Acórdão nº 1633/05.4TBALQ.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelNUNO CAMEIRA
Data da Resolução15 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Síntese dos termos essenciais da causa e do recurso AA, representado pela sua mãe BB, e CC, representado pela sua mãe DD, intentaram uma acção ordinária contra Brisa – Auto Estradas de Portugal, SA, e a Cª de Seguros F…, SA, pedindo a condenação das rés no pagamento de 75.000,00 € a título de dano de perda da vida, 25.000,00 € a título de danos morais sofridos pelo autor AA, 25.000,00 € a título de danos morais sofridos pelo autor CC, 26.700,00 € a título de pensão de alimentos que o autor AA deixou de receber e 50.600,00 € a título de pensão de alimentos que o autor CC deixou de receber, quantias estas actualizadas de acordo com os índices de inflação do INE desde a data do acidente até à citação e acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal também contados desde a citação.

Alegaram em resumo que no dia 22/10/02, na auto estrada A1, ao km 42,5, ocorreu um acidente de viação em consequência do qual faleceu EE, pai dos autores AA e CC, ambos menores.

A 1ª ré foi a construtora da A1 e é a concessionária do Estado para a sua construção, conservação e exploração, cabendo-lhe assegurar a circulação em condições de segurança e comodidade, tendo transferido por contrato de seguro efectuado com a 2ª ré a responsabilidade civil por danos causados a terceiros naquela sua qualidade de concessionária.

No dia do acidente, pelas 16.10 horas, EE circulava na A1 no sentido Norte/Sul, a uma velocidade de 90 a 100 km/hora, do lado direito da faixa de rodagem, conduzindo o veículo de matrícula XX-XX-NG.

Ao chegar ao km 42,5 da A1, local onde a via em que seguia tem três faixas de rodagem e descreve uma curva pouco acentuada para a esquerda ao longo de mais de 600 metros, tomou a faixa esquerda; e quando se encontrava a efectuar uma manobra de ultrapassagem perdeu o domínio da viatura, entrando em hidroplanagem. Tal facto ocorreu porque uma camada de água proveniente das chuvas se acumulou na via, criando uma poça ou lençol de água que abrangia toda a faixa de rodagem esquerda, motivo pelo qual o veículo conduzido por EE passou a circular sobre a mesma com os quatro rodados, deixando de ter contacto com o asfalto.

Saindo do lençol de água descontrolado, atravessou transversalmente a via, saiu da faixa asfaltada, galgou a berma direita e embateu no morro junto a essa berma, capotando várias vezes e imobilizando-se no rail de protecção, a cerca de 50 metros do local do primeiro embate.

Entretanto, EE foi projectado da viatura, ficando caído a cerca de 30 metros do local onde o carro se imobilizou, sofrendo em consequência do acidente as lesões descritas nos autos, que lhe determinaram a morte.

A culpa do acidente deve ser imputada à 1ª ré, por ter omitido as suas obrigações de manter a via em boas condições de segurança de circulação e desenvolver as necessárias intervenções para que se possa circular sem perigo de acidente.

A acumulação de águas pluviais na via derivou de deficiente escoamento e drenagem, sendo que a 1ª ré nada fez para a evitar, procedendo ao seu imediato escoamento, ou até ao encerramento da via, por forma a evitar o acidente.

Violou, assim, o dever de cuidado a que se encontra obrigada, de assegurar as boas condições de utilização e comodidade da circulação na A1, tornando-se civilmente responsável quer em termos de responsabilidade contratual quer de responsabilidade extra-contratual pelo pagamento aos autores da indemnização pedida.

Contestando, a 2ª ré defendeu que nenhuma responsabilidade na produção do sinistro é de assacar à 1ª, pois o piso da via encontrava-se em perfeitas condições de conservação e utilização e a sua configuração não provocava a formação de lençol de água, pelo que o acidente, se existiu, deveu-se à intensidade da chuva. A 1ª ré procede ao patrulhamento constante da A1, o que aconteceu no dia dos factos, não tendo sido detectada qualquer anomalia ou obstáculo na via. E o mesmo sucedeu com a Brigada de Trânsito da GNR, que não comunicou à ré Brisa qualquer lençol de água no local.

A ré Brisa também contestou, alegando, em resumo e na parte que interessa, que o acidente ficou a dever-se, não a um inexistente lençol de água no pavimento da A1, mas sim ao excesso de velocidade imprimido pelo condutor ao veículo XX-XX-NG - velocidade não adaptada às condições climatéricas que se faziam sentir; e não tendo os autores demonstrado qualquer omissão culposa ou negligente por parte da ré que fosse causa adequada e eficiente do sinistro, não pode esta ser condenada ao pagamento de qualquer indemnização.

Realizado o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença, confirmada pela Relação, que julgou a acção improcedente, absolvendo as rés do pedido.

Ainda inconformados, os autores pedem revista, tendo formulado, em resumo, as seguintes conclusões úteis: 1ª) - A matéria alegada no artigo 46º da petição inicial é relevante para a descoberta da verdade já que, se provada, contribuiria decisivamente para o Tribunal formar a convicção de que o acidente dos autos se deveu à existência de um lençol de água na via e, nessa medida, decidir no sentido de a ré Brisa ter violado as suas obrigações de segurança e consequentemente ser culpada na produção do acidente; 2ª) - Tendo as instâncias indeferido a reclamação dos autores no sentido de incluir essa matéria na base instrutória, impediram os autores de provar factos decisivos para a sua pretensão e, assim, violando o disposto no artº 511º do CPC, de exercer o seu acesso ao direito, previsto no artº 20º da Constituição; 3ª) - Deve, consequentemente, o STJ ordenar a inclusão do alegado no artigo 46º da petição inicial na base instrutória, anulando todo o processado subsequente, nos termos do artº. 729º, nº 3, do CPC, dado estar-se em presença de matéria de direito - interpretação e aplicação das normas indicadas na conclusão anterior - para a qual dispõe de competência; 4ª) - Os quesitos 23º, 24º e 25º da base instrutória contêm matéria conclusiva e conceitos de direito pelo que devem considerar-se como não escritos, quer o teor desses quesitos, quer a resposta que lhes foi dada, nos termos conjugados dos artºs. 511º, 646º, nº4, e 664º do CPC, com todas as...

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