Acórdão nº 0840087 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Junho de 2008
Data | 18 Junho 2008 |
Órgão | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Tribunal da Relação do Porto 4ª secção (2ª secção criminal) Proc. nº 87/08-4 Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO: Nos autos de processo abreviado nº ..../05.5GAVNF, do .º Juízo de Competência Criminal de Vila Nova de Famalicão, após julgamento com documentação da prova produzida em audiência, foi proferida sentença em que se decidiu nos seguintes termos: (...) Pelo exposto e sem mais considerações, decide-se julgar procedente a acusação e, em consequência: - condena-se o arguido B.......... pela prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.348º, nº.1, al.b) do C.P., na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 4 €uros, o que perfaz a quantia total de 200 €uros.
(...).
Inconformado, o arguido interpôs recurso, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões:
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No caso "sub Judice", o Recorrente foi condenado como autor material de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348.°, nº1, alínea b), do Código Penal, na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de 4 €, o que perfaz a quantia total de 200 €.
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Todavia, verifica-se insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e contradição insanável entre a fundamentação e a decisão (alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 410° do Código de Processo Penal), ao dar-se por assente que o tribunal formou a sua convicção atendendo "para além do correlacionamento de toda a prova produzida: - nas declarações do arguido, apenas na parte relativa à sua situação pessoal e à sua convicção de que o caminho lhe pertence; - no teor dos depoimentos das testemunhas inquiridas, com destaque para: C.......... e D.........., agentes da GNR que se deslocaram ao local e relataram a forma como actuaram, a ordem dada e a cominação feita, bem como a forma como actuou o arguido, a sua recusa, o facto de dizer que o caminho era dele e que o mesmo caminho aparentava ser (sendo em alcatrão e com luz pública); e as testemunhas de defesa inquiridas que na sua generalidade afirmaram tratar-se de um caminho de servidão, tendo ainda atestado o habitual bom comportamento do arguido ..." sic).
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Efectivamente, na Audiência de Discussão e Julgamento apurou-se e considerou-se provado que o agente C.......... se voltou para o arguido e advertiu-o que se prosseguisse com a recusa em retirar do local o seu veículo incorria na prática de um crime de desobediência; D) E que o Arguido/Recorrente se negou a dar cumprimento a tal imposição, mostrando-se preenchidos os requisitos objectivos deste tipo de crime; E) Contudo, resultou também como provado que o Arguido/Recorrente adoptou a conduta referenciada nos autos, uma vez que não considerava tal ordem legítima, por convicto e com a consciência de que o caminho onde tinha estacionado o seu veiculo tractor, identificado nos autos, era da sua propriedade - convicção que ainda hoje permanece.
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Mais concretamente, resultou como provado que "o arguido, aquando dos factos supra referidos e ainda hoje, tem a convicção de que o caminho em causa nos autos é de sua propriedade, servindo apenas de passagem para prédios seus e outro, que não aquele onde se efectuavam as obras supra referida" - Ponto 15, dos factos provados, transcrito no artigo 3° das Alegações.
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Assim, foi incorrectamente considerado e fundamentado pela douta sentença proferida e de que ora se recorre que "a tipicidade objectiva e subjectiva deste tipo legal de crime se encontra preenchida pela conduta do arguido, sendo-lhe assim imputável a prática do crime de desobediência, a título de dolo directo (cfr. Artigo 14°, nº1do CP).
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Com efeito, compulsada a prova produzida, designadamente, as declarações do arguido, na parte da sua convicção de que o caminho lhe pertence e no teor dos depoimentos das testemunhas inquiridas, com destaque para: C.......... e D.........., agentes da GNR que se deslocaram ao local e relataram a forma como actuaram, a ordem dada e a cominação feita, bem como a forma como actuou o arguido, a sua recusa, o facto de dizer que o caminho era dele e o que o mesmo caminho aparentava ser, e nos quais assentou a convicção do tribunal "a quo", a mesma impunha a absolvição do Arguido, pois que não existe prova absolutamente nenhuma que permitisse ao Tribunal considerar que o mesmo agiu com dolo ou qualquer tipo de culpa, não se verificando o elemento subjectivo do crime de desobediência, que permita a aplicação de uma pena ao Arguido.
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Reitere-se, que o Arguido/Recorrente desconhecia a ilicitude do seu acto, não se sentido obrigado a adoptar o comportamento em consonância com a ordem que lhe fora imposta; J) Uma vez que, na sua convicção, tinha o seu veículo tractor agrícola devidamente estacionado, num caminho que considera de sua propriedade, colocando em causa a legitimidade da ordem emanada.
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Destarte, tal circunstância - o facto (considerado como provado) do Recorrente estar convicto do seu direito de propriedade sobre o caminho onde estacionou o veículo tractor, nos autos identificado -, coloca o Arguido no erro sobre a ilicitude, previsto no artigo 17.°, do Código Penal; L) Que no caso presente, não é censurável, pois compreende-se que o Recorrente, que, desde há longos e vários anos, vem exercendo o seu direito de propriedade sobre o sobredito caminho, fundamentando a existência de tal direito em documentos, atempadamente juntos aos autos, esteja convencido e convicto que a ordem emanada não era legitima.
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De facto, a autoridade policial, sem mandado judicial, não tem legitimidade para impor e emanar ordens, contrárias à vontade do titular do direito de propriedade.
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Assim, resulta claramente dos autos que o aqui Recorrente actuou sem consciência da ilicitude do facto...
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