Acórdão nº 29/03.7TBVPA.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelMARTINS DE SOUSA
Data da Resolução20 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: I.

AA (Sucursal em Portugal) intentou a presente acção contra BB, CC e DD, pedindo que se ordene a restituição do imóvel identificado no art. 2º da petição inicial ao património do 1.º R., para aí ser executado na medida do seu interesse e até onde for necessário para satisfação do seu crédito e que, nos termos do art. 8º do C. do Registo Predial, se ordene o cancelamento do registo de aquisição do imóvel mencionado a favor dos 2.º e 3.º RR, efectuado mediante a ap. 00000000, em relação à descrição n.º 00000000000.

Alegou em suma que intentou acção executiva contra o R. BB, para cobrança da dívida titulada por uma livrança, no valor de € 14 260,40, tendo nomeado à penhora o imóvel que identifica, a qual foi ordenada e efectuada por termo de 18-04-2001, o que foi registado, provisoriamente, por natureza em 18-04-2002, uma vez que a titularidade do direito de propriedade se encontra inscrita a favor dos 2.º e 3.º RR.

Acontece que não recebeu, até à data, qualquer quantia para pagamento da quantia exequenda nos autos acima referidos e que os juros de mora vencidos desde a interposição da acção executiva ascendem a € 990,06.

O imóvel penhorado foi doado pelo 1.º R. aos 2.º e 3.º RR, transmissão que foi levada a registo no dia 11-06-2002 e que não conhece outros bens ao 1.º R que sejam suficientes para pagamento da quantia exequenda.

Considera, por isso, que estão preenchidos os requisitos para que a doação referida possa ser impugnada nos termos dos arts. 610º e ss. do CPC.

Os RR. BB e DD apresentaram a contestação, onde concluíram pela improcedência do pedido, alegando que o pedido formulado pela A. não tem cabimento no normativo inerente à acção pauliana, posto que o mesmo deixa intocada a transmissão, sendo que esta ocorreu antes do registo da penhora.

Por outro lado, o R. BB tem outros bens susceptíveis de penhora e os RR. CC e DD desconheciam o crédito e a penhora invocados pela A.; Informam ainda que a doação impugnada apenas se destinou a restituir o imóvel que os RR. CC e DD haviam doado ao R. BB.

Replica a A., reiterando a procedência do pedido por si deduzido.

Finda a fase dos articulados, foi proferida sentença a julgar a acção, parcialmente, procedente, julgando ineficaz o contrato de doação do 1º réu aos 2º e 3º réus, ordenando a sua restituição ao património do 1º réu, a qual foi objecto de recurso, apreciado pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, onde se decidiu anular a decisão impugnada e ordenar-se a elaboração de despacho saneador (com a natural selecção da matéria de facto) e a ulterior tramitação dos autos.

Em cumprimento do referido acórdão, após, nomeadamente, a realização de julgamento, veio a ser proferida sentença, julgando-se, ora, improcedente a acção com a consequente absolvição dos réus.

Igualmente, objecto de recurso que veio a ser decidido, de novo, por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, aí se anulou a decisão da matéria de facto e da sentença recorrida e se ordenou a elaboração de base instrutória nos termos aí vertidos.

Dando-se-lhe inteiro cumprimento, veio a ter lugar nova audiência de julgamento e proferiu-se nova sentença que julgou a acção parcialmente procedente, em tudo idêntica à primeira decisão.

Entretanto em apenso próprio, I...I....D...F... Finance, AG, foi julgada habilitada a intervir na lide em substituição da originária A..

Inconformados, apelaram os RR mas a Relação do Porto, por acórdão, desatendeu o recurso e confirmou a sentença da 1º instância.

Recorreram de novo os RR., ora, de revista cuja alegação concluem, formulando o seguinte: 1- O Douto Acórdão recorrido apesar do seu apreciável recorte técnico, não fez, salvo devido respeito, correcta aplicação do direito aos factos e não tomou em consideração toda a matéria relevante, bem como, por outro lado, se algumas das normas legais fossem aplicadas e interpretadas correctamente conduziriam, necessariamente, e com a devida vénia, a decisão diferente da tomada pelo Douto Tribunal a quo.

2- Como se procurará demonstrar, o Tribunal" a quo", ao decidir nos termos em que o fez, violou, directa e ou indirectamente, de entre o mais, o disposto no artigo 668 n° 1 ai. b) e c) do C.P.C., pois, o Douto Acórdão ora recorrido, que corroborou a decisão tomada em primeira instância, cuja já enfermava dos mesmos vícios, não contempla fundamentação quanto à matéria de facto que leve à decisão a que levou, bem como, atendendo à matéria de facto dada como provada, sempre se inferiria decisão diferente da adoptada no aresto em análise.

3- Consta dos autos e da Douta Sentença de que se recorre, que, efectivamente, o 1º R., BB, e a A. inicial, outorgaram, em 03-02-2000, um contrato de locação financeira, tendo aquele prestado a título de garantia um livrança. Ora, como se pode constatar da matéria de facto dada como assente, sob os pontos 9., 10. e 11., a livrança subscrita pelo 1º Réu foi a única garantia prestada e, como comprovado pela prova testemunhal, seria à data o único formalismo e requisito exigido pela instituição financeira de crédito. Assim, o prédio rústico sob o qual incidiu, ulteriormente, penhora e que, de resto, motivou a interposição da presente acção, não constava das condições particulares do dito contrato de locação financeira. Efectivamente, nada mais foi requerido, ao 1º Réu, a título de garantia para a celebração do referido contrato; 4- Na verdade, isto foi uma forma de os 2º e 3º RR auxiliarem o seu filho na prossecução de tal projecto, conferindo-lhe uma oportunidade de sucesso e trabalho para a sua vida. Daí que, uma vez este estabilizado ou cumprido o seu objectivo com aquele projecto, o prédio que os pais lhe transmitiram, seria alvo de regresso à esfera patrimonial dos 2º e 3º RR. E não outro foi o propósito de os mesmos efectuarem esta doação, pois, estes sempre actuaram no propósito de que tudo fosse cumprido, pois sempre confiaram no seu filho e, como pais, tudo fizeram para que este tivesse sucesso na sua vida profissional, que mais não foi o móbil de estes lhe terem doado, sob condição, o referido imóvel.

5- De facto, e não obstante os 2º e 3º RR. desconhecerem por completo o contrato de locação assumido pelo seu filho, aqui 1º Réu, o certo é que na data da escritura pública de doação, o 1º Réu ainda não estava em situação de qualquer incumprimento, pois que só mediaram cerca de cinco meses os dois actos e tendo sempre em consideração que a data de emissão da livrança dada pelo 1° Réu como garantia, remonta a cerca de 1 ano e 4 meses depois da referida escritura. Efectivamente, os 2º e 3º RR., permitiriam, como pais, que este cumprisse para com o acordado e contratado com as demais entidades, com vista a cumprir integralmente o assumido, pois, em momento algum, se pode inferir, que quer os 2º e 3º RR., quer o próprio 1º Réu pretendiam defraudar ou...

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