Acórdão nº 1587/07-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Novembro de 2007
Data | 15 Novembro 2007 |
Órgão | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os Juizes na secção criminal (9ª) do Tribunal da Relação de Lisboa: No processo comum (tribunal singular) nº 1076/06.4 PMLSB da 1ª secção do 4º Juízo Criminal de Lisboa, foi o arguido J.
, julgado e condenado como autor de um crime de maus tratos p. e p. pelo artigo 152º nº 1 al. a) e nº 2 do C. Penal, na pena de dez meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de três anos e na pena acessória de proibição de contacto com a assistente e afastamento da residência desta pelo período de um ano.
Inconformado com tal decisão condenatória vem o arguido dela interpor recurso de cuja motivação extrai as conclusões que se transcrevem: Da prova recolhida, apenas resultam como comprovadas duas agressões físicas, reciprocamente praticadas por Recorrente e queixosa e ambas sem gravidade.
A pronúncia é omissa quanto à torpeza das agressões imputadas.
Não ficou comprovada a habitualidade da agressão física, nem a existência de vinculo de dependência entre queixosa e R:.
Não foram especificados os fundamentos de facto determinantes da fixação de medida acessória.
Tal pena acessória traduziu-se no afastamento do Recorrente da sua própria residência.
Dela havendo resultado prática restituição, e atribuição à Recorrente, da casa de morada de família.
O Tribunal recorrido fez violação dos arts. 152 e 65/1 do C. Penal, 97 da LOFTJ, 1793 do C. Civil e 1413 do C.P. Civil, mais havendo incorrido na nulidade prevenida no art. 379º, al. a) do C. P. Penal.
Em tais termos pugna pela sua a absolvição.
O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu, pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da decisão recorrida, defendendo, em conclusão: 1 - A sentença recorrida apreciou correcta e devidamente a prova, estando a matéria de facto dada como provada e como não provada em perfeita consonância com a prova produzida em julgamento.
2 - Os factos dados como provados integram sem dúvida o crime de maus tratos, p. e p. pelo art° 152°, n°1, al. a) e n°2, do Código Penal.
3 - O arguido cometeu duas agressões na pessoa da assistente, sua companheira e mãe da sua filha, reveladoras de especial insensibilidade e brutalidade, atentas as circunstâncias e a violência dos actos, que causaram sofrimento, dor e humilhação à assistente.
4 - O arguido agiu sempre com culpa grave, sob a forma de dolo directo, querendo causar dor, sofrimento e humilhação à assistente.
5 - A sentença recorrida não enferma de qualquer vício, encontrando-se devidamente fundamentada, de facto e de direito.
6 - A sentença recorrida condenou o arguido em pena justa e adequada aos factos e à culpa, tendo em conta as finalidades repressivas e preventivas.
7 - Pelo exposto, deverá negar-se provimento ao presente recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida.
Nesta instância a Exma. Senhora Procuradora Geral Adjunta teve vista dos autos.
Efectuado exame preliminar verificou-se haver motivo para rejeição do recurso por manifesta improcedência pelo que para o efeito se remeteram os autos à conferência.
*** Na decisão recorrida tiveram-se como assentes os seguintes factos: 1. O arguido e a ofendida A., melhor identificada nos autos e constituída assistente, viveram maritalmente pelo menos desde 1999, primeiro na residência situada na Rua do Salvador, , e depois na Rua João Nascimento Costa, em Lisboa.
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O arguido e a assistente têm uma filha em comum, nascida em 02.12.1999.
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Em meados de Dezembro de 2003, na Rua do Salvador, no seguimento de uma discussão, o arguido desferiu bofetadas na cara da assistente, que lhe causaram ferimentos e dor.
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Em 26 de Janeiro de 2004, por volta das 20h, o arguido desentendeu-se com a assistente no interior do restaurante denominado «Zip Zip», em Lisboa, quando se encontravam a jantar.
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Então, o arguido desferiu um soco com força na cara da assistente, provocando-lhe uma ferida na boca, que ficou a deitar sangue.
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Como consequência necessária e directa destas condutas, a assistente sofreu dores físicas e tristeza.
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Sentiu humilhação por ser agredida num local público e ficou com medo do arguido.
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O arguido agiu com o propósito de molestar fisicamente a assistente, sabendo que ao fazê-lo de forma repetida lhe causava sofrimento e temor.
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Estava ciente de infringir o direito.
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Desde Novembro de 2004, a assistente é titular em regime de cedência precária do fogo municipal T2 situado na Rua João Nascimento Costa, em Lisboa.
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A assistente suporta a renda social e habita a residência juntamente com os seus dois filhos.
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O arguido está desempregado .
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Trabalhou como jardineiro.
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Recebe a título de subsídio de desemprego a importância de € 279.
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Vive sozinho num quarto, que lhe custa € 150 / mês.
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O arguido não conta com condenações inscritas no certificado de registo criminal documentado a fls. 146.
*** Quanto a factos não provados consignou-se: Dos factos constantes na acusação, não se provou que: - pelo menos desde 14.12.2003 até ao dia 20.04.2005, o arguido atingiu diariamente a companheira no corpo, com bofetadas, socos e pontapés, - no dia 14.12.2003, o arguido desferiu pontapés no corpo da assistente, - no dia 24.01.2004, no interior da mesma residência, o arguido atingiu com bofetadas, socos e pontapés o corpo da mulher, conduta que repetiu no dia 25.01.2004, - no interior do restaurante, a assistente caiu ao solo no seguimento do soco dado pelo arguido.
No que concerne a motivação de facto relativamente aos factos tidos como assentes em audiência de julgamento refere-se na decisão:A anterior decisão fáctica formou-se a partir das declarações prestadas em audiência pelo arguido, pela assistente e outra testemunha ouvida, filho mais velho da assistente, bem como da ponderação global do teor da certidão junta a fls. 120 e informação de fls. 204-205.
O arguido apenas admitiu ter dado bofetadas na cara da assistente, depois de uma discussão, na primeira residência onde ambos viveram, e negou tê-la agredido no restaurante. Por seu turno, a assistente teve alguma dificuldade em localizar espácio e temporalmente as agressões, razão por que parte da acusação não foi confirmada.
No entanto, o depoimento do filho O. serviu para corroborar a descrição feita pela assistente sobre a forma como foi agredida durante o jantar, no interior do restaurante, pois a testemunha encontrava-se presente, assistiu aos acontecimentos, viu a assistente com marcas visíveis de ferimento na boca, sendo certo por outro lado que a ofendida apresentou queixa contra o arguido logo a seguir, conforme se depreende do auto de fls. 50. Esta testemunha depôs de forma consistente e credível, relatando que o arguido desferiu a bofetada com alguma força na cara da assistente.
O arguido depôs sobre os aspectos pessoais e sócio-económicos. Relevou o teor do certificado de registo criminal junto a fls. 140 para os antecedentes criminais.
*** A lei adjectiva instituiu a possibilidade de rejeição dos recursos em duas vertentes distintas: rejeição formal, que se prende com a inobservância (insatisfação), não colmatada, dos requisitos prescritos no artº 412º do CPP e a rejeição substantiva que ocorre quando é manifesta a improcedência do recurso.
A manifesta improcedência verifica-se quando, atendendo à factualidade apurada, à letra da lei e à jurisprudência dos Tribunais superiores é patente a sem razão do recorrente.
É a conclusão a que este Tribunal de recurso chega após análise a que procedeu da matéria de facto assente (em vista da prova disponível e da fundamentação de facto) e da decisão de direito tendo por referência os contornos do tipo e legislação atendível, não se descortinando razões para exercer censura sobre o decidido, designadamente no aspecto posto em causa.
Sendo pacífica e constante a jurisprudência no sentido de que «O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação» (Acórdão do S.T.J. de 13-03-1991, Proc. 41.694/3ª, citado em anotação ao Art.º 412º no Código de Processo Penal Anotado de Maia Gonçalves) - o que é dizer que são as conclusões formuladas na motivação do recurso que definitivamente e em exclusivo definem e delimitam o respectivo objecto (cuja limitação a lei permite), sendo que, conforme vem sendo também entendimento do STJ, não retomando o recorrente nas conclusões as questões que suscitou na motivação o tribunal superior só conhecerá das questões resumidas nas conclusões uma vez que, nos termos do disposto no artº 684º nº 3 do C.P.C.
(ex vi artº 4º do CPP), nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso - analisando as conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do seu recurso verificamos que impugna a decisão recorrida 1. na sua...
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