Acórdão nº 223/11 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Maio de 2011

Data03 Maio 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 223/2011

Processo n.º 472/10

  1. Secção

Relator: Conselheira Maria João Antunes

Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que é recorrente o Ministério Público e são recorridas A. e B., foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 16 de Março de 2010.

    2. As recorridas deduziram oposição à execução, através de peça processual com assinatura electrónica de um dos mandatários. Posteriormente, o outro mandatário declarou a sua adesão ao conteúdo material de tal peça. Por despacho de 17 de Fevereiro de 2009 do Tribunal Judicial de Valença decidiu-se o seguinte:

      Uma vez que a adesão do Ilustre Mandatário de fls. 46 e 47 é intempestiva, nos termos do artigo 12º, n.º 1, alínea a) e 3, considero a petição inicial como não apresentada e consequentemente determino a anulação da respectiva distribuição

      .

    3. Deste despacho foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, que acordou em recusar a aplicação de norma do n.º 3 do artigo 12.º da Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro, por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, e 112.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), com a seguinte fundamentação:

      Alegam as recorrentes que a oposição à execução não configura uma petição inicial, mas antes uma contestação ao requerimento executivo não lhe sendo pois aplicável o disposto na Portaria e ainda que não pode uma norma inserta numa portaria (art. 12º da Port nº118/2008) sobrepor-se a um dispositivo anterior que faz parte do CPC (art.40º), pois estar-se-ia a subverter o princípio da hierarquização das normas jurídicas plasmado no art. 112º da CRP.

      É inegável que é na oposição à execução que o executado faz valer a sua pretensão que é precisamente a extinção desta. - art. 817º n.º4 CPC

      Como já se disse nesta Relação (…)

      O requerente de oposição não pode pois considerar-se como petição inicial.

      Como se referiu supra não há que anular a distribuição porque a mesma não existe.

      Mas deve-se considerar a oposição (peça) não apresentada atenta a segunda parte do n.º 3 do art.12º da Portaria?

      A não apresentação) de uma petição não impede o A de apresentar outra em momento posterior, pelo que o seu direito fica salvaguardado.

      A não apresentação da oposição à execução determina a impossibilidade de qualquer defesa por parte do executado, atento o disposto no n.º l al a) do art. 817ºdo CPC.

      As recorrentes invocam a inconstitucionalidade do preceito por violação do arc. 112º da CRP.

      O envio de peças processuais por via electrónica está previsto no art. 138º-A do CPC.

      O artigo 138.º -A, do Código de Processo Civil, introduzido neste diploma pelo artigo 2.º da Lei n.º 14/2006, com a redacção resultante do Decreto -Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, passou a dispor no seu n.º 1, que «a tramitação dos processos é efectuada electronicamente em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça».

      Este novo dispositivo consagrou uma importante mudança na forma de registo dos actos praticados em processo civil, preterindo-se o suporte em papel, em favor de um sistema informático, denominado por CITIUS, no prosseguimento duma política visando uma progressiva desmaterialização dos processos judiciais.

      (…)

      No seguimento do disposto no artigo l38.º -A, do CPC, veio a ser aprovada a Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro - entretanto, já alterada pelas Portarias n.º 457/2008, de 20 de Junho, n.º l538/2008,de 30 de Dezembro e n.º 974/2009 de 01 de Setembro - a qual veio dispor sobre várias matérias atinentes à tramitação electrónica dos processos, nomeadamente: apresentação de peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados (artigos 3.º a 14.º -C; distribuição por meios electrónicos (artigos l5.º e l6.º); actos processuais de magistrados e funcionários em suporte informático (artigos l7.º a 2l.º); notificações (artigos 2l.º -A a 21.º -C), consulta electrónica de processos (artigo 22.º); organização do processo (artigo 23.º); e comunicações entre tribunais (artigos 24.º e 25.º).

      Como resulta do disposto no art. l38º-A a portaria destina-se a regular a tramitação electrónica dos processos.

      E, ao considerar a peça processual como não apresentada, a portaria regula matéria que não respeita à mera tramitação electrónica, pois sanciona o incumprimento com a preclusão do direito das recorrentes à defesa.

      O art. 112º da CRP estipula quais os actos normativos existentes na ordem jurídica e dentro destes os regulamentos.

      Como refere Carlos Blanco de Morais in Curso de Direito Constitucional, Tomo I, 108, na graduação hierárquica dos regulamentos a Portaria surge depois da Resolução do Conselho de Ministros e do Decreto Regulamentar.

