Acórdão nº 07B4352 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA, BB e CC intentaram, no dia 13 de Fevereiro de 2006, contra DD, acção declarativa constitutiva de condenação, com processo ordinário, pedindo a declaração de resolução de identificado contrato de arrendamento relativo ao primeiro andar esquerdo do prédio sito na Rua ....., nº ..., Paço de Arcos, e a condenação da ré a entregar-lho e pagar-lhes € 36 742,74 acrescidos de juros à taxa legal.

Fundaram a sua pretensão, por um lado, na circunstância de, na sua posição de senhorios, terem iniciado em 2002, no âmbito do plano Recria, as obras de recuperação do aludido prédio, e de a Câmara de Oeiras lhe haver determinado a realização de obras no locado, mas que a ré não permitiu a entrada, o que levou aquela autarquia, por deliberação de 24 de Novembro de 2004, a deliberar o seu despejo administrativo, executado em 14 de Dezembro de 2004 E, por outro, no facto de a ré ter derrubado as paredes interiores do locado e acumulado ao longo do tempo lixo, a par da sua degradação completa, e, consequentemente, de ter infringido o disposto nos artigos 64º, nº 1, alínea d), do Regime do Arrendamento Urbano e 1038º do Código Civil.

E, finalmente, nos prejuízos ditos resultantes do que despendeu com os trabalhos de recuperação do andar, retirada do lixo, eliminação da bicharada e remoção e guarda do recheio da casa no montante de € 36 742,74.

A ré foi considerada citada para os termos da causa por despacho proferido no dia 29 de Junho de 2006 e, face à ausência de contestação, foram declarados confessados os factos articulados pelos autores.

Ela agravou do mencionado despacho, admitido para subir diferidamente, e por sentença proferida no dia 10 de Outubro de 2006, foi declarada a resolução do contrato de arrendamento, condenada a ré a entregar a casa aos autores e a pagar-lhes € 36 742,74 acrescidos de juros a contar da citação.

Interpôs a ré recurso de apelação, e a Relação, por acórdão proferido no dia 24 de Maio de 2007, negou-lhe provimento, tal como ao recurso de agravo.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - tendo a citação sido feita em pessoa diversa da recorrente, o funcionário postal deveria tê-la advertido e responsabilizado nos termos do artigo 241.º do Código de Processo Civil; - não o tendo feito e indicado erroneamente essa pessoa como a que devia ser citada, essa citação de terceiro é nula e sem efeito em relação à recorrente; - ao referido erro de identificação e omissão da advertência do carteiro acresce a errada indicação da morada da recorrente, do que decorre a nulidade equivalente à falta de citação, só suprível mediante a sua repetição; - a secretaria deveria ter advertido oficiosamente a recorrente por carta expedida em dois dias, nos termos do artigo 241º do Código de Processo Civil, dentro do prazo de contestação, condição de defesa nesse prazo, mas só o foi depois de esgotado; - como consequência dessa falta de advertência, imputável ao tribunal, a recorrente não contestou no prazo devido, o que influi no exame e decisão da causa, gerando a nulidade, só suprível mediante a repetição da citação ou do alargamento do prazo de contestação; - a Relação erra de direito ao considerar tais omissões irregularidades, o recomeço do prazo para arguir nulidades ou contestar em 26 de Maio de 2006, data da notificação do indeferimento do pedido de apoio judiciário; - como a recorrente tinha constituído mandatário, que subscreveu o pedido de apoio judiciário, o seu indeferimento devia ser-lhe notificado, por força do artigo 52º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo; - o prazo de contestação pela recorrente ainda não se esgotou, seja por erro, nulidade ou ineficácia da citação por extemporaneidade ou nulidade da advertência da secretaria, seja por a segurança social não haver notificado o seu mandatário; - os factos provados não permitem concluir, dada a sua generalidade e imprecisão, ter havido alterações substanciais à disposição interna das divisões, nem imputá-las a concreta actuação da recorrente; - quanto aos ditos prejuízos com as obras de recuperação e de reparação, a frase que na sua quase totalidade se justificam é conclusiva, e tão genérica que não permite averiguar como se distribuem, em concreto, os gastos imputáveis aos senhorios e à inquilina; - o orçamento junto pelos recorridos inclui itens que traduzem meras melhorias da fracção, sem conexão com as deteriorações imputadas à recorrente, podendo resultar da deterioração normal do prédio, carente de obras de recuperação e de reparação gerais, da responsabilidade dos recorridos; - nenhuma das obras orçamentadas tem como objectivo reconstruir as paredes divisórias alegadamente derrubadas, nem demolir as outras paredes que segundo os recorridos haviam sido atrabiliariamente edificadas; - os recorridos agem de má fé ao pretenderam aproveitar a oportunidade para renovarem a casa à custa da recorrente, sabendo que a maioria dos prejuízos com obras orçamentados invocados não resultam de actos àquela imputáveis; - a circunstância de as obras de reparação geral do prédio e das fracções haverem ocorrido no âmbito do Recria não impede a destrinça da responsabilidade imputada à recorrente e aos recorridos, sob pena de aquela dever custear obras que deviam ser feitas por estes; - para tal destrinça, bastaria que os recorridos tivessem articulado factos de quantificação do montante das obras que se propunham fazer na fracção e no prédio; - na falta de tal destrinça factual, não podia o tribunal dar como provado serem todas as obras imputáveis à recorrente, sob pena de manifesto enriquecimento indevido à custa alheia; - a Relação erra no julgamento, tanto na interpretação que faz da matéria de facto como na aplicação que pretende fazer do artigo 64.º, n.º 1, alínea d), do Regime do Arrendamento Urbano.

