Acórdão nº 37/11 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Joaquim de Sousa Ribeiro
Data da Resolução25 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 37/2011

Processo n.º 957/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente a EP – Estradas de Portugal, S.A. (por sucessão legal nos direitos e obrigações de EP - Estradas de Portugal, EPE) e recorrida A., Lda., foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), para apreciação da inconstitucionalidade da interpretação do artigo 25.º, n.º 2, alínea a), do Código das Expropriações, no sentido de “classificar como solo apto para construção um solo abrangido em plano director municipal por área florestal estruturante”, por violação do princípios da igualdade (artigo 13.º da CRP) e da justa indemnização (artigo 62.º da CRP).

    2. Dos autos emergem os seguintes elementos, relevantes para a presente decisão:

      Na sequência de declaração de utilidade pública (DUP) de parcelas de terreno necessárias à execução da obra de concessão da SCUT do Grande Porto (A42-IC25) – Lanço Nó da Ermida – Paços de Ferreira, foi expropriada, entre outras, uma parcela de terreno pertencente a A., Lda.

      A referida parcela de terreno é composta por três sub-parcelas, designadas por parcelas n.ºs 86.1, 86.2 e 86.5, as quais estão classificadas no Plano Director Municipal (PDM) de Paços de Ferreira (publicado no Diário da República, I Série B, de 23 de Junho de 1994): as duas primeiras como “Área Florestal Estruturante”; e a terceira como “Área Florestal em REN”.

      A expropriada A., Lda. adquiriu o prédio do qual a parcela expropriada é a destacar, por compra, mediante escritura de compra e venda realizada em 16.12.2002.

      Na sequência da DUP, a entidade beneficiária da expropriação, EP - Estradas de Portugal, EPE, entrou na posse administrativa do prédio.

      Após arbitragem, foi proferido acórdão arbitral, fixando em 109.347,91€ o valor da indemnização a pagar à referida proprietária da parcela expropriada, tendo esta interposto recurso judicial desse acórdão.

      Por sentença do Tribunal Judicial de Paços de Ferreira, o recurso foi julgado parcialmente procedente, sendo fixado o valor de 478.065€, a título indemnizatório.

      A expropriada, A., Lda, e a entidade beneficiária da expropriação, EP - Estradas de Portugal, EPE, interpuseram recurso desta sentença para o Tribunal da Relação do Porto, que proferiu acórdão julgando parcialmente procedentes os recursos e alterando, em consequência, o valor fixado para a indemnização para 468.065€.

      É deste acórdão que vem interposto, pela entidade beneficiária da expropriação, EP – Estradas de Portugal, SA, (por sucessão legal nos direitos e obrigações de EP - Estradas de Portugal, EPE) o presente recurso de constitucionalidade.

      Após a interposição do recurso de constitucionalidade, foi, por despacho de fls. 989 do Relator, ordenada a remessa dos autos, a título devolutivo, ao tribunal recorrido, para decisão de requerimentos respeitantes ao valor depositado pela entidade expropriante.

      Por despacho do relator no Tribunal da Relação do Porto, foi, na sequência, o processo remetido, a título devolutivo, ao Tribunal de primeira instância, que proferiu decisão a fls. 1004 e s.

      Após outros incidentes, que não relevam para a presente decisão, e regressados os autos ao Tribunal Constitucional, foram as partes notificadas para alegar.

    3. A recorrente apresentou alegações, onde conclui o seguinte:

      1. A decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto ao fixar uma indemnização pelas parcelas 86.1 (7.726m2) 86.2 (731m2) e para a parte sobrante enquanto solo apto para construção, não obstante a sua classificação para fins de uso e ocupação do solo definido pela Planta de Ordenamento e Planta de Condicionamento do PDM, apenas por existência de infra-estruturas urbanísticas conforme o artigo 25.°, n.° 2, al. a) redunda numa interpretação inconstitucional deste artigo por violação do princípio da igualdade, artigo 13.°, n.º1 CRP;

      2. A classificação do solo enquanto apto para construção e respectiva valoração por critérios que não resultam directamente do PDM em vigor à data da DUP, maxime artigo 34.°, n.° 5 ex vi artigo 25.°, n.º 2 PDM, constitui um tratamento arbitrário a favor do expropriado, que apenas é objecto de valoração em sede de processo expropriativo e não oponível fora deste, o que gera uma desigualdade marcante entre expropriado e não expropriados na determinação do valor das respectivas propriedades;

      3. O pleno funcionamento normativo do princípio da igualdade deve assentar numa concepção material deste princípio, devendo o princípio da igualdade ser concretizado de forma relativa e por exercício de comparação;

      4. Qualquer avaliação pericial ou decisão judicial será sempre uma ficção jurídica reportada a um determinado momento irreproduzível, a data de publicação da DUP;