      O CPC sanciona em vários preceitos a falta de cumprimento de prazo (art. 145º), de pagamento de taxa de justiça ( art. 467º e 486º-A).

      O disposto no art. 12º n.º 3 da Portaria exorbita a sua função pois não pode considerar-se como matéria secundária uma sanção (que é afinal do que se trata) que inviabiliza a defesa dos recorrentes.

      Este preceito viola pois os art. 112º e 20º n.º1 da CRP motivo pelo qual se entende não ser de aplicar

      .

    4. Desta decisão foi interposto o presente recurso para apreciação do:

      Art. 12, nº3 da Portaria nº 114/2008 de 06/02 – Apresentação de peças processuais por mais de um mandatário 1 – (...), 2 – a) ..., b) No prazo máximo de dois dias após a distribuição do processo, no caso de requerimento, petição inicial ou petição inicial conjunta, ou após a recepção da peça processual enviada, nos demais casos, os mandatários indicados no formulário enviam, através do CITIUS, uma declaração electrónica de adesão à peça, assinada digitalmente. (…); 3 - Nos casos de não adesão por parte dos mandatários indicados no formulário no prazo fixado na alínea b) do número anterior, considera-se que a peça processual não foi apresentada e anula-se a respectiva distribuição nos casos de requerimento, petição inicial ou petição inicial conjunta”.

      - Na interpretação: “... ao considerar a peça processual como não apresentada, a Portaria regula matéria que não respeita à mera tramitação electrónica, pois sanciona o incumprimento com a preclusão do direito doas recorrentes à defesa. (...) O disposto no art. 12, nº3 da Portaria exorbita a sua função pois não pode considerar-se como matéria secundária uma sanção (que é afinal do que se trata) que inviabiliza a defesa dos recorrentes. Este preceito viola, pois, os artigos 112 e 20, nº1 da CRP motivo pelo qual se entende não ser de aplicar”

      .

    5. Convidado a indicar, com precisão, a norma cuja aplicação foi recusada na decisão recorrida, o recorrente respondeu o seguinte:

      O presente recurso, obrigatório, foi interposto, pelo Ministério Público, ao abrigo dos artigos 70º, nº 1, alínea a), 72º, nºs 1, alínea a) e 3, e 75º - A, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro” (cfr. fls. 100 dos autos), do Acórdão, de 16 de Março de 2010, do Tribunal da Relação de Guimarães (cfr. fls. 88-94 dos autos).

      Em causa, no presente recurso de constitucionalidade, o art. 12º, nº 3 da Portaria 114/2008, de 6 de Fevereiro, com a seguinte redacção (cfr. fls. 101 dos autos):

      “3. Nos casos de não adesão por parte dos mandatários indicados no formulário no prazo fixado na alínea b) do número anterior, considera-se que a peça processual não foi apresentada e anula-se a respectiva distribuição nos casos de requerimento, petição inicial ou petição inicial conjunta.”

      No Acórdão recorrido, com efeito, refere-se, a propósito desta disposição (cfr. fls. 92-93 dos autos) (destaques do signatário):

      “A não apresentação de uma petição não impede o A de apresentar outra em momento posterior, pelo que o seu direito fica salvaguardado.

      A não apresentação da oposição à execução determina a impossibilidade de qualquer defesa por parte do executado, atento o disposto no nº 1 al a) do art. 817 do CPC.

      As recorrentes invocam a inconstitucionalidade do preceito por violação do art. 112º da CRP.

      O envio de peças processuais por via electrónica está previsto no art. 138º - A do CPC.

      O artigo 138º - A, do Código de Processo Civil, introduzido neste diploma pelo artigo 2º da Lei nº 14/2006, com a redacção resultante do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, passou a dispor no seu nº 1, que «a tramitação dos processos é efectuada electronicamente em termos a definir por portaria do Ministro da Justiça».

      Este novo dispositivo consagrou uma importante mudança na forma de registo dos actos praticados em processo civil, preterindo-se o suporte em papel, em favor de um sistema informático, denominado por CITIUS, no prosseguimento duma política visando uma progressiva desmaterialização dos processos judiciais.

      Conforme se explicou no preâmbulo do Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, «estabelece ainda o Programa do XVII Governo Constitucional enquanto objectivo fundamental a inovação tecnológica da justiça, para a qual é essencial a adopção decisiva dos novos meios tecnológicos. No âmbito da promoção desta “utilização intensiva das novas tecnologias nos serviços de justiça, como forma de assegurar serviços mais rápidos e eficazes”, define-se como objectivo “a progressiva desmaterialização dos processos...

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