na apreciação dos pressupostos do reconhecimento do direito à atribuição de pensão por morte do beneficiário da Segurança Social, pedido esse que, a ser satisfeito, nos termos em que foi formulado pela Autora, não ficaria sujeito à restrição temporal imposta...

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