Acórdão nº 763/11.8YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução10 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

Por acórdão de 18 de Outubro de 2011, o Tribunal da Relação de Lisboa determinou a execução do mandado de detenção europeu emitido pela Procuradoria Distrital de Burgas, República da Bulgária, contra o cidadão desse País A, para cumprimento de uma pena de 20 anos de prisão e a consequente entrega à competente autoridade judiciária desse País.

  1. Desse Acórdão recorre agora o requerido para o Supremo Tribunal de Justiça e, da sua fundamentação, retira as seguintes conclusões: I - O Douto Acórdão recorrido valida, incorrectamente, um MDE fundamentado numa sentença absolutória.

    II - O Douto Acórdão recorrido viola o preceituado na al. a) do art.º 13° da Lei n.º 65/2003 de 23 de Agosto pois, defere a execução do MDE que não garante a efectiva realização de um novo julgamento ao detido III - O Douto Acórdão recorrido viola a Decisão Quadro 2009/299/JAI, nomeadamente o seu art.º 4-A, quando manda executar um MDE que não está conforme com o formulário pré-estabelecido actualmente em vigor, nem contém, de forma directa ou indirecta os elementos elencados pela referida norma, como obrigatórios num MDE IV - O Acórdão recorrido ao considerar que A foi representado por advogado que não foi por ele constituído, viola (à semelhança do que fez o Estado Búlgaro) os conceitos fundamentais do mandato (nomeadamente os artigos 268.° e 1157.° ambos do CC português) e, indirectamente, convalida uma notificação da sentença condenatória, feita na pessoa do advogado.

    V - O Acórdão recorrido ao executar um MDE que considera que a notificação da sentença foi efectuada em Portugal, no dia 24 de Agosto de 2011, e que a partir de então começou a decorrer o prazo para requerer novo julgamento, viola, mais uma vez, o preceituado na Decisão Quadro 2009/299/JAI, e do actual ponto 3.4 do formulário do MDE actualmente em vigor que determina que a Sentença condenatória tem que ser notificada ao extraditando aquando da chegada à Bulgária e que o prazo para requerer novo julgamento só então é que se inicia.

    VI - O Douto Acórdão recorrido inquina de interpretação errónea à garantia prestada, pois aquela apenas remete para o n.º 1 do art.º 423.º do CPP búlgaro, o qual estipula uma possibilidade de requerer um novo julgamento, condicionada a pressupostos e não uma garantia efectiva, incontornável VII - O Douto Acórdão recorrido incorre em erro quando considera de aplicar o n.º 5 do citado art.º 423.º do CPP búlgaro, que não consta do MDE no âmbito das garantias, nem dos "esclarecimentos" posteriormente prestados ao Tribunal Português (e que o TRL apenas teve conhecimento pelos documentos juntos aos autos pelo ora recorrente), pelo que não pode ser entendido/interpretado como garantia efectivamente prestada pelo Estado Búlgaro.

    VIII - Que se exija às Autoridades Búlgaras o envio do formulário do MDE actualmente em vigor e constante da Decisão Quadro 2009/299/JAI, o qual contém os pontos sobre os quais tem de incidir a garantia solicitada, sob pena de se violar uma disposição imperativa em todo o território da Comunidade Económica Europeia, e, implicitamente o artigo 13.° al. a) da Lei 65/2003 de 23 de Agosto e as seguintes disposições constantes da Constituição da República Portuguesa: artigos 7° n.º 1, 8.°, 9.° al. b), 15.° n.º 1, 16.° n.º 1, 22.° e 32.° n.º 6.

    Nestes termos, e nos demais de Direito, e sempre com o mui Douto Suprimento de V. Exas, deve ser considerado procedente o presente recurso, revogando-se o Acórdão proferido pelo TRL, e em sua substituição, proferida decisão superior que determine: 1. Que o MDE só será executado quando: - O Estado Búlgaro prestar as garantias que A terá direito, sem quaisquer condicionantes, a um novo julgamento, e consequente anulação das Sentenças condenatórias anteriormente proferidas, nos termos dos artigos 421.º n. 2 e 422, al. 1, p. 6, ambos do C.P.P. Búlgaro.