      5. O valor da parcela expropriada será fixado na estrita medida do seu potencial ou efectivo uso, ocupação e transformação juridicamente reconhecido à data da DUP;

      6. O critério de determinação do valor económico será por isso objectivamente fixado e avaliado;

      7. Os riscos, por muito que possam eventualmente vir a compensar a audácia de quem os assume, são exógenos à avaliação pericial em sede de processo expropriativo, que se deve cifrar por critérios de normalidade e não de excepção;

      8. O tribunal ao fixar determinada indemnização está a pronunciar-se postumamente sobre o ius aedificandi da parcela expropriada, o que, como tal e ao abrigo do princípio da igualdade, pressupõe que se indague das possibilidades do integral e válido deferimento dessa mesma capacidade edificativa à data da DUP não fora a existência de uma expropriação;

      9. O maniqueísmo do artigo 23.° CE quanto à classificação do solo promove distorções que arbitrariamente beneficiam os expropriados e a entidade expropriante dependendo da sorte ou azar da prova pericial produzida;

      10. Se atentarmos à prova nos presentes autos concluiremos desde logo, face ao prescrito no PDM, que efectivamente quanto ao espaço em Área Florestal Estruturante não é afastada a possibilidade de uso e ocupação construtiva, todavia depende da verificação de condicionantes e da existência de um relevante interesse público, que permita desconsiderar o uso e ocupação dominante das parcelas;

      11. No limite, o valor das parcelas poderá sempre corresponder a um valor superior a um simples eucaliptal ou plantação de batatas por força das suas características, infra-estruturas e localização;

      12. O reconhecimento de um direito ou interesse no foro urbanístico carece de legitimação prévia por referência aos pressupostos e critérios legais e administrativos vigentes; sendo que esta dimensão de legitimação material deve igualmente pautar a actuação do Tribunal, no juízo que fizer no processo expropriativo em especial sobre as conclusões da avaliação pericial;

      13. O direito à justa indemnização igual, proporcional e não arbitrário, que se analisa, desde logo, no reequilíbrio da posição patrimonial do expropriado face ao não expropriado, pressupõe um exercício de comparação assente, no caso vertente, em três factores concretos: a) data da aquisição e respectivas condições e valor prédio expropriado fixados no contrato de compra e venda celebrado pelos expropriados em 2002; b) posição abstracta do expropriado face às regras do PDM vigentes e aplicável aos demais proprietários e cidadãos; c) características e localização do prédio e parcelas expropriadas

      14. Os expropriados tinham conhecimento ou deviam conhecer o prescrito e respectivo regime condicionado para as parcelas por força do PDM;

      15. Qualquer ocupação construtiva seria sempre excepcional, necessitaria de ser cabalmente fundamentada e, ainda assim, ver-se-ia sempre limitada pela existência de uma extensa área de terreno) e por parâmetros de ocupação reduzidos;

      16. Esta é a realidade objectivamente oponível a todos as pessoas à data da DUP, mas mais importantemente ainda à própria data da aquisição pelos expropriados;

      17. A natureza florestal é, deste modo, emergente das características do solo e respectiva vinculação situacional, assumindo relevo como tampão de protecção ambiental para a zona impondo-se, deste modo, o seu respeito pelos instrumentos de planeamento municipal;

      18. O Tribunal a quo, a quem competia julgar e interpretar as questões de direito, não assenta o seu juízo no efectivo destino económico admissível e possível de concretizar atenta a classificação do solo para fins do PDM — instrumento de gestão territorial dotado de eficácia plurisubjectiva e das características da auto e heteroplanificação;

      19. Hoje é claro e aceite que o destino económico de uma parcela expropriada terá que corresponder ao seu destino juridicamente admissível, pois só a este corresponde o valor de mercado, por ser o único passível de ser concretizado;

      20. Não se aceita que possa ser reconhecido ao expropriado e apenas num processo expropriativo, cujo objecto é determinar o valor do bem conforme as circunstâncias à data da DUP de acordo com as regras normais de mercado (Dezembro de 2003), uma potencialidade construtiva que o terreno expropriado claramente não detinha à luz do enquadramento normativo aplicável;

      21. A consideração autónoma dos requisitos prescritos nas als. a) e b) do artigo 25.°, n.° 2 CE sem considerar os instrumentos legais que efectivamente concretizam e permitem o ius aedificandi, conforme foi considerada pelo Tribunal a quo, redunda numa interpretação ilegal e incorre numa manifesta e intolerável violação do princípio da igualdade, revelando-se uma interpretação inconstitucional do disposto por violação do artigo 13.°, n.°1 CRP e o princípio da igualdade;

      22. A DUP não se consubstancia numa alteração às condicionantes que afectam o uso e ocupação da parcela anteriormente existentes;

      23. Qualquer juízo pericial que defenda uma aptidão construtiva contrária ao...

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