Acórdão n.º 324/2006, de 30 de Agosto de 2006

Acórdáo n.o 324/2006

Processo n.o 841/2005

Acordam na 3.a Secçáo do Tribunal Constitucional:

1 - Por Acórdáo do Tribunal da Relaçáo do Porto de 1 de Julho de 2004, a fl. 116, foi decidido «anular a decisáo da matéria de facto no tocante às respostas dadas aos pontos 16.o, 19.o, 28.o a 30.o e

36.o a 38.o da base instrutória, e ordenar-se a repetiçáo do julgamento com vista à eliminaçáo das referidas contradiçóes ou obscuridades, sem prejuízo do disposto na parte final do n.o 4 do artigo 712.o do CPC, ficando, em consequência, sem efeito a sentença recorrida».

A sentença em causa havia julgado parcialmente procedente a acçáo sumária proposta por Carlos Alberto Gaspar Henriques e mulher, Maria de Fátima Gonçalves Pereira, no Tribunal Judicial da Comarca de Vale de Cambra, contra Joaquim Soares de Pinho e mulher, Alber-tina Soares de Aguiar, pedindo que fossem condenados: a reconhecer que eram proprietários de um determinado prédio, identificado nos autos, e de uma certa proporçáo da água captada numa mina aberta a sul desse prédio; a reconhecer que existia, a favor do referido prédio, uma servidáo de presa e uma servidáo de aqueduto, destinadas a captaçáo da água e à sua conduçáo para o mesmo prédio; a abster-se de perturbar tal captaçáo, e a pagar-lhe uma indemnizaçáo, nos termos que indicaram.

Inconformados, os autores recorreram para o Tribunal da Relaçáo do Porto, que proferiu o citado Acórdáo de 1 de Julho de 2004.

Foi repetido o julgamento da matéria de facto no tribunal de 1.a instância, em 16 de Dezembro de 2004, ficando marcada para 5 de Janeiro seguinte a leitura das respostas aos pontos da base instrutória correspondentes.

Já em momento posterior, os autores vieram requerer que a juíza que presidiu ao julgamento da matéria de facto e, posteriormente, a decidiu se declarasse impedida, por ter sido a mesma que presidira ao primeiro julgamento e decidira, entáo, a matéria de facto. Invocaram para tanto o disposto na alínea c) do n.o 1 do artigo 122.o do Código de Processo Civil, sustentando que o segundo julgamento deveria também ser anulado.

Este requerimento foi indeferido, por despacho de 31 de Janeiro de 2005, a fl. 87, nos seguintes termos:

[...]

Estabelece o disposto no artigo 122.o, n.o 1, alínea c), do Código de Processo Civil: 'Nenhum juiz pode exercer as suas funçóes, em jurisdiçáo contenciosa ou voluntária: quando tenha intervindo na causa como mandatário ou perito ou quando haja que decidir questáo sobre que tenha dado parecer ou se tenha pronunciado, ainda que oralmente'.

Ora, entendemos, tal como é entendimento unânime da jurisprudência, que a citada disposiçáo legal náo abarca na sua previsáo a hipótese de o juiz, como tal, já se ter pronunciado sobre a questáo a decidir, mas apenas a de ter intervindo na causa como particular, dando parecer, consulta ou conselho a uma das partes ou pronunciando-se como mandatário ou perito - neste sentido, Acórdáo do STJ de 3 de Fevereiro de 1993, in Acórdáos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, 379.o, p. 827.

A alínea c) do n.o 1 do artigo 122.o do Código de Processo Civil náo abarca na sua previsáo [a hipótese] de o juiz, como tal, já se ter pronunciado sobre a questáo a decidir, o que poderá acontecer por via de anulaçáo do processado - neste sentido, Acórdáo da Relaçáo de 9 de Junho de 1983, in Boletim do Ministério da Justiça, n.o 330, p. 559, e Colectânea de Jurisprudência, ano 1983, vol. 3.o, p. 320.

Novamente inconformados, os autores recorreram deste despacho para o Tribunal da Relaçáo do Porto.

Por Acórdáo de 27 de Setembro de 2005, a fl. 150, a Relaçáo do Porto negou provimento ao recurso, remetendo para os fundamentos da decisáo recorrida, nos termos dos artigos 713.o, n.o 5, e 749.o do Código de Processo Civil.

2 - Vieram entáo Carlos Alberto Gaspar Henriques e mulher, Maria de Fátima Gonçalves Pereira, interpor recurso para o Tribunal Constitucional «nos termos da alínea b) do n.o 1 do artigo 70.o da Lei n.o 28/82, de 15 de Novembro, com vista a apreciar a inconstitucionalidade da norma do artigo 122.o, n.o 1, alínea c), do Código de Processo Civil, na interpretaçáo segundo a qual náo está impedido de efectuar a repetiçáo de um julgamento o juiz que antes se pro-nunciou sobre a mesma questáo, em sentença entretanto anulada por obscuridade e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT