Acórdão nº 0744023 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Dezembro de 2007

Data12 Dezembro 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No tribunal Judicial de Ovar foi decidido condenar o arguido B.........., como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p e p. pelo art. 292º, n.º 1 e art. 69º, ambos do Código Penal, na pena de 110 dias de multa, à razão diária de €3,00, o que perfaz a quantia global de €330,00 (trezentos e trinta Euros) e ainda na sanção acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados pelo período de 10 meses, nos termos do disposto no art.º 69º, n.º 1 do Código Penal de 1995, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 77/2001, de 13/07.

Inconformado recorre o arguido rematando a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. É facto notório que os testes qualitativos de despistagem de álcool no sangue efectuado pelos aparelhos Drager, não são 100% fiáveis e contêm uma margem de erro.

  1. Tal é verificável pelas declarações dos senhores agentes e pelos inúmeros despachos emitidos pelo governo e demais institutos que, consubstanciados em estudos científicos mandam aplicar uma margem de erro.

  2. Perante tal evidência cumpre ao Ministério Público, com funções de carrear prova para o processo e ao tribunal enquanto julgador assegurar a eliminação de dúvidas, que seriam dissipadas pela análise ao sangue.

  3. Não tendo as dúvidas sido dissipadas, sob a esteira do princípio in dubio pro reo, constitucionalmente consagrado deve o arguido ser absolvido.

  4. A sentença in casu ao não considerar a existência de uma margem de erro, ao não considerar a dúvida real e reconhecida sobre qual o montante de álcool no sangue, violou o princípio in dubio pro reo.

  5. Deveria ter sido dado por provado que para além do arguido ter esperado 3 horas para conduzir, esteve quase 4 horas a dormir, antes de conduzir.

  6. Tal consubstancia um erro sobre as circunstâncias, atento que, sem censura, o arguido pensava-se em condições de conduzir, pensando legitimamente, que não acusaria uma taxa de alcoolemia proibida.

  7. Sem prescindir a aplicação de uma multa aplicada a um desempregado, casado com uma doméstica deve ser substituída por trabalho comunitário.

  8. A sanção acessória de inibição de condução deve ser reduzida para metade.

Admitido o recurso o Ministério Público respondeu concluindo pela manutenção da decisão recorrida. Já neste Tribunal o Ex.mo Procurador Geral Adjunto foi e parecer que o recurso não merece provimento.

Cumpriu-se o disposto no art.º 417º n.º 2 do Código Processo Penal.

Após os vistos, realizou-se a audiência.

Factos: No dia 26 de Março de 2007, cerca das 10:00 horas, o arguido conduzia o veiculo automóvel de matricula ..-..-MH, na Rua .......... - Ovar, com uma taxa de alcoolémia no sangue determinada em pelo menos 2,46 g/l, como se veio a apurar com o teste efectuado no aparelho DRAGER modelo 7110 MKIII P.

O arguido agiu de forma voluntária, deliberada e consciente, bem sabendo que daquela maneira exercia, em via pública, a condução de veículo em estado de embriaguez e conhecia esta sua conduta como ilícita e criminalmente punível, e, não obstante, não se absteve de realizar, de forma deliberada livre e consciente.

O arguido é casado, sendo a sua esposa doméstica; O arguido encontra-se desempregado, tendo requerido o Rendimento de Inserção Social, o qual ainda não lhe foi concedido; O arguido vive em casa de familiares; O arguido tem um filho de nove anos de idade a seu cargo; O arguido possui o veículo automóvel da marca Mazda ... do ano de 1998; Não são conhecidos antecedentes criminais aos arguido; O Direito: O recorrente suscita três questões: a) A sua absolvição pela aplicação do princípio in dubio pro reo; b) A substituição da pena de multa por trabalho comunitário; c) A redução da sanção de inibição a metade.

A - Absolvição do arguido pela aplicação do princípio in dubio pro reo.

Questiona o recorrente a não consideração das faladas margens de erro, numa dimensão inusitada e maximalista: porque há margem de erro, o arguido por via da aplicação do princípio in dubio pro reo, deve ser pura e simplesmente absolvido.

A questão merece ponderação[1].

A Circular que o arguido refere foi emitida pela Direcção-Geral de Viação e pretendeu «esclarecer» que «tendo em conta o erro máximo admissível [legalmente fixado, por remissão para a norma NF X 20-701, da AFNOR] para (...) [os alcoolímetros], a taxa de álcool no sangue (TAS) pode situar-se num intervalo, para mais ou para menos, em relação ao valor registado, o que significa que, através dos alcoolímetros aprovados nos termos legais e regulamentares, só é possível, com rigor, apurar que o condutor apresentava uma TAS compreendida entre "x" e "y", sendo "x" a TAS registada menos a margem máxima de erro e "y" a TAS registada mais a margem máxima de erro admissível»; e por isso mesmo, «uma vez que a referida falta de exactidão apenas pode funcionar em benefício dos infractores, só devem ser levantados autos de contra-ordenação por condução sob o efeito do álcool quando a TAS registada, deduzida da margem máxima de erro, for igual ou superior a 0,50 g/l», o que haveria igualmente valer no tocante à qualificação de determinada TAS como integrando o tipo de crime de condução em estado de embriaguez.

Os alcoolímetros são os instrumentos destinados a medir «a concentração de etanol através da análise do ar profundo dos pulmões, e que pode[m] ser utilizado[s] para fins de prova judicial», na definição da Recomendação OIML R 126 (1998), da Organização Internacional de Metrologia Legal[2].

No caso do alcoolímetro em causa nestes autos - o Alcotest MK III, da Dräger -, a medição da concentração de álcool etílico no ar expirado é realizada através de dois sistemas analíticos independentes, um por espectroscopia de infravermelhos e outro por análise electroquímica, cujos resultados são depois ponderados antes da determinação da taxa de alcoolemia por parte do equipamento, o que naturalmente aumenta o rigor e fiabilidade do resultado da medição.

A Direcção-Geral de Viação, através da Circular atrás mencionada, no entanto, veio lançar dúvidas sobre a exactidão das medições realizadas com recurso aos alcoolímetros (e naturalmente também ao Alcotest MK III), apontando para a margem de erro máximo que legalmente lhes está fixada para justificar a sua posição e para fixar, no valor dessa mesma margem de erro, a correcção que, em seu entender, tem de introduzir-se nas medições efectuadas com os referidos instrumentos para que as mesmas mereçam credibilidade ao nível probatório. Mas existirá, realmente, o «problema» alegadamente detectado pela Direcção-Geral de Viação, e será...

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