Acórdão nº 410/04.4PBFUN.L2-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelJORGE GONÇALVES
Data da Resolução25 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1.

No processo comum com intervenção do tribunal singular n.º 410/04.4PBFUN, do 3.º Juízo Criminal do Tribunal do Funchal, o arguido A...

, melhor identificado nos autos, foi julgado pela imputada prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º1, do Código Penal, e de um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelo artigo 144.º, alínea b), do mesmo código.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: «Nestes termos e pelo exposto julga-se improcedente por não provada a acusação pública e os pedidos civis e, em consequência, Absolve-se o arguido, A..., da prática do crime de ofensas à integridade física simples, p.p.p. art. 143.º do CP e ofensas à integridade física grave, p.p.p. art. 144.º b) do CP, tal como vinha acusado.

Absolve-se ainda este arguido dos pedidos cíveis deduzidos pelo SRS e pelo queixoso B….» 2.

Inconformados e pretendendo recorrer de tal decisão de direito e de facto, B... (demandante civil) e C... (assistente) solicitaram, por requerimento datado de 17/09/2009, as gravações dos depoimentos de todas as testemunhas, tendo-lhes sido entregues as competentes cassetes no dia 18/09/2009.

Tendo constatado que uma das cassetes, contendo 44 minutos de gravação, com depoimentos de duas testemunhas de acusação, estava completamente inaudível, os recorrentes arguiram, com tal fundamento, a nulidade de tais depoimentos nos termos constantes de fls. 682 a 690, vindo, em resposta e na esteira de promoção do Ministério Público no sentido de que se considerassem nulos tais depoimentos e se repetissem (fls. 706), a ser proferido despacho que determinou a sua repetição (fls. 707).

Procedeu-se à tomada dos depoimentos em causa, sem que na sua sequência tenha sido proferida qualquer decisão ou despacho, vindo, então, a assistente e o demandante civil, interpor recurso da supra mencionada sentença absolutória.

Apreciando esse recurso, esta Relação, por acórdão de 30 de Dezembro de 2010, declarou nula a sentença proferida pela 1.ª instância e determinou que fosse proferida nova sentença em sua substituição.

  1. Na sequência do referido acórdão, foi proferida sentença, igualmente absolutória, de que recorrem, agora, B... e C..., concluindo, nos seguintes termos: …..

  2. O Ministério Público junto da 1.ª instância apresentou resposta, em que concluiu no sentido de que o recurso merece parcial provimento (cfr. fls. 981 e seguintes).

  3. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, na intervenção a que se reporta o artigo 416.º do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), emitiu o parecer de fls. 1000 a 1003, no qual sustentou que se verifica uma nulidade insanável por motivo da sentença recorrida não ter sido objecto de leitura pública.

  4. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do C.P.P. e colhidos os vistos, os autos foram à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.

    II – Fundamentação 1.

    Dispõe o artigo 412.º, n.º 1, do C.P.P., que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso (cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª ed. 2000, p. 335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 2007, p. 103; entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271; de 28.04.1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, p. 196).

    Atentas as conclusões apresentadas – cuja extensão excede o que seria desejável e mais conforme às exigências legais -, as questões a decidir são: a nulidade da sentença recorrida, nos termos do artigo 379.º, n.º1, alienas a) e c), do C.P.P.; a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

    Como questão prévia, suscitada pela Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, temos a invocada nulidade insanável por falta de leitura pública da sentença recorrida.

    Acresce, ainda, como questão prévia, a existência de causas de rejeição do recurso quanto ao recorrente B....

  5. Da sentença recorrida 2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1- No dia 17/2/2004 a queixosa C…, foi atendida no HCF cfr. ficha clínica de fls. 35 e 36, e apresentou lesões que constam de fls. 188 a 190, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

    2- No dia 17/2/2004, o queixoso B… foi atendido no HCF cfr. ficha clínica de fls. 13 e 14, e apresentou lesões que constam de fls. 34, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

    MAIS SE PROVOU QUE: 1- O arguido negou os factos.

    2- O arguido não tem antecedentes criminais, cfr. CRC de fls. 530 cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

    3- O arguido aufere 500€ mensais, vive com sua esposa inválida e 2 filhos de 13 e 24 anos, numa casa pela qual paga 300€ mensais ao banco. Tem o 2.º ano de escolaridade, incompleto.

    DO PEDIDO DO SRS: 4 - Os queixosos foram atendidos no HCF o que importou em 1.858€ ainda não pagos.

