Acórdão nº 295/06.6TBCNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1. A...

e mulher, B...

(AA. e neste recurso Apelados), demandaram, no Tribunal Judicial da Comarca de Cantanhede, C...

, posteriormente incorporada em (e neste processo substituída por[1]) D...

[1ª R. e aqui Apelante, por adesão, nos termos do artigo 683º, nº 2, alínea a) do Código de Processo Civil (CPC), através do requerimento de fls. 278] e E...

(2ª R. e aqui Apelante).

Fundamentando os pedidos que contra estas RR. formulam, indicam os AA. terem sido atraídos, através de um telefonema e sob o pretexto de terem sido sorteados para participar num concurso, a um Hotel em Cantanhede, onde foram induzidos, por funcionários da 2ª R., a adquirir, mediante a assinatura de documentos cujo sentido na altura desconheciam, um “serviço de louça”, sendo-lhes dito que haviam ganho um prémio de €500,00 e que, além disso, a aquisição daquele bem (só) corresponderia a duas prestações de €83,00.

Mais tarde, vieram os AA. a saber que tinham celebrado, sem que disso se tivessem verdadeiramente apercebido, um “contrato de crédito” com a 1ª R., cujo cumprimento importaria a satisfação por eles à 2ª R. da quantia global de €4.897,00, em 60 prestações de €83,00. Ora, considerando os AA. esse contrato (abrangendo a compra e a concessão de crédito) sem qualquer valor, nos termos do Decreto-Lei nº 359/91, de 21 de Setembro (doravante DL 359/91) e do Decreto-Lei nº 143/2001, de 26 de Abril (doravante DL 143/2001), formulam, subsequentemente a terem solicitado à 1ª R. a “anulação” desse contrato, os seguintes pedidos: “[…] a) Declarar-se nulos, como se requer, todos os alegados contratos de compra e venda, de crédito e de preenchimento de livrança, nomeadamente o «contrato de crédito nº 24415190, celebrado com a R. C...», que os AA. tenham celebrado com as RR. e cujo conteúdo desconhecem, por incumprimento dos requisitos legais, com o desaparecimento retroactivo dos negócios e demais consequências legais.

Ou, b) Não se entendendo assim, serem os mesmos anulados, como se requer, por ter ocorrido erro vício de vontade e dolo na sua celebração, considerando os mesmos sem efeito, com as demais consequências legais.

[…]” [transcrição de fls. 6] 1.1.

Contestaram separadamente ambas as RR., afirmando a validade do(s) contrato(s), designadamente no que se refere ao “contrato de crédito ao consumo”, recusando a 1ª R. que a este último se aplique o regime do DL 359/91, por não terem sido estabelecidos juros, invocando ambas a renúncia dos AA. ao direito de reflexão e revogação dos contratos e a caducidade do direito de resolução dos mesmos, pugnando ambas as RR., enfim, pela total improcedência da acção.

1.2.

Saneado o processo, fixados os factos nessa fase provados e elaborada a base instrutória (despacho de fls. 99/103), avançou-se para o julgamento documentado a fls. 200/202, findo o qual, apurados os factos provados em julgamento (despacho de fls. 203/209), foi proferida a Sentença de fls. 213/239 (constitui esta a decisão aqui recorrida), que culminou com o seguinte pronunciamento decisório: “[…] 1) Julgar improcedente, por não provada, a excepção deduzida pela ré D..., de renúncia dos autores A... e B... ao direito de reflexão e revogação previsto no Decreto – Lei n.º 359/91, no que concerne ao contrato de crédito ao consumo celebrado entre autores e a ré C..., referido em 7).

2) Julgar improcedentes, por não provadas, as excepções deduzidas pelas rés E..., e D..., de caducidade dos direitos dos autores A... e B... de revogação e resolução dos contratos celebrados entre autores e rés, direitos esses previstos, respectivamente, nos arts. 8.º, n.º 1, do Decreto – Lei n.º 359/91, de 21/09, e 18.º, n.º 1, do Decreto – Lei n.º 143/01, de 26/04.

3) Julgar totalmente procedente, por provado, o pedido dos autores A... e B... de declaração de nulidade total dos contratos de compra e venda n.º 1160, crédito n.º 24415190, e preenchimento, a título de caução, da livrança n.º 500905479049777912, celebrados com as rés E..., e C..., declarando-se a nulidade dos mesmos, o que impede o conhecimento, pelo Tribunal, do pedido de anulação dos referidos contratos, com fundamento em dolo e erro – vício quanto ao objecto negocial, deduzido subsidiariamente, em segundo lugar, pelos autores.

4) Consequentemente, por efeito da declaração da nulidade total dos contratos referidos em 3), condenar os autores A... e B..., e as rés E..., e D..., a restituir tudo o que tiver sido prestado em cumprimento dos contratos referidos em 3). Assim, designadamente: - Condenar os autores A... e B... a restituir à ré E..., os artigos de louça e respectiva documentação eventualmente fornecida por esta, objecto do contrato referido em 6), e constantes de fls. 47 e 49.

- Condenar a ré E..., a restituir a quantia mutuada de € 4.980, que lhe foi entregue, objecto do contrato referido em 7), a título de preço pela mercadoria supra referida, em cumprimento dos contratos em causa, à ré D...

5) Condenar F...

, legal representante da ré E..., de má fé na causa, em multa processual que se fixa no montante de 10 U.C.

[…]” [transcrição de fls. 237/238] 1.2.1.

Inconformada, interpôs a 2ª R. o presente recurso de apelação, ao qual, mais tarde, a fls. 273 aderiu a 1ª R., nos termos do artigo 683º, nº 2, alínea a) do CPC, alegando-o aquela 2ª R. a fls. 263/267 (a 1ª R. aderiu a essas alegações), formulando a rematar as seguintes conclusões: “[…] 1 – No contrato de compra e venda fornecido pela aqui Recorrente, mesmo acima das assinaturas constam a aceitação e declaração dos ora Recorridos onde se pode ler “Mais declaramos que recebemos os bens identificados como entregues e que nos foi entregue o exemplar do contrato que nos é destinado”.

(sublinhado nosso) 2 – Relativamente ao contrato de crédito celebrado com a “C...”, mais uma vez, no local das Instruções de Pagamento e Declaração dos proponentes pode ler-se que “Mais declaramos que nos foi entregue o exemplar do contrato que nos é destinado”.

(sublinhado nosso) 3- Ora não tendo a autoria da letra e da assinatura nos contratos celebrados pelos Recorridos sido impugnadas, pelo que nos termos do artigo 374º do Código Civil os mesmos são havidos como verdadeiros; 4- Na verdade ficando provado, como no entendimento da ora Recorrente ficou, que foram entregues aos Recorridos um exemplar, os mesmos tomaram conhecimento de todas as condições inerentes ao contrato, nomeadamente a de resolução do mesmo.

5 – Assim ao dar como não provado que a ora Recorrente não entregou no momento da assinatura dos contratos, os respectivos exemplares e tendo em conta o teor dos contratos junto aos autos, o Tribunal a quo faz errada apreciação da prova o que influiu necessariamente na decisão final da causa.

6 – A Recorrente ao deduzir contestação juntou o contrato celebrado com os Recorridos, onde estes últimos declaram ter recebido os exemplares e estarem de acordo com as condições de venda o qual volta a repetir não foram impugnados as assinaturas constantes do mesmo; 7- A Recorrente em nenhum momento pretendeu com a sua contestação prosseguir com um objectivo ilegal ou ilegítimo; 8- A Recorrente ao ter deduzido contestação, mais não fez do que exercer um direito que considerava lhe assistir, não tendo por isso agindo de má fé; 9- Deste modo, não houve por parte da R. a intenção de deduzir uma pretensão absurda ou infundada, alterar a verdade dos factos ou conseguir um objectivo ilegal ou ilegítimo.

[…]” [transcrição de fls. 266/267] Os Apelados responderam ao recurso a fls. 275/276, pugnando pela manutenção integral da decisão recorrida.

II – Fundamentação 2.

Constitui necessariamente ponto de partida da presente indagação recursória a fixação do âmbito objectivo da mesma, tendo presente que essa delimitação se opera por referência às conclusões formuladas pelo recorrente, como decorre da aplicação conjugada dos artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC[2], só podendo exorbitar dessas conclusões, no caso da apreciação de questões de conhecimento oficioso (artigo 660º, nº 2 do CPC).

Tendo isto presente, constata-se que a Apelante (doravante qualquer alusão a esta pressuporá abrangida a 1ª R. que aderiu à apelação) não impugna o acto de fixação dos factos no culminar do julgamento, no sentido em que essa impugnação adquire relevância por referência ao disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 712º do CPC, com base na indicação de pontos de facto considerados incorrectamente julgados face a determinados trechos da prova pessoal (v. artigo 690º-A, nº 1 e 2 do CPC).

É certo que a Apelante discorda de determinada asserção de facto presente no julgamento da primeira instância, sendo essa asserção a que se consubstanciou na não prova da entrega aos AA./Apelados de cópias dos contratos no acto da subscrição dos mesmos. Tal contestação refere-se, todavia, à actuação de regras probatórias e correspondentes regras de decisão, e não à contraditoriedade dessa mesma asserção com a prova produzida em julgamento.

2.1.

Vale isto para constatar e sublinhar que essa asserção, sendo exterior à...

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