Acórdão nº 486/12 de Tribunal Constitucional (Port, 24 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelCons. João Cura Mariano
Data da Resolução24 de Outubro de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 486/2012

Processo n.º 403/12

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório

Por acórdão de 11 de março de 2011, da 2.ª Secção do Juízo de Grande Instância Criminal da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, o arguido A. foi condenado, em cúmulo jurídico, pela prática, como autor material e em concurso real, de 5 crimes de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, de 5 de crimes de violação de correspondência, previsto e punido pelo artigo 194.º, n.º 1, do Código Penal, de 5 crimes de falsificação de documento, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30.º, n.º 2, 79.º, 256.º, n.º 1, alínea c) e n.º 3, do Código Penal, e de 5 de crimes de burla qualificada, previsto e punido pelos artigos 30.º, n.º 2, 79.º, 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena única de 6 anos de prisão.

O arguido recorreu deste acórdão para o Tribunal da Relação de Lisboa e, por decisão sumária proferida pelo Desembargador Relator em 20 de dezembro de 2011, foi rejeitado o recurso por extemporâneo.

Notificado desta decisão, o arguido reclamou para a conferência, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão proferido em 28 de fevereiro de 2012, confirmado a decisão sumária.

Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, não tendo o recurso sido admitido com fundamento no disposto no artigo 432.º, n.º 1, alíneas a), b) e) e d), a contrario, do Código de Processo Penal.

O arguido reclamou para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão de não admissão do recurso e, por despacho de 12 de maio de 2012 do Conselheiro Vice-Presidente daquele Tribunal, a reclamação foi indeferida.

O arguido recorreu então para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos:

A., reclamante, melhor id. nos autos do processo, supra referenciado, notificado da douta decisão que indeferiu a sua reclamação do acórdão proferido em 28.02.2012, pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão sumária de rejeição do recurso por extemporâneo, não se conformando com essa decisão e tendo legitimidade, dela vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do art. 280º, nº 1 alíneas a) e b) da Constituição da República Portuguesa; art. 70º, nº 1, alíneas a) e b) e nº 2 e nº 3, art. 72º, nº 1, alínea b), art. 75º, nº 1 e 75º-A, todos estes da Lei Orgânica sobre a Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei nº 28/82 de 15 de novembro e posteriores alterações, com os seguintes fundamentos:

1. Nos termos do art. 432º, nº 1, b) do Código de Processo Penal (CPP) é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400º.

2. O arguido foi condenado por factos em data não concretamente apurada, situada entre 8 de setembro de 2003 e 16 de junho de 2004.

3. Na data da ocorrência dos factos estava em vigor o CPP com a redação que lhe fora dada pelo DL 324/2003 de 27 de dezembro.

4. Nessa redação, não era admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não ponham termo à causa [art. 400º, nº 1 c)], sublinhado nosso.

5. Ora, o acórdão de rejeição liminar do recurso, por extemporâneo, proferido por este Venerando Tribunal da Relação de Lisboa põe, manifestamente, termo à causa. Por conseguinte, o recurso é manifestamente admissível, a contrario.

6. Por outro lado, a decisão ora recorrida fundamenta que a interpretação normativa adotada do art. 5º, nº 2 a) do CPP não viola o nº 1 do art. 32º da CRP por se bastar com um grau de recurso, ou segundo grau de jurisdição, que o reclamante utilizou ao recorrer para o Tribunal da Relação.

7. Salvo o devido respeito, o acórdão que decidiu rejeitar liminarmente o recurso impediu justamente ao arguido o segundo grau de jurisdição.

8. Porquanto, foi essa interpretação inconstitucional que motivou a aplicação da lei processual penal em vigor na data da sentença que motivou essa rejeição liminar e não na data em que os factos foram cometidos.

9. Pois que, se o acórdão que rejeitou liminarmente o recurso tivesse aplicado a legislação processual penal em vigor na data da ocorrência dos factos pelos quais o arguido foi condenado o recurso nunca poderia ter sido liminarmente rejeitado.

10. Decorre da fundamentação invocada na douta decisão de indeferimento da reclamação que a mesma não aplicou ao recurso o art. 400º, nº 1, alínea c) na redação que lhe fora dada pelo DL 324/2003 de 27 de dezembro.

11. Nessa medida, e por não ter aplicado ao recurso essa disposição legal, o despacho recorrido fez inadequada e inconstitucional interpretação do art. 5º, nº 2 a) do CPP que manda aplicar ao processo penal a legislação em vigor na data da ocorrência dos factos, quando da sua não aplicabilidade possa resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação do arguido, nomeadamente, uma limitação do seu direito de defesa, por violação dos art. 29º, nº 4 e 32º, nº 1, da CRP.

12. Por outro lado, ao ter aplicado, como fundamento de indeferimento da reclamação, essa mesma disposição legal na redação atualmente em vigor, o despacho recorrido fez inadequada e inconstitucional interpretação do art. 5º, nº 2 a) do CPP que proíbe a aplicação da lei processual penal aos processos iniciados anteriormente à sua vigência, quando da sua aplicabilidade possa resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação do arguido, nomeadamente, uma limitação do seu direito de defesa, por violação dos art. 29º, nº 4 e 32º, nº 1, da CRP.

Foi proferida decisão sumária, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, por se ter considerado que a questão em causa revestia simplicidade, por já ter sido objeto de decisão anterior do Tribunal, em que se não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de ser aplicável o novo regime de recursos previsto na Lei n.º 48/2007 (nomeadamente a alínea c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP) aos processos em que a primeira decisão condenatória tenha sido proferida depois da entrada em vigor da referida Lei, mesmo que o processo se tenha iniciado em data anterior, tendo-se julgado improcedente o recurso.

Foi a seguinte a fundamentação desta decisão:

“O recorrente pretende ver sindicada a constitucionalidade da norma do artigo 5.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Penal quando interpretado no sentido de ser aplicável o novo regime de recursos previsto na Lei n.º 48/2007 (nomeadamente a alínea c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP) aos processos em que a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT