Acórdão nº 0744565 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Novembro de 2007
Magistrado Responsável | LUÍS GOMINHO |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em audiência, na Secção Criminal da Relação do Porto: I - Relatório: I - 1.) No Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, foi o arguido B.........., com os demais sinais dos autos, submetido a julgamento em processo comum, com a intervenção de tribunal singular, acusado pelo Ministério Público da prática de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. pelo art. 3.º, n.º 2, do DL n.º 2/98, de 03/01, em concurso real com um crime de desobediência p. e p. pelo art. 348.º, n.º 1, al. a), do Cód. Penal, com referência ao art. 387.º, n.º 4, do Cód. Proc. Penal.
Proferida a sentença, veio aquele a ser condenado pelas referidas infracções, respectivamente, nas penas de 10 meses de prisão e 5 meses de prisão, e no seu cúmulo jurídico, na pena única de 12 meses de prisão.
Razão pela qual inconformado, recorre para esta Relação, desta forma sintetizando as razões da sua discordância: 1.ª - No Acórdão aqui posto em crise foram dados como provados factos que não o poderiam ter sido face à prova produzida em audiência, para além de ter sido feita uma errada qualificação jurídica, pelo que se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto e de direito; 2.ª - Encontra-se, com o devido respeito e salvo melhor opinião, erradamente julgada e dada como provada a matéria de facto relativa ao crime de desobediência, p. e p. art. 348.º, n.º 1, do Código Penal, nomeadamente a vertida nos pontos 2 a 4 da alínea A) da Fundamentação (II); 3.ª - Uma vez que o arguido é analfabeto e tem dificuldades de compreensão e o agente da G.N.R. que o notificou não cuidou de apurar se o arguido sequer sabia ler, nem se tinha capacidade de compreender devidamente o que lhe havia sido transmitido - não basta perguntar ao arguido se compreendeu e este lhe responder que sim para se entender que o mesmo ficou ciente do conteúdo da notificação e da cominação legal no caso de incumprimento - nesses casos os arguidos só para não ficarem detidos dizem sempre que sim a tudo o que lhes é dito; 4.ª - Nesse sentido vão os depoimentos do próprio agente ouvido em audiência de julgamento - cfr. gravação em cassete 1, lado A e respectiva transcrição a realizar que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais bem como, o depoimento da testemunha C.......... e a informação contida no relatório social junto aos autos a fls. ...; 5.ª - Acresce que o Tribunal a quo deveria ter apurado o efectivo deficit cognitivo do arguido, o que seria fácil através de uma perícia, o que contudo não fez omitindo salvo o devido respeito e melhor opinião uma diligência de prova que se reputa como essencial; 6.ª - Pelo exposto e perante o que se vem de referir, não podia o Tribunal a quo, e de acordo com a prova produzida em julgamento ter dado como provado a matéria de facto vertida nos citados pontos 2 a 4. Se mais não fosse por respeito ao principio do in dubio pro reo, uma vez que a prova produzida é de todo insuficiente para dar como provada que o arguido ficou ciente do conteúdo da notificação e da obrigação de comparecer bem Tribunal; 7.ª - Logo essa factualidade teria que ter sido dada como não provada; 8.ª - Ao ter julgado de facto de outra forma, para além de haver uma errada avaliação da prova produzida em julgamento, violou o Tribunal a quo, no seu douto acórdão, o princípio da presunção de inocência do arguido, as garantias do processo crime, o princípio da verdade material; 9.ª - Do que se vem de expor resulta, salvo o devido respeito e melhor opinião, que não se provou ou não foi produzida prova suficiente que permitisse concluir que o arguido B.......... praticou os crime de emissão de desobediência p. e p. pelo art. 348.º, n.º 1, do Código Penal, e que a respectiva conduta preenche o tipo legal do citado crime; 10.ª - Acresce que, e sem prescindir o supra referido, afigura-se ao aqui recorrente tendo por assente a prática dos dois crimes que foi condenado, afigura-se que no quadro da ilicitude pressuposta pela incriminação dos referidos crimes, as atenuantes existentes - nomeadamente a idade o arguido, o facto de vir de uma família desestruturada e de etnia cigana fortemente disnómica, de ter três filhos menores e ser o único sustento dos seus filhos -, não deixando de reconhecer a censurabilidade da conduta dada como provada, entende o aqui recorrente ser esta ilicitude de grau baixo, atento o referido modo de execução, a estigmatização das penas de prisão - com a condenação em pena de prisão estar-se-á a correr o perigo de uma estigmatização e adulteração irreversível da identidade do Recorrente, que pode culminar no compromisso com uma carreira delinquente, já iniciada, mas que se poderá tornar irreversível, perigo este que a todo o tempo se deverá evitar, e que é uma preocupação expressa que informa toda a legislação penal e processual penal - afigura-se como certa e ajustada imposição de uma pena de multa ou no limite uma pena de prisão suspensa por prazo a determinar e com imposição de obrigações, nomeadamente a frequência escolar; 11.ª - De acrescentar que, o arguido sempre foi condenado, no que se refere aos crimes de condução sem habilitação legal em penas de multa que pagou, pelo que se afigura que a simples ameaça da prisão satisfará as necessidades da punição, pelo que deveria ter optado o Tribunal a quo pela aplicação do instituto da suspensão da pena de prisão, por verificados os respectivos pressupostos legais.
12.ª - Disposições violadas: as referidas supra e artigos 32.º da Constituição da República Portuguesa, os artigos 124.º, 151.º e segs., 127.º, 368.º, 369.º do Código Processo Penal e 70.º, 71.º e 72.º e 348.º do Código Penal.
I - 2.) Respondendo ao recurso interposto, concluiu por seu turno o Ministério Público: 1.ª - O arguido incorreu, com a sua apurada conduta, na prática do crime de desobediência.
2.ª - Nada evidencia que o arguido padeça de qualquer deficit cognitivo que o impedisse de compreender o alcance da notificação e da advertência que lhe foram feitas pelo agente autuante.
3.ª - Ao invés do alegado pelo arguido não foi omitida qualquer diligência de prova, designadamente perícia, reputada como essencial.
4.ª - Com efeito, no decurso da audiência de julgamento não foi fundamentadamente suscitada a questão da inimputabilidade ou da imputabilidade diminuída do arguido.
5.ª - O princípio in dubio pro reo...
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