Acórdão nº 337/99 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Junho de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Guilherme da Fonseca
Data da Resolução09 de Junho de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 337/99

Processo nº 345/97

  1. Secção

Relator: Cons. Guilherme da Fonseca

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. A E..., Ldª, sociedade comercial com sede em Lisboa, veio interpor para este Tribunal Constitucional dois recursos:

    1. o primeiro, "ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção resultante da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro", do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (1ª Secção), de 30 de Abril de 1997, que negou provimento ao agravo que havia interposto, pretendendo "ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 666º, nº 1 do Código de Processo Civil, com a interpretação que lhe foi dada no acórdão recorrido (confirmando nessa parte o douto acórdão da Relação de Lisboa)", porque essa norma, "tal como interpretada na decisão recorrida, viola os artigos 20º e 21º da Constituição da República Portuguesa" ("A questão de constitucionalidade foi suscitada nos autos, nomeadamente nos nºs 21 a 23 e 31 a 37 das alegações de agravo interposto do acórdão da Relação (sendo reiterada nas conclusões K, L e M desse mesmo recurso) e o direito de resistência foi invocado pela ora Recorrente, logo na primeira instância, em requerimento apresentado em 29.06.95" - acrescenta ainda a recorrente).

    2. o segundo, também "ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção resultante da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro ", do "despacho que, indeferindo o requerimento de aclaração, a condenou a pagar 3 unidades de conta de taxa de justiça" (é o acórdão, e não despacho, do mesmo Supremo, de 20 de Maio de 1997), pretendendo "ver apreciada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 448º do Código de Processo Civil e 16º do Código das Custas Judiciais, ao abrigo das quais foi proferido o despacho recorrido, e com a interpretação que neste lhes foi dada (quando permitem que se condene uma das partes no processo a pagar uma taxa por um serviço que não lhe foi prestado, ou quando admitem a sua aplicação a título de sanção por um comportamento, apreciado e julgado sem precedência de audição do seu autor, ou ainda quando expõem ao pagamento de taxas de montante imprevisível quem se limita a exercer o direito à informação, sobre o sentido de uma decisão que afecta os seus direitos e interesses, em ordem a exercer o seu direito de recurso, ao abrigo da lei e da Constituição)", porque essas normas, "tal como interpretadas e aplicadas pela decisão recorrida, violam os artigos 2º, 20º, 32º e 106º (conjugado com o 18º, nºs 2 e 3), todos da Constituição da República Portuguesa" ("A questão da constitucionalidade não foi suscitada nos autos, porque a recorrente não o pôde fazer, por não estar processualmente prevista a sua intervenção no processo antes de proferido o despacho em causa e este não admitir recurso ordinário em que ainda possa suscitar a questão" – acrescenta a recorrente).

  2. Nas suas alegações concluiu assim a recorrente:

    2.1. Quanto ao recurso do acórdão de 30 de Abril de 1997:

    "A – O direito de defesa dos cidadãos seria completamente esvaziado de sentido caso as decisões judiciais já proferidas ('para defesa de direitos e interesses legítimos') e em pleno vigor, pudessem ser ignoradas e neutralizadas através de decisões posteriores de outros tribunais, com o mesmo grau hierárquico, sem precedência de qualquer contraditório.

    B - Interpretar o art. 666º, nº 1 do CPC como obstando a que o juiz possa conhecer e suprir nulidades extrínsecas de uma decisão já proferida por si, quando esta decisão ponha em causa direitos reconhecidos e tutelados por outra decisão judicial anterior, constitui pois infracção ao direito constitucional de defesa (consagrado no art. 20º da CRP), para além de colidir com o princípio do Estado de Direito (enunciado no art. 2º desta mesma Lei).

    C - O art. 21º da Constituição, que consagra o direito de resistência contra ordens ilegítimas, não abre qualquer excepção para as ordens dos tribunais.

    D - Deve ter-se por ilegítima a ordem judicial que - como no caso em apreço - colide frontal e irremediavelmente com outra decisão anterior, proferida por outro tribunal do mesmo grau hierárquico, e que até foi confirmada por instâncias superiores.

    E - O facto de o Juiz, ao proferi-la, ignorar a existência de factos maliciosamente ocultados pela requerente do arresto, não obsta a esta conclusão, já que a ilegitimidade assume aqui natureza objectiva, que não é afastada pelo legítimo desconhecimento do Tribunal.

    F - Nesses casos, portanto, o disposto no art.21º da CRP é incompatível com o nº 1 do art. 666º do CPC quando interpretado e aplicado com o sentido de obstar a que o juiz que proferiu uma ordem ilegítima respeite o direito de resistência (suspendendo a execução dessa ordem), mesmo quando se aperceba (após ter proferido a decisão) que com ela ofendeu direitos, liberdades e garantias do requerido da providência, e que o mesmo resiste a essa ordem judicial, invocando expressamente aquele preceito constitucional.

    Nestes termos, deve o nº 1 do art. 666º do CPC ser julgado inconstitucional, quando interpretado e aplicado pela forma indicada, por violar os arts. 2º, 20º e 21 da Constituição".

    2.2. Quanto ao recurso do acórdão de 20 de Maio de 1997:

    "A - Os artigos 448º do CPC e 16º do CCJ permitem a tributação das partes em casos em que nenhum serviço lhes é prestado, nomeadamente quando os seus requerimentos são liminarmente indeferidos ou quando - como sucedeu neste caso - o tribunal se recusa a prestar o serviço que lhe foi solicitado.

    B - Por isso, nestas situações, a denominada taxa de justiça reveste natureza de imposto, por ausência de contrapartida directa, individual e específica, ou por ser manifestamente excessiva e desproporcionada face ao valor objectivo do reduzido serviço prestado (de resto já pago pelos preparos destinados a custear a tramitação geral do processo).

    C - Sendo assim, tratar-se-á de um imposto cujos elementos essenciais dependem de uma determinação casuística, que não foi desenhada na lei, pois que a sua incidência depende de conceitos vagos como 'actos supérfluos', 'desnecessários', 'ocorrências estranhas', ou 'natureza manifestamente dilatória', e a sua taxa é discricionariamente determinável pelo juiz, entre meia e dez unidades de conta.

    D - Tal significa, em primeiro lugar, que as normas do art. 448º, nºs 1 e 2 do CPC e do art. 16º do CCJ violam - materialmente - o princípio da legalidade fiscal, ínsito no art. 106º, nº 2 da CRP, isoladamente e conjugado com o art. 18º, nºs 2 e 3 da Lei Fundamental.

    E - Mas significa ainda que - porque a aprovação do Código das Custas não beneficiou de autorização legislativa do Parlamento -...

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