    - O Estado Búlgaro apresente Garantia prestada pelo Procurador Geral da República da Bulgária que requererá a abertura do processo penal a A, no prazo máximo de uma semana a partir da data que tiver conhecimento que a extradição foi concedida, nos termos do preceituado no art.º 421.° n.º 2 do CPP Búlgaro.

  2. Conceder ao Estado Búlgaro um prazo para a prestação das garantias em 1., sob pena do mandado não vir a ser cumprido.

  3. Decretar-se de imediato a suspensão, ou interrupção da detenção, de acordo com o preceituado no n.º 3 do art.º 4-A da Decisão Quadro 2009/299/JAI e conforme Jurisprudência consagrada no Acórdão do STJ de 10-09-2009 do Proc. N° 134/09.

    - Que o Tribunal da Relação exija ao Estado Búlgaro novo MDE, totalmente preenchido, na versão actualmente em vigor, segundo o modelo constante da Decisão Quadro 2009/299/JAI, a fim de poder aferir das garantias prestadas, cumprindo-se, assim, o imperativo legal que vigora para todos os Países da Comunidade Europeia, não só do formulário, mas essencialmente das garantias que actualmente devem ser exigidas em casos de indivíduos julgados à revelia (como é o caso), ficando a entrega do detido dependente do recebimento de tal MDE, e que as Autoridades Búlgaras têm de enviar num prazo a ser determinado pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

  4. O M.º P.º respondeu ao recurso e concluiu: I. Este MDE tem os necessários elementos em conformidade com o artigo 3° da Lei 65/2003 de 23/8.

    1. O regime jurídico do MDE foi aceite por acordo dos Estados Membros da União Europeia não se podendo por isso considerar que a sua execução possa constituir uma violação da lei.

    2. Por outro lado também este Tribunal considerou que o Estado de emissão garantiu a faculdade de o recorrente requerer novo julgamento (cf. fls. 422).

    3. Não se pode considerar como pretende o recorrente que se trata de uma garantia condicionada, insinuando ter o Estado búlgaro subterfúgios legais para frustrar tal garantia.

    4. Tal suspeição contraria a essência e a natureza jurídica do MDE.

    5. O MDE rege-se por um critério de suficiência, isto é, o Estado da execução não deve precisar de mais informação do que aquelas que figuram no formulário pré-estabelecido devendo a sua eficiência ser de teor quase automático na medida em que só em casos taxativamente limitados se podem erguer barreiras de inexecução.

    Em conformidade deverá ser negado provimento ao recurso mantendo-se o Acórdão recorrido.

  5. Foram colhidos os vistos e realizada a conferência com o formalismo legal.

    Cumpre decidir.

    As questões principais a decidir são as seguintes: 1ª Se faltam os requisitos legais ao MDE em causa, pois fundamenta-se numa sentença absolutória (n.º 84), quando a condenação e a pena foram determinadas pelas sentenças n.ºs 46 e 663.

    1. - Se a decisão condenatória proferida contra o recorrente transitou em julgado, pois a mesma foi notificada ao advogado que o defendeu no julgamento.

    2. - Se o acórdão recorrido manda executar um MDE que não obedece aos parâmetros actualmente em vigor, por força da Decisão Quadro 2009/299/JAI do Conselho de 26 de Fevereiro de 2009.

    3. - Se foram dadas garantias de que ao recorrente, no novo julgamento, não será aplicada pena de prisão superior a 20 anos.

  6. FACTOS ASSENTES 1. A pessoa procurada, A, é cidadão nacional da República da Bulgária.

  7. A Procuradoria Distrital de Burgas emitiu, em 18.07.2008, mandado de detenção europeu contra aquele cidadão búlgaro, do qual constam, além dos elementos de identificação da pessoa procurada, as seguintes informações: a) A detenção e entrega de A tem em vista o cumprimento de uma pena de 20 anos de prisão; b) A pena a cumprir resulta de condenação proferida no processo identificado como PPCC n. ° 171/2003 do Tribunal Distrital de Burgas, pela sentença n. ° 84/02.07.2004, transitada em julgado ("entrada em vigor") em 11.10.2007; c) O requerido foi condenado, como "cúmplice e instigador", de um crime de homicídio previsto e punível pelos artigos 116.°, al. 1, § 9, e 20.º...

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