Acórdão nº 403/08 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução29 de Julho de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 403/2008

Processo n.º 224/2008

  1. Secção

    Relator: Carlos Fernandes Cadilha

    Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

    I. Relatório

    1. Nos presentes autos de impugnação judicial, a impugnante A., S. A. interpôs recurso por oposição de julgados, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, da decisão nesses autos proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 4 de Julho de 2007.

    No tribunal recorrido, por despacho do relator datado de 1 de Outubro de 2007, foi o recurso julgado findo, com invocação do disposto no artigo 284º, n.º 5, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), por se ter entendido que não se verificava a identidade de situações de facto que constituía um dos necessários pressupostos do recurso.

    A impugnante deduziu então reclamação para a conferência, pedindo a final que fosse proferido acórdão que reconheça a existência de oposição de julgados, com o consequente prosseguimento para alegações, e, em alternativa, se declare inconstitucional o n.° 5 do artigo 284.° do CPPT por permitir que seja o Tribunal a quo a verificar a oposição de julgados, por violação do artigo 165°, n.° 1, alínea p), da Constituição da República, por se ter alterado a competência dos tribunais nesta matéria sem a necessária autorização legislativa, e ainda por violação do princípio da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva consagrada nos artigos 2.º e 20.° da mesma Lei Fundamental.

    Em conferência, pelo acórdão de 22 de Janeiro de 2008, o Tribunal Central Administrativo Sul julgou improcedente a reclamação, fundamentando a sua posição quanto à suscitada questão de constitucionalidade, nos seguintes termos:

    […]

    E, sobre a questão da competência para conhecer da oposição de acórdãos ser do STA, pelo que o art. 284°, n° 5 do CPPT é inconstitucional por violação do art. 165°, n°1, alínea p) da CRP e princípios constitucionais da proporcionalidade e tutela jurisdicional, louvamo-nos, com a devida vénia, na douta resposta da recorrida FªPª.

    Na verdade, como é entendimento do Tribunal Constitucional, importa distinguir entre as intervenções legislativas directamente votadas à definição da competência e as que, inscrevendo-se no domínio da regulamentação processual, todavia acabam por interferir apenas indirecta, acessória e necessariamente com aquela competência; as primeiras são normas de competência e as segundas, puras normas de processo.

    E "A Constituição distingue com nitidez entre a matéria da competência e a matéria do processo; qualquer que seja o nível ou grau de definição da competência dos tribunais, reservado à Assembleia da República seguramente que nele não entram as modificações da competência judiciária a que deva atribuir-se simples carácter processual" (Acds do TC n° 400/87 in D. Rep., 2a série de 21/Dez/87 e n° 329/89, ibidem, de 22/Jun/89);

    "Por outro lado, tem o mesmo Tribunal entendido não haver invasão da reserva de competência da Assembleia da República quando se não altera a prévia distribuição de competência entre as várias ordens de tribunais (tributários e judiciais)";

    A necessidade de autorização legislativa apenas é exigível se ocorre modificação das regras de competência judiciária material, com natural reflexo na distribuição das matérias pelas diversas espécies de tribunais" -cfr. Acd. n° 114/00 in Acd do TC, pág. 415;

    Assim, é o Relator do TCA que terá de apreciar todas as questões atinentes quer à própria admissibilidade do recurso quer à efectiva existência de oposição de acórdãos, podendo julgar o recurso deserto, findo ou sem efeito – conforme os casos -, ou ordenando o seu prosseguimento, nos precisos termos do art° 284° do CPPT, sem que isso constitua violação da CRP.

    Este entendimento tem sido também o perfilhado pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, designadamente nos Acórdãos de 29/10/2003 e 26/11/2003, nos processos 01234/03 e 01559/03 (de que, aliás, retirámos as transcrições de acórdãos do TC acima reproduzidas).

    Assim, não se encontrando preenchidos os pressupostos para a aceitação do presente recurso com fundamento em oposição de julgados, deve o mesmo ser rejeitado, confirmando-se a validade da interpretação do douto Despacho recorrido e considerando improcedente a presente reclamação.

    E o artigo 284° do CPPT não sofre de qualquer inconstitucionalidade por permitir uma eventual decisão do TCAS sobre a não verificação da invocada oposição de acórdãos.

    A impugnante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70°, n° 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT com fundamento em inconstitucionalidade orgânica e violação do princípio da proporcionalidade e do direito à tutela jurisdicional efectiva, e ainda a inconstitucionalidade da norma do artigo 62°, n.° 1, do Código do IRC, na versão vigente em 1996, na interpretação segundo a qua «a Administração Tributária encontra-se vinculada a aplicar o regime da neutralidade fiscal, quando (...) o contribuinte não opte pelo regime normal de tributação».

    Tendo sido admitido o recurso, a recorrente formulou, nas suas alegações, as seguintes conclusões:

  2. A norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT, introduzido pelo Decreto-Lei n.° 433/99, de 26 de Outubro, que atribui ao tribunal a quo competência para o julgamento da questão preliminar da existência de oposição de acórdãos e, com base nessa apreciação em concreto, decidir, por assim dizer «em causa própria», do prosseguimento de recurso com fundamento nessa oposição, é inconstitucional.

  3. Através da norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT, foi alterada uma competência, a relativa ao julgamento preliminar da existência da oposição de acórdãos, que antes era do Supremo Tribunal Administrativo, e passou agora a ser do tribunal recorrido, no caso dos autos o TCA Sul

  4. A norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT, ao afectar, sem a necessária credencial parlamentar, a prévia distribuição de competências entre tribunais administrativos e tribunais tributários no que toca ao «seguimento» do recurso por oposição de julgados, viola o actualmente disposto no artigo 165°, n.° 1, alínea p), da Constituição.

  5. A norma do artigo 284º, n.° 5, do CPPT reduz injustificadamente, e em sentido contrário às exigências da proporcionalidade, o alcance e efectividade de um tipo de recurso previsto na lei, por comparação com o anterior regime legalmente consagrado.

  6. A luz do regime em vigor aquando da instauração do presente processo, a lei admitia a interposição de recurso por oposição de acórdãos, no âmbito do qual a decisão sobre o «seguimento» do mesmo cabia ao Supremo Tribunal Administrativo, em toda uma categoria de casos, excluindo tal competência, em virtude do disposto na norma impugnada, apenas quando estivessem em causa matérias do contencioso tributário essencialmente relacionadas com a liquidação de tributos, casos em que o «seguimento» do recurso caberia ao Tribunal a quo.

  7. Ao restringir o alcance do recurso por oposição de julgados para uma categoria de casos delimitados sem justificação objectiva, a norma do artigo 284°, n.° 5, do CPPT viola os...

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