II É a seguinte a factualidade considerada assente no tribunal recorrido: 1. Foi inscrita na 1ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras, no dia 15 de Outubro de 1965, a aquisição do prédio mencionado sob 2 por CC em virtude de partilha por óbito de EE.

  1. Foi inscrita na referida Conservatória, no dia 17 de Abril de 1986, a aquisição do prédio referido sob 1, em virtude de partilha por óbito de EE, em usufruto por CC e em propriedade a AA e a BB.

  2. Por sucessão no respectivo contrato de arrendamento, a ré é actualmente a legítima titular do arrendamento do 1.º andar esquerdo do referido imóvel, pagando a renda mensal de € 28.

  3. Os autores, no início do Verão de 2002, iniciaram as obras de recuperação e de reparação do imóvel mencionado sob 1, no âmbito do chamado Programa Recria, em colaboração com o Igaphe e a Câmara Municipal de Oeiras, tendo esta autarquia vindo a determinar, por deliberação de 10 de Julho de 2002, a realização coerciva de obras no seu primeiro andar esquerdo.

  4. Mau grado as inúmeras tentativas para o conseguir, os autores não lograram convencer a ré a permitir a entrada no andar aos operários do empreiteiro que se preparavam para realizar as obras, pelo que, dado que se tratava de obras coercivas, a Câmara Municipal de Oeiras ordenou, por deliberação de 24 de Novembro de 2004, o despejo sumário administrativo da ré, executado não sem dificuldade no dia 14 de Dezembro de 2004, com intervenção da Polícia Municipal, da Polícia de Segurança Pública, do Delegado de Saúde, dos Bombeiros e de técnicos juristas da autarquia.

  5. Ela impediu a entrada no local arrendado aos operários que ali iriam fazer obras determinadas pela Câmara Municipal de Oeiras, de que seria a principal beneficiária, a qual foi tomada a seu cargo pela Delegação de Saúde e conduzida para um estabelecimento hospitalar, vivendo actualmente, depois de um período de internamento num hospital psiquiátrico, com uma sua filha, na Rua ............, nº .., ........ direito, em Lisboa.

  6. Havia centenas de quilos de puro lixo, garrafas e embalagens vazias, trapos sujos, latas semi-vazias de comida para gatos, uma fauna indescritível de baratas e ratos, tudo envolvido num cheiro nauseabundo, que era o meio ambiente da ré.

  7. À medida que o lixo foi sendo retirado e após várias desinfestações - só de baratas mortas foram retirados cinco sacos de 50 litros cada - em finais de Fevereiro, foi possível constatar...

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