    DO PEDIDO DO QUEIXOSO 1- art. 2.º provado apenas que o queixoso teve dores no indicador da sua mão esquerda.

    2- Art. 3.º, provado apenas que sofreu por ver a sua esposa ensanguentada.

    2.2.

    Quanto a factos não provados ficou consignado na sentença recorrida (transcrição): FACTOS NÃO PROVADOS: Da acusação: 1- Todos os restantes da acusação.

    DO PEDIDO DO QUEIXOSO: 1- art. 2.º, parte não abrangida pelos factos provados.

    2- Art. 4.º parte não abrangida pelos factos provados.

    3- Art. 5.º 4- Art. 6.º 5- Art.7.º 6- Art. 9.º 7- Art. 10.º 8- Art. 11.º 9- Art. 12.º 2.3. O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição): A convicção do Tribunal é formada, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também por declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, parcialidade, coincidências e mais inverosimilhanças que, porventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos tudo isto conjugado com as regras da experiência e da lógica do próprio julgador.

    Deste modo, a formação da convicção deste Tribunal, quanto aos factos dados como provados e não provados, resultou da análise crítica da conjugação das declarações do arguido, da assistente e dos depoimentos das testemunhas, bem assim como da análise dos documentos juntos aos autos.

    Efectivamente, o arguido negou de forma veemente, serena e segura os factos, afirmando que ambas as famílias se dão mal há bastante tempo por motivos de vizinhança e obras. Começaram a discutir por causa de uma árvore que terá tombado devido ao vento e que os queixosos diziam que havia sido o arguido a deitá-la abaixo, começaram os insultos e segundo ele a senhora terá caído na vereda e batido com a cabeça numa zona cimentada, ou com pedras, não sabe precisar pois não se encontrava lá perto, era de noite, e não sabe dizer com certeza como a senhora terá caído. O que afirma e sempre afirmou é que é inocente e não atirou qualquer pedra na direcção nem da queixosa nem do queixoso. Refere ainda que o queixoso já tinha a mão magoada (ligada).

    A assistente teve um depoimento de todo incoerente, impreciso, o que se explica pelo facto de ter batido com a cabeça e o próprio relatório médico referir que a mesma tem «amnésia para o acidente» (fls. 36). No entanto, em audiência tanto referia lembrara-se como afirmava já não se lembrar, uma vez descrevia os factos de uma forma, outras vezes de outra, deixando-nos confusos acerca de como se teria dado o «acidente». Primeiro dizia que o arguido e mais outra pessoa lhe atiravam pedras e não sabe quem a atingiu, depois já refere que foi a pedra do arguido. Depois refere que desmaiou e que não se lembra de nada. Mas entretanto lembra-se que o marido lhe pôs a mão para a defender (amparar quando ia a cair), faz o gesto com a mão direita, mas o marido magoou-se na mão esquerda. Não sabe como caiu (de trás, de lado, de frente), porque desmaiou, mas lembra-se de outros pormenores ... Depois com tantas contradições diz que não responde a mais nada, só responde ao seu advogado. Ainda acrescentou, que não tem paladar, olfacto, tem amnésia, e não pode tomar conta da sua neta. Foram juntas fotografias que ajudaram a esclarecer o local dos factos.

    O queixoso referiu que o arguido atirou uma pedra grande na direcção da sua mulher e que a mulher caiu logo depois de levar com ela. Que a tentou amparar e nessa altura magoou-se (na mão esquerda). Não se lembra de ter visto a sua filha no local. Confirmou as lesões com que ficou.

    Em virtude de deficiência na gravação dos depoimentos das testemunhas T1.. e T2…, porque inaudíveis, (na sua reprodução) os mesmos foram repetidos. Tal significa que, tirando qualquer falha humanamente compreensível, já que ninguém consegue repetir um depoimento exactamente da mesma forma, ambos disseram, em suma, o mesmo que já haviam dito da primeira vez que depuseram: T1…, é a filha dos ofendidos, ouviu uma discussão e foi logo ver o que era, porque estava em casa dos pais. Apercebeu-se que discutiam por causa da queda da árvore. Viu o arguido e a filha deste a atirarem pedras aos seus pais, depois o pai faz um gesto para defender a mãe e magoa-se na mão (mas faz um gesto a indicar essa defesa com a mão direita). Depois a pedra atinge os dois e ficamos sem perceber como o queixoso se magoa: se a proteger a...

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